O anjo da Morte

4.6 - Inevitável

 Os olhares trocados com Taehyung e em seguida, Jimin, eram desesperados. Deveria contar a verdade? E por que não? Não precisava mentir, apenas omitir um pequeno fato. O irrisório fato de que seu namorado é um anjo.

 Sentindo a boca seca e o coração disparado, Yujin fica ao lado da mãe segurando sua mão. Saberia agora a reação deles ao descobrirem que sua tímida e antissocial filha estava namorando.

- Mãe, pai - retrai os ombros ao ser encarada por seus pais, curiosos em saber quem era o belo homem na porta de sua casa - esse é Taehyung, meu namorado.

 O silêncio na manhã fria nunca foi tão atormentador para a bibliotecária. Os mais velhos estavam estáticos. Era difícil acreditar que sua garotinha está em um relacionamento amoroso. Viram-na se fechar para as pessoas cada vez mais ao passar dos anos, e agora ela aparecia em um romance com um homem que nunca souberam de sua existência.

 Calmamente, o anjo se aproxima da família perplexa e faz uma reverência. Havia estudado como se portar diante dos progenitores de um parceiro afetivo e esperava ganhar a confiança dos pais de Yujin o mais rápido possível.

- Namorado? - o pai olha explicitamente surpreso para a garota, que sorri constrangida, não conseguindo esconder o acanhamento perante a situação inédita.

- Meu Deus... - soltando a mão da filha, a mais velha fita o sujeito sério e dá uma pequena risada feliz - minha filha está namorando!

 A exclamação empolgada faz a estudante de literatura ficar confusa por um segundo. Suas suposições a respeito da reação de seus pais foram descartadas, pelo menos sobre sua mãe. O homem de óculos redondos ainda parecia estar assimilando a chocante informação.

- Muito prazer, Taehyung! - sorrindo, segura os ombros do rapaz, que se assusta com o gesto repentino - Pode me chamar de mãe, sogra ou por meu nome mesmo! Não precisamos de formalidades, não é?

 Contente por ser tão bem recebido, o anjo dá um sorriso, que consequentemente conquista ainda mais a mulher. Tudo estava saindo melhor que o esperado. Entretanto, sempre há um porém.

 Com passos firmes, o pai da jovem se aproxima do namorado da filha, deixando a bibliotecária extremamente apreensiva. Não que ele fosse superprotetor, afinal, a ideia de morar sozinha veio dele, mas a forma com que o homem encarava Taehyung era igual a de quando flagrou um vizinho intimidando sua filha devido à timidez da garota.

 Um inquérito veloz é iniciado: nome completo, idade, se estuda ou trabalha, como se conheceram, há quanto tempo estão juntos, as intenções com Yujin. Tudo questionado em uma rapidez absurda e respondido na mesma velocidade, como se tivessem ensaiado a cena.

 Durante todo o processo a expressão do mais velho foi impassível, ao contrário das dos outros três. Enquanto a mãe da bibliotecária aprovava cada fala de Taehyung, Jimin sentia o desgosto pelo anjo crescer e Yujin repassava as palavras em sua mente, tentando achar as verdades em meio as mentiras.

 Kim Taehyung, vinte e um anos, cursa teologia e trabalha em uma clínica dermatológica; tem as melhores intenções possíveis com a garota; o primeiro encontro foi na biblioteca em que ela é funcionária; estão juntos há seis dias. Há conexão entre as respostas e o verdadeiro ser com que a estudante namora: a alcunha usada para se relacionar com humanos; a idade condizente com a aparência e com o tempo de sua existência; o curso de teologia por ser um anjo e o trabalho em uma clínica dermatológica em razão do emprego de Minsook; o primeiro encontro na biblioteca em que ela trabalha; os seis dias de duração do relacionamento; a intenção de criar uma família com Yujin.

 Se a bibliotecária não soubesse quem Taehyung realmente é, seria iludida por ele facilmente, assim como sua mãe... e seu pai.

 Após finalmente conhecerem o companheiro da filha, o casal mais velho convidou o trio para entrarem na casa e se acomodarem. Os mais velhos estavam felizes pela grande conquista amorosa da garota, suas esperanças de que ela encontrasse alguma paixão já estavam nas últimas folhas. Porém, o outono foi interrompido e assumido pela primavera sem nem perceberem.

- Aonde pensa que está indo?

 De sobrancelhas franzidas, a mulher pergunta para Taehyung, que carregava a pouca bagagem para o quarto de hóspedes. Ele não entende a expressão indignada da mãe de Yujin, que sorri pegando suas bolsas e as leva para o antigo aposento da filha.

 Arrumando as peças nos locais que costumavam ficar, a jovem estranha a entrada da mais velha. No entanto, assim que nota as malas do namorado, e o próprio vindo atrás dela, entende o que estava acontecendo.

- Mãe! - levanta preocupada com o final daquelas ações.

- O quê? Estou apenas facilitando o trabalho. - de mãos vazias, vira para a garota sorrindo sarcástica - Os pombinhos iriam dormir juntos de qualquer jeito.

 Rubra de vergonha, Yujin tenta argumentar que não se sentia à vontade com a situação, no entanto, a mulher encerra o assunto sussurrando no ouvido da mais nova uma frase que assombraria a estudante pelo resto do dia.

 "Uma hora ou outra vai acontecer. Se for aqui, ou não, estarei do seu lado para qualquer coisa que precisar... mas acho que ele cuidará muito bem de você."

 E, sorrindo, ela deixa o jovem casal a sós.

 O clima incômodo que se instaura quase sufoca a bibliotecária, contudo, Taehyung não sente nem ao menos uma gota de aflição. Estava adorando ser tratado daquela forma, como se fizesse parte daquela família. Sentiu que ganhou o consentimento dos pais de sua companheira e agora era livre para amá-la de acordo com as regras humanas, que envolviam a bênção da família sobre relacionamentos amorosos.

 Enquanto a estudante terminava de arrumar as coisas que trouxe, o anjo anda pelo cômodo despreocupadamente observando o quarto em tons claros de amarelo com algumas flores vermelhas espalhadas longe umas das outras. Era simples, igual ao do apartamento. Com poucas decorações, livros ocupam a maior parte do local.

 Ao perceber que estava se apaixonando cada vez mais pela garota, sorriu. É uma sensação maravilhosa. E esperava continuar a senti-la.