Capítulo 9

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Parece incrível, mas o quanto maior a urgência, mais o tempo passa devagar. O jantar foi bom, com muita conversa, mas eu realmente precisava falar com Katherine. Shakur já estava morto, Rima lutava para conseguir vencer, mas Stephano era o próximo. Eu não queria que ele morresse.

Não queria que ele tivesse aceito esse teste. Ele apenas queria proteger a mim e ao Clarence, mas no final queria que pelo menos eu tivesse feito para não sentir essa dor no meu peito.

Finalmente, meu pai se ofereceu para lavar os pratos. Eu nem olhei para Jean Marco e fui até meu quarto, esperando Katherine passar por perto para eu poder falar com ela.

Uns 15 minutos se passaram e eu ouvi o violino tocando de novo. Desta vez o som não vinha daquele quartinho pequeno no andar de cima, vinha da sala de estar. Andei pelo corredor calmamente para espiar pela fresta da porta, apenas para ver a cena mais adorável de todas: Stephano tocando o violino com Katherine abraçada nele e as crianças dormindo ao seu lado. Eu quase morri por causa da fofura que vi, mas depois eu percebi que ele estava fazendo isso pois provavelmente não retornaria amanhã.

Depois de um tempo, ele parou e sorriu para Katherine. Eu acho que ela não sabia ainda que ele estava submetido a um teste que provavelmente o faria se matar, por isso eu teria que avisá-la. Assim que notei que eles estariam chegando, me escondi atrás da porta e esperei.

Stephano voltou para o seu quarto e Katherine colocou as crianças na cama. Assim que ela voltou, segurei o braço fino dela suavemente e sorri.

-Katherine. -sussurrei- Preciso falar com você a sós.

Ela assentiu com a cabeça e segurou minha mão, me levando para a cozinha. Sentei na bancada enquanto ela servia um chá.

-Sobre o que, querida? -ela disse e sorriu.

-É... É sobre Steph. -disse calmamente, mesmo estando desesperada por dentro- O que sabe sobre o estado emocional dele?

-Querida, que pergunta estranha... Bem, nós nos conhecemos na faculdade, eu estudava psicologia e ele química, quando nos encontramos, foi amor a primeira vista. Fiz alguns exames para ver o emocional dele, ele tinha algo como uma depressão avançada, tentou cometer suicídio várias vezes. Quando nos casamos e tivemos Isabelle e Jaques, ele parou.

Suspirei e mordi o lábio inferior. Precisava contar isso agora.

-Entendo. Bem, uns dias atrás, ele quis participar de um experimento, alguma coisa para ver o demônio interior ou algo do gênero. Enfim, ele fez isso e agora eu tenho medo que ele se mate.

Ela parou de sorrir e os seus olhos azuis se encheram de lágrimas. Eu queria reconforta-la mas também estava chorando. A abracei firmemente e continuei chorando.

-Estudei Freud... O demônio interior, ou ID, é como um outro si que constantemente aponta falhas, coisas assim. Com uma mente deste estado, ele nunca deveria ter feito este experimento... -ela soluçou.

Olhei para ela e sequei minhas lágrimas. Doía em nós duas, a perda dele era mais do que inevitável, era certeira. Só de pensar que ele não estaria no casamento da Isabelle, na formatura de Jaques, isso já nos matava por dentro.

-Tem alguma cura?! Diga que tem alguma cura! -ela segurou meu rosto e gritou

-Uma menina do grupo perdeu o irmão e disse que dá para convencê-lo o contrário. Não se preocupe, eu farei algo. -sorri e a abracei calorosamente, dizendo que faria algo.

Ela secou as lágrimas e sorriu para mim. Ela acreditava em mim e sabia que faria algo para consertar isso. Com um leve carinho no meu cabelo, ela voltou para o quarto dela, mas eu continuei lá.

Enquanto me perdia nos meus pensamentos depressivos, de repente ouvi uma música muito conhecida, algo que reconheceria de longe. O tema principal de Super Mario Bros.

Andei até a sala de estar e Jean Marco estava jogando no Nintendo Wii, frustrado com o som que soa quando você morre. Sentei ao seu lado e olhei ele jogando. Mesmo no primeiro mundo, ele era muito ruim.

-Cara, quer que eu te mostre como se joga? -perguntei.

-Não. Eu consigo fazer. -ele retrucou.

Deslizei para trás dele e coloquei minhas mãos no controle, os dedos em cima dos dele. Ele ficou vermelho e parou de se mexer.

Comecei a jogar o jogo, conseguindo fazer tudo direitinho até a fase final. Ele nem se mexeu, nem protestou, apenas ficou me observando jogar.

Assim que acabei as primeiras quatro fases, ele deu pausa no jogo e jogou o controle no sofá. Mas nossas mãos ainda se tocavam. Ele olhou para mim e sorriu timidamente, as bochechas coradas (mas nem tanto quanto as minhas).

-Só perguntando, como foi seu encontro com aquele cara? -ele perguntou.

-Foi horrível -eu ri- ele quase me matou!

-Eu não te mataria no nosso primeiro encontro...

-Esse não é o nosso primeiro encontro?

Ele ficou ainda mais vermelho.

-Você é muito bonita... Primeiro eu me apaixonei por você no livro, depois pedi para o meu irmão me mandar uma foto sua. Quando te conheci não podia ficar mais feliz... -ele disse.

Eu sorri e o abracei firmemente. Ele era muito querido, sei que era ele. Apenas ele. Todos os meninos que conheci apenas gostaram de mim por causa da minha aparência e do que eu gosto, mas não ele. Jean Marco se apaixonou por mim pela minha história e depois pela minha aparência.

O silêncio ocorreu por alguns minutos, até que, por minha surpresa, senti algo suave como seda nos meus lábios, tocando levemente. Eram os lábios dele. Nós estávamos nos beijando. Assim que me toquei, enrolei meus braços ao redor do pescoço dele e o beijei de volta, deixando o tempo fluir e passar lentamente.

Quando páramos, encostei minha testa na dele e ficamos assim por um bom tempo. Era tarde e eu estava muito cansada, mas não queria dormir. Jean Marco se deitou no sofá e eu me recostei nele levemente, continuando a jogar.

-Jean... -disse- Você ficou mesmo chateado quando saí com aquele outro cara?

-Sim... Eu passei tempo demais esperando pela pessoa certa. Não queria que você deslizasse para longe me mim... -ele suspirou. Pausei o jogo e dei um beijo na bochecha dele sorrindo, como se quisesse falar "está tudo bem. Estou aqui com você".

O tempo foi passando, conversamos, eu consegui virar o jogo e estávamos bem cansados. Decidi dormir ali mesmo abraçada nele. Deixei ele beijar meus lábios (eu nem sabia como fazer isso, é muito vergonhoso) e assim nós caímos no sono devagar, abraçados e finalmente juntos.

Mas ele ainda não sabia. Eu tinha pouco tempo.

A Voz Oculta (A Portadora dos Sonhos 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora