O Que Os Olhos Não Podem Ver

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[N.A: Sugiro a leitura dos contos "O Figurante", "Canto da Floresta" e "A Dança do Diabo"]

Hoje é dia 31 de outubro.

Se tudo deu certo, este será o último capítulo desta história.

Finalmente me lembrei de algo que fez tudo fazer sentido.

Sabe, quando se é jovem e tolo nós cometemos muitos erros, a maioria deles é na esperança de conseguir algo bom. Quando eu era mais nova e estava na faculdade, minha vida era péssima, não tinha muito dinheiro ou amigos. Estava sozinha e desesperada por um milagre, mas foi uma maldição que acabei conseguindo.

Aquela casa ainda era exatamente como eu me lembrava, se é que eu podia chamar aquilo de casa. Localizada na periferia da cidade, distante de quase tudo, aquele barracão de madeira estava quase caindo aos pedaços. Cercado por carros abandonados e ferro velho, com duas árvores velhas ao seu lado e um balanço quebrado pendurado por uma única corda em um dos galhos.

A luz fraca do pôr do sol fazia com que longas sombras retorcidas se espalhassem pelo chão seco em que pisávamos.

-Eu não pensei que retornaria à esse lugar. - André parou no meio do corredor de lixo enferrujado que levava até o barracão e o encarou ansioso -Na verdade eu até tinha me esquecido que isso existia.

-Você nunca voltou depois daquele dia? - Inquiri curiosa.

Ele negou com a cabeça.

-Você voltou?

Anui.

-Uma vez, também tinha me esquecido disso, mas voltei porque fiquei curiosa... Poucas semanas depois dos e-mails começaram a chegar.

Quando éramos jovens, Elise, André e eu fomos até esse lugar com mais uma pessoa que realmente não me recordo de quem era. Tínhamos ouvido falar de uma cartomante que lia seu futuro com precisão e te ajudava a alcançar seu potencial máximo. Há pouco mais de um mês sonhei com esse lugar, me recordei do que ela me disse e como tudo havia acontecido exatamente como ela havia profetizado. Me recordei que tínhamos feito um acordo, que a dívida por aquela ajuda seria paga no futuro, então fiquei curiosa para saber como seria pago.

-Vim aqui procurando respostas de como pagaria minha parte, revirei esse lugar de cabeça para baixo e não encontrei nada. - Contei e caminhei em direção à porta -É por isso que comecei a receber aqueles e-mails com coisas horrendas, quis saber demais e fui punida.

-Você se lembra do que pediu? - Meu amigo perguntou.

Abri a porta e seu rangido ecoou pelo barracão, o lugar era escuro e empoeirado, a única janela provia luz o suficiente para iluminar apenas um metro à frente da entrada.

André entrou e a porta se fechou devagar atrás de nós.

Respirei fundo e abri a boca para falar, mas uma voz infantil me interrompeu.

-Você pediu para ter uma visão à frente de seu tempo e poder escrever grandes histórias, seu amigo pediu para entrar para a orquestra e se tornar um grande violinista.

Ele segurou minha mão assustado e lhe lancei um olhar pelo canto do olho, meu coração batia depressa e suor escorria por minha testa.

-Elise queria paz e estabilidade, algo que ela não tinha em casa com aquele irmão maluco... - A criança continuou e sua risada ecoou pelas paredes -O último queria uma vida simples, trabalhar e ter uma casa, viver sozinho sem preocupações.

-Quem é você? Onde está?! - Dei um passo à frente.

Meus pés afundaram no chão e pude sentir aranhas subindo por minhas pernas.

O QUE OS OLHOS NÃO PODEM VER - CONTOS DE TERROROnde histórias criam vida. Descubra agora