Do que você tem medo?

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[N.A: Esse conto toca levemente em assuntos sensíveis como suicídio e depressão, se não consegue lidar com temas deste tipo recomendo que não leia]
[N.A 2: Recomendo que leia o conto "Olhos de Peixe"]

"29 de outubro.

Olá, sou o médico encarregado do tratamento de sua tia. 

Me deram ordens para contatá-la caso ela falasse alguma coisa, desde que a internaram há alguns dias não disse muita coisa, mas hoje finalmente fizemos algum progresso. Acontece que seu depoimento me deixou um pouco preocupado, geralmente não dividimos esse tipo de informação... No entanto preciso ser sincero e dizer que talvez precisemos da ajuda dos familiares para lidar com esse caso. Não acho que consigo interpretar tais relatos sem seu apoio, se puder tirar qualquer informação relevante deste depoimento, me avise.

Ass. Doutor Ícaro Cardoso, Hospital Central de Psiquiatria."

"Uma mãe que realmente ama sua criança nunca espera viver mais do que ela, o momento em que vemos nosso bebê pela primeira vez é um momento decisivo. 

Algumas mães rezam para que sua criança viva uma vida longa e cheia de felicidade, enquanto outras pedem para não viver o suficiente para ver seu filho sofrer. Quando vi Victor pela primeira vez, tão pequeno e franzino, tudo o que eu queria era garantir que ele vivesse por muito tempo. Que tivesse tudo de melhor nesta vida e fosse a criança mais feliz do mundo todo... Eu morreria ali se isso garantisse sua felicidade. 

Quando o vi pela última vez, naquele caixão... Pálido e... Eu queria morrer. 

Na minha cabeça, se eu caísse morta bem ali talvez ele retornasse, talvez tudo pudesse ser reescrito. Quando um filho morre antes da hora, os pais se culpam, mesmo que não houvesse nada que nós pudéssemos ter feito para impedir que isso acontecesse. Não me importava com o que as pessoas tinham a dizer, minha vida acabou no momento em que meu menino deixou este mundo.

Meus parentes tentaram ficar de olho em mim, minha irmã dormiu ao meu lado por alguns dias, meu pai veio me visitar todos os dias por semanas e minha sobrinha me ligava todas as noites.

Ela dizia: "Coisas estranhas estão acontecendo, vão te dizer muitas mentiras e tentar te deixar pior do que já está, mas não acredite neles, tia... Meu primo era um bom homem. "

Ela fez o que pôde para me acalmar, para tentar me fazer ignorar as coisas terríveis que diziam sobre meu menino. "Ele era um assassino", "Completamente insano", "Ele se matou para não ter que lidar com as consequências", mentiras e mais mentiras. 

Meu filho era um anjo.

Eu sei disso, pois senti sua presença.

Quando tentei dar um fim ao meu sofrimento, ele apareceu atrás de mim e tirou a lâmina de minhas mãos. Naquela noite ele me abraçou e ficou ao meu lado até o amanhecer, eu sei disso.

Não pude vê-lo, mas pude senti-lo.

Então eu sabia que estava segura, que ele estava olhando por mim, mas... Havia algo além dele.

Não sei explicar.

Você tem que acreditar em mim, eu os vi.

Os ouvi.

Nas paredes.

No forro da casa.

Andando e arranhando, chorando e falando coisas que eu não entendia a noite toda. Minha irmã não percebeu, mas eu notei, pude sentir seus olhos em mim, no escuro onde as sombras pareciam mais densas. Eles estavam lá, me vigiando e... Eu sei que Victor estava me mantendo segura.

O QUE OS OLHOS NÃO PODEM VER - CONTOS DE TERROROnde histórias criam vida. Descubra agora