Bem vinda a Flórida,Cooper

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Ele abre a porta do carro,saindo pra me ajudar a colocar minha mala no banco de trás, e está diferente do que estou acostumada a ver. Não está usando nada com couro,nem de alguma banda de rock ou alguma referência à algo que alguém só entenderia depois de uma explicação. Ele está simples,usando uma blusa azul-ciano com calças pretas e um casaco xadrez,também preto, amarrado na cintura. Talvez não seja a melhor combinação de roupa mas mesmo assim ele faz ficar bom. Ele coloca uma madeixa do cabelo castanho escuro pra trás e sorri pra mim.
-E aí Cooper ? Animada ?-Ele se aproxima olhando para as minhas coisas.
-Pode se dizer que sim. -Balanço a cabeça e sorrio.
-Você só vai levar isso ? -Ele pergunta em tom de surpresa.
-É o suficiente pra mim. Tem tudo que eu preciso.
-Acho que você é a primeira menina que eu conheço que não leva mil malas diferentes.
Ele pegou minha mala e colocou no banco de um jeito que não escorregasse e causasse um desastre. Entramos no carro e fomos conversando até aeroporto de Nova York,ele falou sobre uma coleção de fotos dos melhores hambúrgueres do mundo que ele está fazendo e sobre como ele gostaria de provar todos,assim como gostaria de saber qual receita eles usam pra ficar tão bom. Eu rio um pouquinho,ainda é estranho pra mim que agora ele seja meu amigo e também eu ainda não exclui de mim as coisas que sinto por ele, ou pelo menos acho que sinto. Olho pela janela,observando as paisagens pelos quais passamos,elas parecem riscos de tinta ou apenas vultos coloridos e por alguma razão eu sorrio recostando a cabeça no banco.
-Então,que tipo de coisa você gosta de fazer em viagens ?
-Bem,depende muito da viagem, mas tem uma coisa que eu adoro fazer.
-O que é?
-Não, você vai achar estranho.
-Betty,eu coleciono fotos de hambúrgueres. Não pode ficar mais estranho que isso.
-Tá bem, tá bem. Eu adoro escutar música alta quando tô na estrada ou quando tô sozinha.Eu sei lá,só me dá uma sensação de liberdade.
-Porque alguém acharia isso estranho ? É tipo a coisa mais normal do planeta.
-Eu sei lá. Eu acho meio doido.
Ele liga o painel do carro,que se acende com seu toque, e clica no ícone de nota musical,escolhendo Believer do Imagine Dragons. Ele batuca no volante conforme a batida da música e eu o observo dando uma risada pelo nariz.
-O que ? É uma música incrível.
-É muita rápida e muito alta.
Ele pausa a música e olha pra mim.
-Então o que você escolheria ?
Empurro a mão dele e procuro na playlist alguma coisa que me interesse,achando finalmente uma música que me agrada. Ele balança a cabeça com um sorriso debochado enquanto eu cantarolo "boy don't call me angel"
-A música das panteras ? Sério ? -Ele não tira os olhos da estrada mas percebo que ele está debochando de mim.
-Isso sim é uma boa música. -Estalo os dedos no ritmo da música.
-É impossível você ter um gosto tão ruim pra músicas,Cooper. -Ele desliga a música e o painel se escurece,parecendo um pequeno espelho opaco, e depois faz um curva para a entrada de um prédio de cor duvidosa.
-Quem tem o gosto ruim aqui é você,que escuta apenas ruídos das músicas. Nem dá pra entender a letra. -Cruzo os braços tentando parecer indignada mas isso só faz ele rir.
Ele balança a cabeça dando risada e para o carro. Volto a prestar atenção no ambiente ao nosso redor e não consigo identificar onde estamos.
-É bom o seu gosto pra filmes ser melhor do que pra música. -Ele desliga o carro e tira a chave da ignição.
-Onde estamos ? -Franzo as sobrancelhas ainda tentando identificar.
-Bem,alguns gostam de chamar de estacionamento. -Ele aponta para uma placa vermelha em letras enormes grudada na parede de cor acinzentada.
-Mas eu vi umas paisagens agora mesmo.
-Quer dizer aquelas paisagens ? -Ele aponta com a cabeça para o horizonte,atrás da pista de decolagem.
-Nossa,chegamos tão rápido. -Falo em tom de surpresa.
-Bem vinda ao século vinte e um,princesa. Agora vamos entrar. Temos pouco tempo.
-Ele pega as bolsas no carro enquanto eu pego as minhas malas e entramos no movimentado aeroporto. Pessoas andando pra todos os lados com suas bagagens indo para diversos destinos,alto-falantes anunciando chegadas e partidas,telas gigantes com horários,números de portões de embarque e outras coisas que não tive tempo de prestar atenção porque fui arrastada por Jughead para uma fila.
-Até parece que você nunca veio aqui. -Ele dá uma risada debochada. Eu apenas sorrio e continuo olhando em volta,são tantos andares,tantas lojas, tanto barulho.
-Tá zoando né ? Você nunca veio à um aeroporto? -Ele me encara,surpreso.
Olho pra ele com o olhar mais triste e digo -Meus pais morreram em um acidente de avião quando eu era criança.
A expressão dele se enrijece e ele me olha com pena e acho que gagueja alguma coisa. Não aguento e caio na gargalhada,o que faz ele ficar ainda mais confuso.
-Devia ver a sua cara. -Gargalho alto,quase como um cacarejo, apontando para seu rosto e após alguns minutos ele compreende.
-Os seus pais não morreram em um acidente de avião né ? -Ele fala batendo os braços na lateral do corpo, dando um risada.
-Eles estão na Geórgia e Pensilvânia agora. Se separaram quando eu tinha 13 anos.
-Poxa sinto muito Cooper.
-Tudo bem. Eu sobrevivi. E você também não teve a melhor juventude e ficou bem.
-Acho que podemos dizer que sim.
Chegamos no balcão após alguns minutos e apresentamos nossas passagens. A moça verifica e despachamos nossas malas. Ficamos rodando pelo aeroporto até a hora do nosso voo. Passamos por várias lojas chiques,lojas de comida,de roupas,perfumes, até de sabonetes artesanais que pareciam muito com comida e me fizeram ficar com fome mas jug insistiu que comêssemos no avião.
Na área de embarque,observei a aeronave pelas largas janelas. Era branca com tons de vermelho e azul.
Meu Deus do céu,como um treco desse fica no ar ?
Pensei um pouquinho nervosa....Mentira,um pouquinho nada,tava é apavorada. Entramos na coisa gigante e achamos nossos assentos,um ao lado do outro. Tinha TV com filmes e séries pra assistir e umas revistas que eu não interessei em ver. Jug abre a pequena janela e observa a movimentação do lado de fora. Carrinhos e mais carrinhos chegando com malas dos passageiros e trabalhadores correndo de um lado pro outro enquanto tudo é preparado para a decolagem. Afivelo meu cinto rapidamente após me aconchegar na cadeira e ele me encara.
-Tem medo de andar de avião ?
-Só não gosto das partidas e das descidas.
Respiro fundo e seguro com força no apoio de braço quando o piloto anuncia que vamos iniciar processo de decolagem. De repente sinto um calor sobre a minha mão e ao abrir os olhos vejo que ele colocou furtivamente a mão sobre a minha,como se não fosse nada de mais. O encaro por alguns segundos até ele me encarar de volta e sorrir,aquele típico com pequenas covinhas, e pergunta.
-Eu posso segurar a mão da minha amiga, não posso ?
-Acho que sim.
Ele entrelaça os dedos compridos nos meus e sinto a velocidade do avião tapar meus ouvidos. Involuntariamente,aperto sua mão e fecho os olhos o mais forte que consigo e quando os abro alguns segundos depois ele está olhando a paisagem de Nova York do alto.
-Você devia dar uma olhada. É realmente linda.
Estico um pouco o pescoço e vejo as luzes da cidade brilhando como estrelas em um céu escuro.
-É mesmo encantador. -Sorrio e observo um pouco mais.
Ele move os olhos da paisagem que se move abaixo de nós e olha em volta, colocando a atenção na tela á nossa frente.
-Então,vamos ver o que ? -Ele solta a mão,que eu nem percebi que ainda estava junto a dele, e vê novamente que opções de filmes temos disponível.
-É um voo de três horas,eu estava planejando dormir.
Ele me olha com olhar de indignação e exclama:
-De jeito nenhum,Cooper. Me diz qual o seu tipo de filme e eu vou escolher um pra gente.
Reviro os olhos e suspiro mas pela primeira vez faço isso de um jeito amigável. Penso por alguns segundos e respondo
-Investigação,é claro. Um pouco de comédia,um pouco de romance...eu não sei,esses são basicamente meus favoritos.
-Achei. -Ele estala os dedos e aponta para o um filme de nome "Entre faças e segredos" descrito como suspense,ação e comédia.
-Parece promissor. Ótimos atores,título interessante. -Me ajeito na poltrona preguiçosa. -Só falta um pipoca.
-Quando estivermos em terra firme podemos comer toda pipoca do mundo. -Ele dá um leve sorriso conectando o fone ao pequeno aparelho e me oferecendo um dos lados. Eu pego e ajeito na minha orelha e não posso evitar perceber que ele chega um pouco mais perto de mim, provavelmente pra ver melhor o filme.
-Pode nos contar onde estava na hora da morte de Harlan Thrombey ? -Um dos detetives do filme pergunta a família. Harlan era um escritor de sucesso,famoso por seus livros de investigação e com os mais surpreendentes acontecimentos, que teve uma morte repentina e foi encontrado morto pela sua cuidadora. Agora todos estão tentando descobrir as circunstâncias assim como quem o matou.
Enquanto assistíamos,discutimos o que achávamos que tinha acontecido,falávamos teorias,ficávamos surpresos com o desenrolar inesperado da história.
-Não acredito que era o Chris Evans o tempo todo. -disse supresa com o final.
-Os filmes do Daniel Craig são sempre bons. -E ele fez um detetive incrível.
-É mesmo.
Quando o filme acabou ainda tínhamos 1 hora e alguns minutos de voo até chegar na Flórida então como quem não quer nada ele tamborilou os dedos no apoio de braço e disse:
-Vamos jogar verdade ou desafio.
-Como que vamos fazer isso no meio de um avião ?
-Os desafios são passar vergonha,como sempre.
-Exceto que estamos em um avião. -Enfatizo. -E não podemos ficar andando por aí.
-Quem disse você precisa andar por aí pra passar vergonha ?
-Eu vou me arrepender disso. -Passo os dedos pelo cabelo e sentamos quase de frente um pro outro.
-Verdade ou desafio Betty ?
-Verdade.
-Como você era antes de tentarem..você sabe ?
-Ai meu Deus. -Suspiro profundamente -Eu era completamente diferente. Não me importava com o que os outros pensavam de mim,era espontânea. Teve uma vez,no ensino médio, eu tive esse namoradinho,Toby, ele me chamou pra ir no cinema com ele e começou a chover quando estávamos no estacionamento do shopping e ele simplesmente começou a dançar comigo.
-Na chuva ?
-É,foi umas das coisas mais românticas que já me aconteceu. Mas eu já não sou mais assim.
-É uma pena. Adoraria ver você assim.
-Talvez um dia.
E assim nós ficamos,contando mais verdades do que desafios. Ele me contou da primária namorada, e de como ele também passou por uns maus bocados quando era adolescente e quando vimos já estava na hora de pousar. Repeti o processo que fiz para a decolagem,ajeitei meu cinto e me sentei reta na poltrona,com a respiração começando a acelerar.
-Ei. -Escutei uma voz me chamar e abri os olhos devagar. Era ele,olhando pela janela. -Você vai querer ver isso.
Estiquei-me para ver a paisagem também, e ao mesmo tempo que estava curiosa estava assustada também e dessa quem segurou a mão dele fui eu. Não planejei fazer isso é só percebi que estava fazendo quando já estava lá,com os dedos entrelaçados com os dele,enquanto observava a paisagem ficar cada vez maior. Quando finalmente atingimos o chão e chacoalhamos no assento,aperto a mão dele e fechei os olhos com força. Após alguns minutos,no saguão do aeroporto ele coloca o braço em volta do meu pescoço e diz:
-Bem vinda a Flórida,Cooper.

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