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Acordei assustada assim que notei minha incapacidade de respirar.
Tentava puxar o ar com todas as minhas forças mas parecia em vão, o desespero me consumia.

- Se acalme, senhorita! - Disse uma senhora que estava naquele mesmo quarto que eu. - Desse jeito vai se machucar!

- Não consigo... Respirar! - Falei segurando a mão dela firmemente.

- Você consegue, sim! Só não está acostumada a usar o Stays...

Foi ela falar isso que olhei assustada para baixo, tirei a coberta que estava em cima de mim, e notei que em minha cintura estava esse tal de... Stays.

Ele não pegava somente a parte da minha cintura, mas todo o meu tronco. Já havia visto esse acessório em filmes que se passavam em épocas antigas, ele servia para nada mais e nada menos do que moldar a silhueta feminina.
O que eu achava desnecessário.

- Está muito apertado! - Falei agonizando.

- Desculpe, querida, não posso fazer nada quanto a isso. - E a velha se voltou para uma cadeira que estava posicionada em frente a uma mesa de costura.

Olhei ao redor sem fazer a mínima ideia de que lugar era esse e como vim parar aqui. Mal me recordava da noite anterior... Era como se, depois que o imbecil do Richard tivesse me drogado, minha memória tivesse sido apagada por completo.

Notei que haviam infiltrações nas paredes, o papel decorativo que a cobria estava descascando. Ainda por cima, a cama que eu estava encima rangia com qualquer mínimo movimento que tentei fazer.

"É um lugar bem velho", concluí.

A senhora que estava neste mesmo quarto aparentava costurar algo de forma bem concentrada. O curioso é que eu nunca a vi antes e ao menos posso imaginar o porquê dela costurar justo no quarto em que estava tendo meu sono.

- Então... - Falei tentando chamar sua atenção. - Quem é... Você?

A velha se voltou para mim lentamente.

- Eu? - Ela pensou por um tempo. - Boa pergunta! Também não sei! - E um sorriso banguela abriu em seu rosto.

Ela usava um lenço amarrado em sua cabeça, parecia muito uma camponesa antiga.

- Tudo bem, vou mudar a pergunta: Que lugar é esse?

- O purgatório.

- O que!? - Gritei me levantando e, em seguida, me arrependo por ter feito isso tão bruscamente. Esse moldador que estava no meu corpo me machucava com qualquer movimento ágil que eu fizesse.

- É brincadeira! Isso aqui é um hotel! - Falou rindo sem se aguentar.

Então o Richard me drogou e me deixou num hotel de qualidade questionável? Só podia ser brincadeira...

Quando eu encontrar aquele desgraçado... Meu Deus! Nem imagino o que minha raiva vai ser capaz de fazer!

- Sabe onde está minhas roupas? - Falei olhando ao redor tentando encontra-las.

Estava me referindo às MINHAS roupas, e não este figurino sufocante e antigo que me vestiram.

- Não, senhorita, ele provavelmente arrancou de você.

A olhei envergonhada.

- Ele quem..?

- O rapaz que está transando com você.

Meu cérebro entrou numa paralisia repentina, não consegui pensar em absolutamente nada enquanto as palavras dessa senhora ecoava na minha cabeça.

"Transando"? No presente? Mas eu não estou transando com ninguém!

- Mas não tem ninguém aqui comigo, senhora...

- Acabei! - Ela se levantou segurando o pano que acabara de costurar. - O que achou?

Somente ali eu percebi que ela costurava um retrato, e não uma roupa qualquer assim como pensei.

Era como se tivesse feito uma "pintura", porém ao invés de usar pincéis, usou linhas e agulhas.

A imagem que estava em minha frente parecia ser de uma garota acorrentada.
Pensei algumas vezes antes de perguntar se aquilo simbolizava a mim, mas não fiz isso.

- Está lindo... - Falei sem entender do que isso se tratava.

- Obrigada! - Ela pendura o quadro na parede - Com certeza vai dar um ar melhor pra esse lugar mórbido!

Estava certa, esse quarto fedia a mofo e não parecia ser limpo à centenas de anos.
Pensando bem, tudo aqui parecia ser de centenas de anos atrás...

Meus ouvidos se concentraram em um som meio baixinho que vinha do andar de cima, parecia uma cama rangendo.
Imaginei que talvez tivesse ali um casal em seus momentos de intimidade pura.

Os momentos que nunca senti uma necessidade imensa em ter.

- São barulhentos, não acha? - A senhora falou enquanto deitava na MINHA cama. Quer dizer, acredito que é minha, né? Se o Richard pagou esse quarto pra mim, então ela não tem o direito de fazer isso.

- É constrangedor ouvir isso... - Falei acariciando meu próprio braço.

- Nem me fale. Devem estar em uns cinco lá em cima.

- Você acha? - Indaguei enquanto ia em direção à porta, planejando ir embora.

- Claro, amor, vi eles entrando junto contigo lá.

Minha mão, que estava indo de encontro com a maçaneta, parou.

- O que disse? - A encarei.

- Deve ser confuso pra você... Não force demais seu cérebro, está fraca!

Soquei a porta com toda a minha força. Não a quebrei, porém o barulho foi bem alto.

Não me reconheci naquele momento, jamais eu havia surtado neste nível a ponto de querer quebrar algo.
Mas esta senhora estava me assustando.

- Não é real, Sarah. Não sou real. - Ela suspirou se levantando. - Logo isso vai acabar e você poderá voltar pra casa.

Fui até ela e agarrei a gola da sua camisa, com raiva.

- Como você ousa dizer que estão transando comigo!? Isso não tem sentido!

- Você está lá, menina... Não aqui...

A soltei e passei a mão por meu couro cabeludo, o coçando, tentando achar uma explicação pra isso tudo.

Cogitei a ideia de ameaçar ainda mais esta senhor, pra ela deixar de ser tão enigmática... Mas isso seria ridículo.

Sem muitas opções, corri até o andar superior na minha maior velocidade e, ao chegar no quarto em que supostamente eu estava, tentei abrir a porta. Mas estava trancada, obviamente estava trancada.

Dei tapas e tentei a chutar, mas toda a minha força não foi suficiente para conseguir arrombar aquela maldita barreira que estava entre mim e aquela cena que precisava ser vista.

Sem poder fazer mais do que isso, botei meus ouvidos na porta na esperança de apenas ouvir o que ocorria ali, e logo em seguida me arrependi...

- Está gravando, Richard? - Dizia uma voz que não consegui reconhecer.

- Desde o início! - Respondeu ele.

O cansaço emocional me atingiu em cheio, fazendo meu corpo desabar encostado naquela porta.
Fiquei ali, com a cabeça entre as pernas, sem saber o que seria de mim agora.

E porquê não consigo saber o que está acontecendo exatamente lá dentro sendo que, de acordo com aquela senhora, SOU EU quem está lá...?

Esses cretinos iam pagar... Ah, se iam!

Era só questão de tempo até o efeito desse veneno passar.

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