POV Nico Di Angelo
Abri os olhos devagar, garantindo que ainda era madrugada. Segurei um suspiro, com medo que ele acordasse Will, que dormia calmamente com seus braços ao meu redor. Deixei um beijo que mal encostou em sua testa antes de me desvencilhar do seu abraço, levantei pé ante pé da cama, pisando suave para não fazer barulho até conseguir me trancar no banheiro.
Fazia mais de uma semana que eu conseguira voltar para a superfície, e vinha aproveitando as férias de Will antes do período de matrícula nas faculdades como pretexto para ficarmos juntos quase o tempo todo. Quase, porque ainda tinham momentos que eu não partilhava ou sequer comentava com ele, como o de agora.
As asas vinham se regenerando e crescendo havia algum tempo, e Will já estava começando a achar suspeito que eu usasse casacos pesados e moletons mesmo no calor. Notei que aquele seria um processo que eu repetiria milhares de vezes quando, a cada três dias, eu me via preso no banheiro com o bisturi nas mãos, pronto para cortar aquelas aberrações.
Já estava tão acostumado que me preparava, agora eu tinha um pano para morder e não correr o risco de acordar meu loiro com urros de dor e também remédios tarja preta que me impediam de sentir os cortes. Os cortes e qualquer outra coisa…
Com o sentido do tato completamente perdido eu cortei as asas, com uma lentidão torturante mas que não me fez sentir nem cócegas, e só soube que havia conseguido quando vi o sangue pingar no chão. Graças ao inferno as asas evaporavam junto com seus resquícios depois de arrancadas, talvez voltassem para o submundo, eu realmente não me importava desde que não tivesse que limpar a sujeira.
Apanhei a gaze médica na pia do banheiro, que Will mantinha por perto para refazer o curativo do meu pescoço, e devagar comecei a enrolar pelo tronco, a fim de esconder e proteger as grandes fendas em minhas costas.
- Nico? - Ouvi batidinhas suaves na porta, seguidas de perto pela voz sonolenta de Will. Pensei que, se ficasse quietinho e imóvel, o torpor do cansaço o levaria de volta para a cama e pela manhã eu poderia convencê-lo de que tudo fora um sonho. - Está tudo bem?
Resmunguei um palavrão, não seria tão fácil.
- An… sim. - Disse, me apressando para terminar o curativo. Mas minha vontade de fazer tudo depressa apenas me atrapalhou, bati o braço no canto da pia e a fita de esparadrapo foi ao chão, quando abaixei para pegá-la a gaze que eu enrolara no tronco caiu também.
- Nico, abre a porta. - O trinco foi forçado, e eu dei graças a deus, mesmo que ele me detestasse, por ter lembrado de me trancar ali dentro.
- Eu já vou sair, estou ocupado.
- Ta passando mal? Se você abrir talvez eu possa te ajudar e-
Silêncio.
Will parou subitamente de falar e, pelo pouco que eu sentia, podia jurar que até sua presença estava silenciosa. Como se meu Solace houvesse simplesmente evaporado.
- Will? - Chamei inseguro, engolindo em seco quando não recebi uma resposta imediata. Ele podia estar fingindo para me fazer sair… mas eu o conhecia e meu loiro não era disso.
Uma brincadeira, talvez?
Me ignorar por não ter aberto a porta?
Nada disso fazia o estilo do Solace.
Abri a porta num ímpeto, ignorando a faixa de gaze caída e minhas cicatrizes expostas. Meus instintos diziam que eu devia estar com medo, e eles estavam corretos.
Minha respiração travou e eu não consegui dar mais um passo. Ali, sentada na cama como se fosse seu trono, com uma áurea quase tão sombria quanto a de papai, estava uma garota pálida e de longos cabelos negros, as asas identicas as minhas despontando com orgulho de suas costas e a roupa de Caçadora trajada a perfeição.
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Enviado
FanfictionE se alguém estivesse tão desesperado por amor que sequer hesitasse em fazer algo insano? Tão insano quanto um pacto. Mas quando se faz algo do tipo é preciso ter em mente o que quer, ou o tiro pode sair pela culatra. Will Solace aprendeu isso na pr...