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Não foi fácil me olhar no espelho assim que o dia amanheceu.
As olheiras gigantescas e escuras embaixo dos meus olhos demonstravam o quanto eu estava acabada.

Acredito que não me deixaram dormir um segundo sequer...

Simplesmente há um branco enorme em minha mente, tudo o que me recordo é a versão fantasiosa da realidade. Aquela da velha que estava costurando algo... Não faço ideia do que ela representava ali, mas mesmo assim, foi inútil.

Queria poder ter visto como eles estavam me tratando, mas aquele lugar não deixou. A porta era forte demais.

- Sarah? - Falou minha mãe invadindo meu quarto. - O Maurício disse que você só chegou em casa depois das 4:00, onde estava?

- Esse velho ainda fica me bisbilhotando? - Respondi enquanto maquiava meus olhos sutilmente para tentar esconder toda aquela escuridão embaixo deles.

- É pra isso que a gente o paga, e não há sobre o que você reclamar!

- Há sim, Angeline! - Minha mãe odiava quando eu a chamava pelo nome, e é por isso que eu amava fazer. - A vida é minha e devo toca-la da forma que eu quero!

- Então é assim que você têm olhado para a situação? Para a situação da nossa família?

- Para de me encher! - Caminhei até minha suíte e fechei a porta. Tudo o que eu queria era poder silenciar minha mãe, mas ela não parava de falar.

Acho que ela entendia o quão sua voz podia ser irritante, e é por isso que abusava disso.

- Não quero mais você andando com gente ruim, Sarah! Esses seus amigos não são confiáveis! - Ela gritava batendo na porta.

Se ela tivesse dito esta mesma frase à 2 dias atrás eu teria a confrontado. Mas hoje sei que realmente eles não são.

Pelo menos, o Richard não é.

Onde estava Marina? Sempre que ela ficou louca e saiu por aí dando trabalho foi eu quem a segui. Dei todo o apoio e conforto que uma melhor amiga precisa! Então onde estava ela quando chegou a minha vez de ser ajudada!?

- Quero uma explicação sobre esse roxo no seu pescoço! Abra essa porta! - Ela continuava gritando.

Enquanto sua voz ficava cada vez mais alta, acompanhando seu tom de raiva, fui passando meus dedos pelo meu couro cabeludo de forma agoniada.

Eu só queria saber o que eles aprontaram comigo. Ou então, só queria entender porquê eles aprontaram comigo...

Haviam marcas no meu corpo por todos os lados.

Nos meus peitos, bunda, braços e pernas... E ainda por cima, doía muito.

Acho que eles se divertiram muito comigo.

- Me diga, Sarah... - Falava minha mãe desistindo de conversar. - Porquê tem um vídeo seu rodando por todos os lugares..?

O que..?

Malditos! Malditos! Eu odeio cada um daqueles garotos!

Tudo o que eu quero agora é saber seus nomes pra poder caça-los e arruinar suas vidas assim como arruinaram a minha!

Abri a porta e encontrei minha mãe num tremendo estado de pânico.

Ela me abraçou assim que nossos olhares se encontraram.

- Vídeo? - Falei.

- Está por toda parte, Sarah! O que fizeram com você!?

Engoli em seco.

- Eu... Também não sei...

- Vamos chamar a polícia! Iremos faze-los pagar por isso!

- Não, mãe... - Ao responder isso ela me olhou completamente perdida. - Eu mesma vou fazer isso.

- Chega de brincar com coisa séria! Esses caras são malvados de verdade!

- E eu também posso ser. - Saí do abraço que ela me envolvia e peguei o celular, na tentativa de encontrar o vídeo.

Foi bem rápido, era uma das primeiras publicações quando abri as redes sociais.

Haviam também diversos garotos me mandando mensagens. Alguns me dando um apoio, mas o restante apenas diziam "Não sabia que suas roupas compridas escondiam tanta beleza", ou coisas assim.

"Gostosa", "Vêm pra minha cama", "Têm andado malhando? Não era assim quando te conheci"... Foram algumas das diversas mensagens que lotavam meu celular.

Onde foi que errei pra merecer isso?
Sério, onde?
Quando precisaram de mim estive ali, sempre! Nunca fui má-educada, emprestei dinheiro sempre que me pediram, aconselhei eles quando se sentiram desamparados... E agora destroem meu psicológico? A troco de quê?

Cliquei para abrir o vídeo e lá estava eu: Jogada numa cama nua enquanto alguns garotos se masturbavam ao meu redor.

Esses imbecis não gravaram seus rostos, óbvio... Ao menos tiveram coragem pra arcar com as consequências!

Sei que um deles é o Richard, principalmente pela cicatriz na barriga. Já o vi sem camisa algumas vezes, e ali no vídeo seu corpo estava à mostra.

Dava pra ver meus olhos perdidos, e eu gemia algumas coisas como se tentasse dizer algo... Algo como "Abra essa porta!".

Vai ver que esse é o momento das minhas alucinações naquele hotel.

Enquanto os gemidos nojentos daqueles rapazes eram emitidos pelo meu celular, minha mãe botou sua mão na frente da boca e voltou a chorar.

O impressionante é que eu mesma não estava triste, mas com raiva. Com muita raiva.

Eu queria os destruir, os caçar, os cobrar... Queria poder arrancar cada membro de seus corpos!

Mas foi então que eu percebi... O que de fato fizeram comigo?
Nunca, em toda minha vida, tive vontade de matar alguém. Ou simplesmente, machucar!

Sempre tive dó de até mesmo pisar em algum bichinho aleatório, mas agora eu queria era tirar a vida de alguns rapazes! A droga me modificou tanto assim? Ainda estou sob efeito dela?!

Seria tudo isso real ou apenas um podre sonho ruim?

- Não precisamos falar disso de novo, querida... - Falou minha mãe limpando o nariz. - Eu e seu pai podemos resolver sozinhos.

- O papai já sabe?

- Foi ele quem me mostrou...

Suspirei e olhei para a grande janela do meu quarto.
Impressionante como minha vida conseguiu se tornar vazia repentinamente.

- Está bem. - Falei sem olhar para ela.

Suas mãos acariciaram meus ombros e logo após, minha mãe saiu do meu quarto.

Estava só novamente, naquele grande cômodo, cheio de roupas, bolsas, maquiagens...

Sempre tive tudo o que quis, mas agora, sinto que algo falta dentro de mim.

Pra começar: Preciso descobrir quem são todos esses garotos.

Mas antes: Necessito de outra dose. Outra dose de Nuse.

NuseOnde histórias criam vida. Descubra agora