5. Epifania

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- Podias ter contado que perdeste o caso nessa noite. Ao menos já estávamos preparadas para a eventualidade disto acontecer. - Aria dirigiu-se a Alison.

- Como devem calcular nem sequer pensei nisso. Acho que o facto de ter perdido o casaco não era o nosso maior problema no momento. - respondeu com a voz irritada - Além disso, eu achei que perdi o casaco quando estávamos a fugir, ou seja, longe da "cena" do crime.

- É melhor irmos falar nisto noutro lugar. Vamos para minha casa. - disse Hanna e todas entraram no carro.

Mais uma vez, a viagem foi em silêncio. O incomum virou comum. O que era raro tornou-se o novo normal. As gargalhadas e as piadas deram lugar a discussões. O barulho e a alegria foram substituídos pelo silêncio e por um ambiente pesado. Se o silêncio matasse, teríamos menos cinco pessoas no mundo neste momento. 

- Querem estudar juntas para o exame da próxima semana? - Emily decidiu quebrar o gelo.

Após uns segundos sem ninguém responder, Hanna dá o primeiro passo.

- Podemos estudar juntas. Preciso mesmo do teu cérebro para me ajudar, Em!

De algum modo que ninguém percebia, Emily sentia que tinha algum tipo de missão especial que consistia em fazer toda a gente estar confortável. Numa situação normal, esta atitude é sempre louvada pelas amigas. Agora não. Certas coisas mudaram.

Chegam a casa de Hanna que verifica se estão sozinhas em casa antes de falarem abertamente sobre o assunto. Apesar das famílias saberem que, efetivamente, estiveram no parque naquela noite e que a polícia as chamou, não sabem a verdade completa. Não sabem dos pesadelos que cada uma tem. Não sabem do sobressalto que é quando ouvem algum barulho que as transporta para o momento que escutaram o disparo da arma.

- A minha mãe deixou-me um bilhete a dizer que não está cá até logo à noite. Podem ficar cá até quando quiserem. - avisou Hanna.

Spencer levanta-se rapidamente da cadeira onde estava sentada e começa a andar em círculos. 

- Vamos tentar pensar com clareza. - começou Aria - Sabemos que não fizemos nada. Por isso, podemos estar descansadas.

- Não é bem assim, Aria. - Spencer parou no meio da sala - Obviamente, sabemos que não fomos nós, mas a verdade é que as provas que eles têm até ao momento apontam para nós. Mesmo que agora digamos tudo o que vimos, vão parecer desculpas incoerentes e com um timing horrível.

- Mas nós somos inocentes! Nós não fizemos nada! - Aria aumentou o seu tom de voz e fez parecer que o seu corpo pequeno e frágil dobrou de tamanho.

- Pois... é fácil falar, não foste tu a ser incriminada. Aliás, não foi nenhuma de vocês. E não me venham dizer que estamos juntas nisto. Não estamos. Quando eles decidirem que tem que existir um culpado, a probabilidade de ser apenas eu é enorme. - Alison disse com tristeza no olhar e foi embora com certeza nas palavras que tinham acabado de sair da sua boca.

A ação de Ali, deixou o grupo pensativo e com medo do que pode vir a acontecer. Em pouco tempo e com uma diferença de poucos minutos, Aria e Spencer reproduziram os passos de Alison em direção à porta da casa de Hanna, que ficou apenas com a companhia de Emily.

- Estou cansada. - desabafou Emily, encostando a sua cabeça no colo de Hanna.

Este cansaço não era da manhã sobrecarregada que tiveram, nem tão pouco cansaço derivado da faculdade. O cansaço de Emily é sobre tudo. É sobre querer que resolver o que não tem maneira de ser resolvido. É sobre querer ver toda a gente bem e não conseguir controlar as influências externas.

- Sei que nenhuma de nós anda muito bem, mas estás tantas vezes preocupada connosco que acabas por te esquecer de ti e isso não pode acontecer. - disse Hanna enquanto agarra a mão de Emily - És das melhores pessoas que tive a oportunidade de conhecer e nunca vão haver palavras suficientes para te agradecer por tudo o que já fizeste por mim. Mas tens que perceber que não podemos estar todos os dias bem. Não precisas de estar todos os dias bem para nós. Não tens que vestir a armadura contra as balas todos os dias. Há dias que posso levar com as balas por ti, é para isso que servem os amigos. 

As palavras de Hanna tiveram como consequência as lágrimas de Emily. Um fenómeno visto poucas vezes. No meio das lágrimas, abraçaram-se em silêncio e pela primeira vez desde aquela mítica noite de sábado, este silêncio encheu o espaço com um significado que vai muito para além de palavras. Existem, de facto, pessoas especiais e, se tivermos sorte, tê-las nas nossas vidas é o maior presente. E é nestes momentos que se percebe algo que nem toda a gente é sortuda o suficiente para conseguir alcançar: casa não é um lugar, casa não é um espaço, casa são as nossas pessoas. 

De volta a casa, Alison segue imediatamente para o seu quarto e observar as gotas da chuva a descer pela janela pareceu-lhe o melhor a fazer para esquecer o ruído e a agitação dentro dela. Alison sabe da sua inocência, mas a polícia não sabe. Alison sabe o que está a sentir, as amigas não sabem. A amizade delas nasceu de uma forma tão natural numa aula de Psicologia Social, no começo da faculdade, que ainda hoje se riem com este início. Basicamente, a atividade proposta pela professora era explicarem através de um desenho de um transporte como esperavam ser a experiência na faculdade e o que iriam levar para a vida desta etapa. Foi neste instante que cada uma percebeu que os seus objetivos e maneiras de ver a vida eram tão parecidos que parecia obra do destino serem amigas. À partida, o carro que desenharam tinha tudo para estar avariado, mas, claramente, já fez milhares de viagens. O sentimento de fazer parte de algo especial ajudou nos momentos mais difíceis, porém esta amizade em nenhum momento esteve a ser posta à prova como agora.

Alison começa a pensar no que pode fazer para melhorar o cenário mas, com clareza na mente, entendeu que todas as suas ideias só piorariam tudo. 

"Eu confio a minha vida às minhas amigas, não vai ser agora que tal conexão vai partir", pensou Alison e tomou uma decisão. Apressadamente, pegou no seu telemóvel e escreveu uma mensagem para as amigas:

"Tive uma epifania e estamos a complicar o que não tem que se tornar complicado. Já sei o que vamos fazer e, pela primeira vez desde que tudo começou, vamos pelo caminho mais simples."

A dita epifania de Alison deixou o restante grupo curioso e surpreendido pela atitude. Não vale a pena dar voltas quando o caminho pode ser feito em linha reta. Que seja o simples a ser seguido.

Saturday Night | Pretty Little LiarsOnde histórias criam vida. Descubra agora