Capítulo 12

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Um dia se passou desde o quase suicídio de Stephano. Eu tô começando a odiar a escrever "suicídio" depois daquilo. Quanto a ele, ele estava no quarto, seguro. De acordo com Jean Marco e Katherine, foram no mínimo dez tentativas. Dez. Eu me sinto horrível. Eu adoro ele, nunca mais o quero ver daquele jeito.

Acordei antes de Jean Marco e caminhei até a cozinha para pegar alguma coisa. Peguei uma maçã na cozinha, já era meio-dia. Katherine estava fazendo o almoço, ela parecia uma boneca, tão perfeita que nem parecia humana.

Andei até o quarto deles e vi Steph olhando um filme, acho que era De Volta Para o Futuro. Sorri e sentei ao seu lado, ele sorriu de volta para mim. Eu já escrevi isso no primeiro registro, vou escrever de novo: Ele é muito bonito, e agora Jean é como uma "escala reduzida" dele.

-Você gosta mesmo do filme. -eu disse- Tipo, seu carro.

-Foi o filme que eu e Katherine vimos na noite que a pedi em casamento. Éramos grandes fãs do filme, sabia que a impressionaria se comprasse um carro igual. -ele tirou a franja dos olhos, mas ela voltou mesmo assim.

Ficamos em silêncio, apenas com o som da maçã e do filme. Após um bom tempo, respirei fundo e perguntei:

-O que te levou a... Você sabe.

Ele me entregou um monte de papéis. Era um pequeno registro desde o primeiro dia até noite passada.

-Pensei que... -ele suspirou- Se eu fosse, tudo continuaria o mesmo. O sol nasceria, o dia iria clarear e todos continuariam a viver suas vidas, sem se preocupar com um pequeno acidente.

Naquele momento eu estalei. Eu dei um tapa no seu braço e meus olhos ficaram cheios de lágrimas. Tentei dar outro tapa, mas ele segurou meu pulso.

-Seu egoísta... Como pode chegar a esse ponto?! Achar que você é tão inútil que ninguém mais liga?! -tentei parar de chorar, mas era impossível- Katherine choraria todos os dias por que você não estaria dormindo ao lado dela. Jean Marco ficaria sem comer, sem dormir, sem nem poder olhar para os sobrinhos sem se lembrar de você e desabar. Clarence faltaria o grupo e choraria onde pudesse, no carro, em casa, em qualquer lugar. E o seu irmão gêmeo? O que ele faria, sem nem estar junto a ti? E EU?! Eu choraria desesperadamente, nem poderia olhar para Jean sem chorar por que ele é idêntico a você. Eu me mataria para ficar ao seu lado.

Eu chorei mais forte e tentei dar um tapa no seu rosto com a outra mão, mas os reflexos dele me impediram. Arranhei um pouco suas mãos com minhas unhas curtas pintadas de azul, tentando parar de chorar.

-Por favor... -solucei- Nunca mais diga que ninguém se importaria se você se matasse. Nós nos importamos. Nos importamos demais.

Ele soltou meus pulsos e me abraçou fortemente, secando minhas lágrimas suavemente. Ele depois sorriu para mim e repetiu várias vezes que tudo ficaria bem, que eu não precisaria chorar mais. O som da voz dele me deixava muito segura. A mesma voz que me ergueu quando eu quase me esborrachei no chão algumas semanas atrás.

Pouco depois, sentei ao seu lado para terminar de ver o filme. O meu delineador e rímel estavam totalmente arruinados, mas eu nem me importava. Era muito bom ficar ao lado dele.

Fomos até a cozinha, tive que tirar toda a maquiagem da noite passada (sim, eu sou preguiçosa o bastante para dormir sem tirar a maquiagem). Katherine e Jean estavam a nossa espera, alimentando as crianças. Enquanto almoçávamos, Katherine contava um monte de coisas interessantes, como que Stephano lutava esgrima (tipo uma luta de espadas, é bem legal), que ele falava umas cinco línguas fluentemente e que Clarence e os pais dele cuidaram de Steph e os irmãos quando eram adolescentes. Por isso ele era tão importante para ele.

Depois do almoço, meu pai voltou para casa, dizendo que foi demitido por dormir no trabalho. Bem típico do meu pai, ele perdeu no mínimo sete empregos fazendo isso.

Como não tinha nenhuma reunião naquele dia (na verdade tinha, mas não fomos), ficamos passeando por perto da casa dele. O passeio durou bastante, a paisagem francesa é muito bonita. Assim que subimos uma colina, vimos um monte de destroços e cinzas.

-O que é aquilo? -perguntei a Steph.

-Uma casa que foi destruída pelas chamas um tempo atrás. -ele sorriu para mim- Mas ninguém mais se importa com isso. Me admira que ainda tem um pouco da estrutura.

O solo perto da estrutura da casa estava preto e cinza, quase deprimente. Não sei o que tinha ocorrido no dia em que a casa foi ao chão, mas a minha curiosidade despertou.

Finalmente voltamos para a casa, andei para o meu quarto e dei uma lida rápida do registro que Stephano tinha me dado. Eu provavelmente vou passar a limpo no meu próprio registro, me parecia bem interessante.

Andei para a sala de estar, Jean Marco e o meu pai estavam conversando. Como não queria interromper, fiquei apenas espiando, mas Jean estava dizendo o quão apaixonado ele estava por mim e como tinha sorte de achar uma menina como eu. Meu pai estava feliz, pois eu iria saber o que minha mãe sentiu quando estava namorando meu pai. Eu estava bem feliz, até sentir um tapa na minha cabeça. Já sabia quem era.

-Não vai ficar espiando, sua mal educada. -Stephano riu. Nem reclamei, já estava acostumada com esses tapas. Andamos até meu pai e Jean, eles estavam sorrindo para nós. Bem, o dia estava quase acabando, então decidimos ver um filme de terror. Odeio filmes de terror, mas vou ter uma desculpa para me agarrar no Jean. Meu pai não gosta, então ele subiu para o seu quarto.

O filme era "O Bebê de Rose Mary", um filme que todos os meus antigos colegas tinham assistido e me caçoavam por não ter visto, e também por causa do meu nome e pelo fato de estar sempre quase chorando. Eram uns filhos da mãe.

O filme era sobre uma mãe grávida com vizinhos que participavam de uma seita satânica que queriam que o bebê fosse o filho do demônio. Eu sou muito medrosa, não sabia o que viria e me assustava com qualquer coisinha. Eu segurei o braço do Jean tão forte que quase arranquei o braço dele fora. Mas ele nem reclamou. Stephano não tinha expressão alguma, como se estivesse entediado com o filme.

Como ele consegue ficar entediado com um filme de terror voltado a adultos?! Pensei.

Katherine ficou muito empolgada, sempre sorria como uma maníaca e torcia pelas cenas de terror. Agora entendo por que ela e Steph se gostam tanto.

Depois de uma hora e pouco, o filme acabou. Eu estava com o rosto enterrado no ombro de Jean, com muito medo. Não sei se ele também estava com medo, mas provavelmente também estava, pois quando ele foi acariciar meu cabelo suas mãos estavam suadas e tremendo.

Steph e Katherine foram para o quarto, Jean disse que não iria dormir e tentaria virar Super Mario 64 no computador. Eu dei um beijo nele e fui para o meu quarto, começando a ler o registro que Steph fez nos dias que ele estava sobre o efeito do experimento. As primeiras páginas estavam bem, mas as últimas estavam com umas manchas vermelhas, letras tremidas e o papel amassado. Quanto mais tempo ele ficou sobre o efeito, mais insano ele se tornava.

Demorei umas horas para dormir, a última vez que escrevi era meia-noite e meia. Maldito filme. Vou escrever o registro dele no meu registro para passar o tempo.

A Voz Oculta (A Portadora dos Sonhos 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora