Capítulo 1- ༄𝐶𝑎𝑠𝑎 𝑑𝑒 𝐹𝑜𝑔𝑜

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Fazia semanas desde a última vez que fui punida ou servi de saco de pancadas para Beron, Eris ou qualquer um que tivesse permissão para usar um chicote. Nos primeiros dias achei que isso se dava pelo fato de estar muito machucada, mas foi quando me trouxeram para um dos quartos luxuosos do palácio eu percebi que estava muito encrencada.


Seja lá o quê Eris e Beron estejam planejando para mim não é coisa boa. Assim que as sentinelas me jogaram aqui duas Féericas com pele verde e cabelos marrons me deram banho, depilaram, esfregaram, escovaram, vestiram e calçaram. E eu nunca me senti tão desconfortável em toda minha vida, nem mesmo na primeira vez que vi Beron fiquei assim.

Agora Renard está andando pelo palácio tentando descobrir o por quê de tudo isso, e confesso que queria poder fazer o mesmo, mas sei que assim que abrir a porta os guardas irão me jogar para dentro de novo. Suspiro cansada e caminho até a grande janela do quarto. A única coisa que me impede de ir a loucura até hoje. O céu, não importa o horário basta olhar para a imensidão azul e toda a tempestade que guardo dentro de mim se esvai como poeira ao vento.

Ao contrário do que sempre imaginei os vestidos escolhidos para mim não são enormes e com camadas e camadas de tule e cetim. São leves e ajustados ao meu corpo delineando as curvas do meu corpo, que agora com a nova dieta está mais forte e curvilíneo. Foi uma surpresa para mim ver como eu poderia ter sido se ao invés de me trancarem numa cela, eu tivesse sido criada com amor de minha mãe, teria minhas criadas para me ajudarem, seria forte e bonita o bastante para arrumar um bom casamento, mas agora, que macho decente irá querer uma fêmea marcada?

Uma fêmea burra, cheia de cicatrizes, que não sabe ler direito ou escrever e que não conhece nem metade das coisas da própria corte?

Não sei como me portar diante de um Grão Senhor, ou uma corte. Não sei conversar com ninguém além de Renard e Nyara, e um deles é uma raposa que cresceu comigo. E pela Mãe, não consigo nem cogitar a ideia de casar, não sei cozinhar, nem limpar, nada. Eu sou inútil o suficiente para morrer trancada dentro daquela cela apenas para não ter que encarar o mundo.

Sempre sonhei com o dia em que me tirariam de lá e eu poderia ser livre e viajar o mundo, conhecendo os prazeres da vida, os sabores do mundo e as belezas das Cortes. E agora, ironicamente eu queria poder voltar para o buraco de onde me tiraram. Me encolher no colchão velho e só levantar quando a névoa cobrir os vales e montes.

Os corredores parecem barulhentos e minha cabeça dói. Os pensamentos de todos ao meu redor se misturam e não consigo controlar. Ninguém além de Renard sabe sobre essa anomalia. Já cheguei a conclusão de que fui amaldiçoada quando nasci, e por isso minhas chamas são diferentes e posso acessar as mentes de outros féericos e grão féericos.

Sinto as lágrimas molharem meu rosto e descerem pelo pescoço. Provavelmente as coisas que passaram em meu rosto borraram, mas não sei se ligo o suficiente para tentar consertar. Senti o poder sob minha pele, implorando para sair, para queimar.

Caminho até o banheiro e me sento na beirada do banheira colocando as mãos dentro, vendo o vapor subir e meus dedos aquecerem. Fecho os olhos e deixo sair. Tiro as mãos de dentro e me levanto assim que a água começa a ferver e borbulhar e foi o suficiente para ver o fogo saindo das minhas mãos e acertando a água. Fogo incandescente e gélido, sem vida assim como sua portadora, em tons laranja e vermelho e se olhar bastante é possível ver alguns traços de amarelo ouro. O cômodo é tomado pela tonalidade alaranjada e fogo sobe em uma explosão na água.

Uma barreira de fogo se ergue acima de minha cabeça impedindo as gotas de água fervente tocarem minha pele. Com um movimento as chamas se dissipam no ar e volto meu foco para a água. A banheira antes cheia de adornos com a insígnia da corte e delicados espirais dourados estava praticamente destruída. Eu destruí.

Em um rompante a porta se abre e Renard corre em suas patas até mim, se enrolando em meus pés numa forma de me acalmar. Respire e se concentre nisso, traga de volta o que é seu e que ninguém pode lhe tirar.

Faço o que diz, mas não consigo parar o fogo. Tento com mais afinco e finalmente consigo tomar o controle de volta dos meus poderes e do meu corpo. Percebendo que estou encharcada e meus cabelos embaraçados. Caio de joelhos respirando fundo. Nunca tinha perdido o controle, afinal não usava meus poderes com frequência alguma, conseguia contar nos dedos das mãos quantas vezes usei do fogo como proteção ou ataque, nem mesmo o que me permite invadir a mente dos outros sei manusear.

E depois que saí daquela cela, que desde sempre foi meu quarto, eu sentia e mesmo antes de Renard falar, sabia que meus poderes estavam maiores. E a única coisa que quero é que Beron não descubra, não consigo imaginar o que faria se colocasse as mãos nos meus poderes. Ele pode ser um Grão Senhor poderoso e antigo, mas ainda é mais fraco que o da Corte Noturna. Nyara me contou a história sobre como ele lutou bravamente ao lado de sua parceira e seu círculo íntimo até seu último suspiro para derrotar Hybern.

Ela já havia me contado sobre a Corte Noturna, as lendas sobre os guerreiros illyrianos e que sua corte serviu de inspiração para Amarantha criar Sob a Montanha. Nyara não foi para lá assim como eu, mas Urie lhe contou todos os acontecimentos, incluindo os três testes da quebradora de maldições, Feyre Archeron e como ela destruiu a Corte primaveril. A primeira Grã Senhora de Prythian, minha mãe uma vez contou o que ela fez por meu irmão Lucien, uma féerica com coração humano. Feita pelos sete Grãos Senhores possuindo o poder de cada um deles, tornando-se tão forte e perigosa quanto o parceiro. Para mim, uma inspiração assim como Morrigan.

Nyara não falou muito sobre o círculo íntimo, apenas disse que Morrigan já havia sido noiva de Eris, mas se deitou com um bastardo illyriano e se tornou impura, contou-me que a família a torturou e jogou nua nos limites da Corte com um bilhete pregado no ventre, onde Eris a deixou para morrer. Mas aparentemente isso não aconteceu, ela foi salva e levada para junto do primo, Rhysand. Morrigan era uma fêmea que eu admirava, a força de ter sobrevivido a minha "família" e ainda ter lutado em guerras, defendido seu povo e os humanos. Seu povo, que nunca será o meu.

Será se um dia conheceria os melhores guerreiros de toda Prythian? Sonhava com isso, mas o que uma simples fêmea burra pode...

vamos menina, levante-se, o temos tempo — me assustei ao ouvir Renard. Me pus de pé e passei as mãos no vestido e nos cabelos, ele estava deitado preguiçosamente na bancada de mármore da pia, mas sabia que toda essa calma era uma máscara. Ele nunca fica calmo, principalmente depois das saídas dele pelo castelo - eles estão armando algo muito maior do que pensávamos.

A Court Of Fire and Shadows [comeback]Onde histórias criam vida. Descubra agora