CAPÍTULO 3 - JASMIM, CARVÃO, BAUNILHA E LIMÃO

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1764

Hoseok não veio de um berço de ouro. Mas quando tinha nove anos, todos ao seu redor acreditavam que o garoto tinha uma mente de jade, uma língua de prata e um coração de diamante.

A primeira, vinha de sua inteligência. Mesmo sendo jovem e nascido plebeu, Hoseok sabia os nomes de todos os vinte reis que governaram Joseon antes da coroação de Yeongjo. Conhecia as virtudes confucionistas obedecidas pelo povo de seu país, mas se interessava por conhecimentos trazidos de leste ou oeste. Recitava a Ilíada sem gaguejar, sua matemática era afiada sem ábaco ou papel. Era um pequeno prodígio, e seus pais agradeciam seus patrões todos os dias por permitirem que o garoto fosse ensinado junto ao herdeiro da família Choi.

Já a tal língua de prata era uma história curiosa. Hoseok e Yeonjun, o filho de seu senhorio, estavam estudando a geografia do império no grande mapa tático na mesa do senhor da casa. Mas foram interrompidos por um grupo de generais, acompanhados pelo Choi mais velho para discutirem estratégias de proteção contra o cerco dos soldados japoneses.

A família tinha arqueiros de elite ilhados no topo das montanhas que cercavam o vale onde sua propriedade ficava. Não eram atacados por sua posição de vantagem, mas não podiam ser substituídos ou receber mantimentos. Estavam fracos com a alimentação racionada e a falta de sono, e previa-se que em um ou dois dias sucumbiriam ao inimigo.

Enquanto discutiam-se formas de aniquilar o batalhão que bloqueava as estradas para o posto de comando no topo de cada monte, Hoseok ficava na ponta dos pés tentando enxergar a topografia, enquanto o menor, com apenas cinco anos, já havia se apossado de uma cadeira para subir.

Os oficiais pareciam prontos para arrancar os cabelos sem encontrar uma solução, quando Jung puxou a barra do hanbok do pai de Yeonjun.

- Com licença, senhor Choi? Eu posso lhe contar sobre algo que li hoje pela manhã?

O homem olhou para a criança que mal alcançava seu quadril, e que sinceramente não havia notado até o presente momento.

- Hoseokie, podemos brincar mais tarde, tudo bem? Por favor, leve Yeonjun para os jardins, vocês podem ter o dia livre hoje.

- Senhor, só peço por um minuto. Miyamoto Musashi diz em seu livro, Gorin No Sho, que existe sempre mais de um caminho para o topo da montanha. Eu acredito que seja uma metáfora, mas na atual situação, pode ser literal.

- Musashi?! - Um dos generais gritou, batendo os punhos na mesa. - Você permite que as crianças de sua casa tenham acesso às crendices loucas de um japonês?

Hyeong Choi, como a maioria dos adultos alfas na percepção de Hoseok, possuía um temperamento áspero. Mas ao contrário da maioria, era um homem perspicaz, capaz de receber sabedoria vinda dos mais nobres mestres, mas também de um garoto simplório de nove anos.

- "É difícil entender um universo se você estuda apenas um planeta". - Hyeong recitou, enquanto caminhava na direção do outro militar. - Sabe quem disse isso, Lee?

O alfa Choi puxou a haste do grampo que segurava o cabelo do outro em um coque, e encostou a parte afiada na garganta de seu subordinado.

- N-Não, senhor.

- Miyamoto Musashi disse. No mesmo livro que Hoseok acabou de citar. Agora me diga, Lee, qual sua utilidade para mim, se o filho de meus criados, uma criança, conhece nossos adversários melhor do que você? - Enfiou a presilha dourada na jugular do beta, que caiu de joelhos tentando segurar o sangue que jorrava por entre seus dedos.

- Agora me diga, Hoseokie. O que quis dizer com "pode ser literal"?

E foi assim que Jung Hoseok, o menor alfa da cidadela, mostrou a passagem de escoamento da chuva que ia do topo do morro até um pequeno túnel escondido no canto norte do interior da muralha, pequeno demais para qualquer homem com mais idade, mas o suficiente para servir de esconderijo para o garoto quando brincava de pique ou, naquele caso, levar provisões aos soldados.

Love Is Blind - SOPE A|B|OOnde histórias criam vida. Descubra agora