Capítulo 2

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  Levantei da cama. Algo em mim estava diferente, eu conseguia sentir. Era como se aquelas sombras que eu temia estivessem agora dançando, acariciando meu corpo, só que não me convidando para entrar, como na Dobra. Elas agradeciam, por eu ter deixado que respirassem, que fossem livres. E não eram as sombras do Darkling. Eram as minhas.

  Eu não iria esperar mais um mísero segundo para ir embora dali. Eu não podia ver Baghra, meus amigos ou até mesmo Maly. Eu estava cansada da guerra, de mortes e destruição.

  Fui até o armário do quarto e procurei pela roupa mais simples que encontrei, nada de Keftas. Eu poderia facilmente ser confundida com uma camponesa agora. Certifiquei-me de que o lenço cobria bem o colar e amarrei o cabelo, jogando o rabo de cavalo para dentro do casaco. Sabia que não iria fazer tanta diferença, mas pelo menos eu seria mais discreta daquela forma, do que com os cabelos longos soltos.

  Estava quase saindo do quarto quando vi o brilho esmeralda do anel Lantsov caído, próximo da minha cama. Eu não poderia levá-lo comigo.

  Por um segundo a ideia de permanecer ali passou pela minha cabeça como um raio veloz. Mas eu não podia permanecer. Seria egoísta, eu seria egoísta.

  Na verdade, não importava para onde eu fosse, eu sempre seria Alina Starkov, a garota egoísta, ou melhor, "Sankta Alina, a Egoísta".

  Mas só em um desses lugares, o que podia ser egoísmo salvaria meus amigos, Ravka, os grishas e os humanos. Humanos, aquela palavra sibilou em minha mente. Ele não é humano, Eva, uma das assistentes do cartógrafo sênior dissera uma vez, num tempo em que minha luz ainda dormia. Talvez eu nunca chegasse a ter a ilusão de ser uma humana outra vez, porque eu não era como eles; eu não era, e nunca seria com Maly.

  Fui até o pequeno móvel próximo da minha cama, onde encontravam-se papéis, uma pena e um frasco com tinta nanquim, o conjunto trazendo aquele cheiro inebriante que remetia ao meu tempo como cartógrafa assistente.

  O que eu escreveria? Algo que os impedissem de irem atrás de mim e ao mesmo tempo que pedisse para que eles parassem de lutar numa guerra que já tinham perdido e ficassem a salvo, seguros.

  Não sei por quanto tempo fiquei encarando aquele papel. Só sei que as únicas palavras que consegui escrever foram: "Guarde este anel para alguém que o faça se sentir completo... até lá, tente permanecer vivo."

  Coloquei o anel pesado em cima da minha mensagem, sabendo que Nikolai iria encontrá-la; e que seria esperto o suficiente para entender o que eu queria dizer.

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  Eu caminhava pelos corredores do Zodíaco tranquilamente, para que nenhuma patrulha achasse estranho e me reportasse para Nikolai. Eu desci em direção a enorme cozinha, que estava vazia. Sabia que lá tinha uma saída, porque Maly havia me mostrado dias antes.

  Arrastei o armário repleto de compotas para o lado, com toda a força que eu tinha. Ninguém escutaria a não ser que estivesse próximo ao cômodo, e esse não era o caso. A porta de madeira estava destrancada, como se Nikolai soubesse que se um dia estivesse trancada e precisássemos atravessá-la, seria mas fácil arrombá-la se fosse de madeira.

  "Alina?" Estremeci. Porque era a voz de Genya, suave como as flores da primavera e ao mesmo tempo, implacável como o aço grisha.

  Virei meu corpo lentamente, fitando seus olhos âmbar. "Eu só estava..."

  "Eu sei o que pretende fazer. Não sou burra, Alina", ela interrompeu, me encarando severamente. "Além disso, um anel daquele tamanho seria bem difícil de passar despercebido."

  "Você contou para eles?" Murmurei baixinho.

  "Não." Ela se aproximou até que estivesse do meu lado. "Preferi vir aqui antes, ouvir da sua boca."

  Então, contei tudo. Fui sincera com Genya, mesmo que ela parecesse refletir cada sílaba que eu soltava enquanto estávamos sentadas naquele chão empoeirado da cozinha.

  Quando terminei, ela apenas suspirou e olhou para o teto, eu não conseguia imaginar o que ela estava sentindo, mas eu iria ouvi-la.

  "Sabe, Alina", começou baixinho ainda olhando para o teto. "Ele já foi meu amigo, em um tempo em que ninguém se importaria se eu fosse jogada aos volcras na Dobra, ou trancafiada numa cela suja até a morte. E agora, você é uma das únicas pessoas que eu chamo de amiga, que tenho a audácia de dirigir-me com qualquer nome que não comece com Santa."

  "Genya, eu..."

  "Chega de mortes, Alina. Você é a única que pode fazer isso sem causar outra batalha sangrenta."

  E eu sabia que Genya não estava falando sobre matá-lo. Ela havia me entendido.

  "Vá, Alina. Acabe com essa dor", sussurrou. "Não só a de Ravka ou a nossa, mas a sua também." Ela se levantou bruscamente me puxando para cima também. Logo em seguida me abraçou com força.

  Não consegui evitar que lágrimas caíssem e escorressem pela minha bochecha agora gélida, muito menos ela.

  "Não deixe que nenhum deles me sigam", supliquei, e ela sabia muito bem a quem eu estava me referindo; quem seria o primeiro a tentar seguir meus rastros.

  "Nikolai é inteligente", afirmou, uma coisa que nós duas sabíamos. "Mas se me perguntarem, mentirei por você, porque sei que mentiria por mim também"

  "Obrigada", arfei, porque aquela era a única palavra que a minha boca conseguiria formar naquele instante.

  "Agora, não fique triste", ela sorriu levantando meu rosto. "Você fica muito vermelha quando chora e não estou com o meu kit aqui." Ela deu uma leve risada deixando algumas lágrimas escaparem. "Além disso, tenho certeza que essa não será a última vez que nos veremos, Alina Starkov. Agora vá, antes que alguém não tão bonito quanto eu apareça aqui embaixo."

  Eu já estava atravessando a porta quando ouvi Genya chamar meu nome mais uma vez. Eu apenas virei um pouco o rosto quando ela disse: "Só... só tome cuidado."

  Então, eu assenti e depois, adentrei na escuridão do túnel.

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Oi... mais uma vez né! Então, eu ainda estou me organizando em relação ao intervalo de tempo que irei publicar os capítulos aqui, mas fiquem com o 2 hoje!

Espero que tenham gostado desse capítulo, tenho que admitir que estou curiosa para saber o que vocês acharam dessa decisão da Alina de fugir do Zodíaco, e se imaginam qual o motivo pelo qual Genya ajudou ela :)

Enfim hahaha, vejo vocês no próximo cap :)

Light and Dusk- an alternative ending for the grisha trilogyOnde histórias criam vida. Descubra agora