-Para aqueles que ainda não (re)nasceram

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Eu não me lembro da primeira vez que vi uma garota e pensei em beija-la. Mas eu me lembro da garrafa girando no meio da roda.

E pedir a consequência que desejava sobre a verdade que ainda não estava pronta, depois passar semanas pensando naquela noite, no toque suave e do pânico iminente...

Será que sou um... deles?

E isso é ruim?

Eu não me lembro a primeira vez que tive coragem de admitir que eu era diferente das minhas amigas.

Mas me lembro de sentir ciúmes de João por beijar Maria...

Mas hoje quando penso bem, era Maria quem eu queria. Não sei ao certo se queria ser ela e a ter a coragem de assumir um cabelo roxo e um bottom colorido no peito, ou se queria ter ela, e passar as mão em suas mechas lilás desbotadas e nas cores bordadas no canto esquerdo seu moletom.

Eu não me lembro da primeira vez que conseguir dizer em voz alta que eu amava mulheres, mas eu me lembro de ter dito eu te amo a mulheres que nunca entenderiam a forma que eu as amava e depois guardar em segredo aquele sentimento em meu coração.

Não me lembro a partir de que momento começou, por que acho que no fundo sempre fui assim. Mas me lembro de quando entendi o que significava e de sentir medo... e como sempre, o medo do desconhecido gera ódio, lembro de odiar minhas colegas de classe que secretamente acreditavam que seria punida por isso, de olhar a imagem de cerâmica no altar da igreja aos domingos e pensar: Deus, se você vai me castigar por ser quem sou, por que me fez assim? É algum tipo de teste que preciso passar? É algum tipo de tentação a qual preciso resistir? 

O inferno não é lugar para menininhas que estão confusas sobre quem amar então por que Deus foi tão cruel assim?

Eu não me lembro de ter pedido o medo porque nasci mulher e LGBT num país que isso significa ter um alvo nas costas. E apesar de carregar minha bandeira azul e rosa na alma e a usar feito armadura, eu ainda sangro vermelho e ainda sinto dor. Mas me lembro do exato momento em que parei de me esconder, foi quando beijei uma garota nas escadas da escola e não ter senti nem. um. pouquinho. de. culpa. Pensei:

Que se foda essa merda. Se eu vou ser punida no final é melhor que aproveite cada segundo até lá.

Eu não me lembro de ter pedido para vir ao mundo assim, mas se eu soubesse onde ficam as almas daqueles que ainda não nasceram eu diria para ficarem calmos. Diria que o mau existe mas também a possibilidade de serem felizes, que não desistissem da vida por causa daqueles que não ainda não nos entendem, e que a vida é muito mais bonita do outro lado do arco-íris.

 Diria que o mau existe mas também a possibilidade de serem felizes, que não desistissem da vida por causa daqueles que não ainda não nos entendem, e que a vida é muito mais bonita do outro lado do arco-íris

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As coisas que escondo do espelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora