19. Não tenho culpa de ser tão hipnotizante

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Charlotte balançou os dedos das mãos como se estivesse esvaindo seu nervosismo, olhava para a porta fechada da casa de sua avó sentindo seu coração querer sair pela boca. Do lado de dentro uma pequena multidão tomava todos os espaços, risos e gritos podiam ser ouvidos junto com a música alta que fazia o local tremer. Inspirou profundamente, soltando o ar com cuidado com medo de que todo o seu oxigênio sumisse de seu corpo.

- Eles vão mesmo acreditar nisso?

Ouviu a voz hesitante de Henry ao seu lado, virou-se para encarar o amigo que parecia estar prestes a vomitar. Ela o pediu um imenso favor, fingir que estavam namorando naquele fim de ano para que todos os pretendentes empurrados por sua família parassem de aparecer. Charlotte amava ir para a casa de sua avó, mas ter que lidar com a inconveniência de parentes tirava o brilho de tudo, e para isso resolveu levar Henry naquele ano e aproveitar da melhor forma possível o seu último Natal antes da faculdade.

- Não se preocupe, de acordo com todos somos praticamente um casal mesmo. - abriu um sorriso tentando transmitir confiança, porém notou que Henry parecia mesmo prestes a passar mal.

- Eu só, hum, você sabe que eu sou um péssimo mentiroso.

Ela olhou para os lados, notando que não havia ninguém a vista, o puxou pela mão para sentar em um balanço que ficava na varanda. O Hart engoliu em seco enquanto olhava para a rua decorada, Charlotte retirou suas luvas e levou as mãos geladas ao rosto dele, seu pequeno susto a fez sorrir.

- Você não precisa mentir, somente concordar quando disserem que estamos juntos, não negar quando perguntarem sobre nós dois e falar bem de mim. - garantiu, o vendo inclinar o rosto levemente para ter mais contato com sua pele, sentiu sua face esquentar.

- E se eu ferrar com tudo? - perguntou em uma voz arrastada, esticando a mão inconscientemente sobre o joelho da Page.

- Então. - parou, arranhando a garganta quando o toque dele a fez se desconcentrar. - Então saímos daqui e vamos comer panquecas.

- Até que seu plano B é bem convidativo.

Riu junto com ele, puxando suas mãos para o colo e recomeçando a colocar as luvas, Henry envolveu suas mãos com as dele antes que ela colocasse a última. Levantou o olhar para encontrá-lo a observando com um singelo sorriso, franziu um pouco a testa pelo seu comportamento, porém indagou rindo:

- O que houve?

- Nada. - respondeu, sem tirar a atenção de seu rosto.

Charlotte se sentiu inquieta, umedeceu os lábios e apertou as mãos do Hart. Ela então soltou um suave riso, puxou suas mãos e levantou-se depressa.

- Vamos entrar antes que comecem a me ligar.

Estendeu uma mão à Henry que a segurou com uma expressão que fez seu estômago embrulhar, os olhos brilhando em um conhecimento típico de quando ele descobria algo. Resolveu ignorar e o puxou para se colocarem novamente em frente à porta, assim que esticou a mão para tocar a campainha, a mesma foi aberta dando visão a uma de suas tias que os encarava com um sorriso quase assustador no rosto.

- Achamos que vocês nunca iriam entrar!

Foram puxados para dentro, quase tropeçando em quem aparecia adiante. A atenção que tiveram, os comentários e brincadeiras foram o que a tinha feito trazer Henry como seu namorado. Só via a família por parte de seu pai em datas especiais, seu convívio era maior com o lado de sua mãe e o fato deles serem intrometidos em níveis totalmente diferentes mudava seus planos quase constantemente.

Sentiu seu rosto esquentar novamente quando viu Henry passar de mão em mão como se fosse um milagre encarnado, seus primos a puxaram para a uma pequena roda e a encheram de perguntas. Agradeceu aos céus quando sua avó afirmou que estava na hora de todos comerem e ela pôde segurar Henry ao seu lado até o fim da reunião familiar.

Quando enfim colocaram os pés para fora, com os braços cheios de tupperware, puderam respirar aliviados por terem passado pela provação. Sentia a risada borbulhar em seu peito, ainda sem acreditar no que havia acabado de fazer, mesmo com a falta de seu pai e todas as loucuras tinha que admitir que a noite não foi o pesadelo que pensava que iria ser.

- Até que foi divertido.

- Claro que você achou divertido, o tanto de atenção que recebeu. - provocou, guardando a comida com cuidado no banco de trás do carro.

Henry riu alto, o som aquecendo seu coração enquanto dava a volta para sentar no banco de carona.

- Não tenho culpa de ser tão hipnotizante.

- Não se ache tanto, sua beleza só fez metade do trabalho. Estavam surpresos por eu ter achado alguém, isso sim. - garantiu, fechando a porta e o encontrando com um sorriso astuto no rosto. - O que foi?

- Quer dizer que você acha que sou lindo. - comentou, movendo as sobrancelhas de maneira implicante.

Charlotte revirou os olhos, o empurrando levemente pelo ombro e escutando sua gargalhada em seguida. Henry ligou o carro e saiu da vaga com uma cautela que ainda a impressionava, ligou o rádio para que uma música preenchesse o silêncio. A voz grave de Elton John se espalhou pelo pequeno espaço, olhou supresa para o amigo que deu de ombros com um visível sorriso.

- Minha mãe foi a última a usar o carro, ela ama essa estação. - justificou, tentando parecer desinteressado, mas ela via seu joelho se mover para cima e para baixo no ritmo da música.

Sorriu, inclinando o corpo contra a porta e apoiando a testa no vidro frio da janela, do lado de fora observava as luzes borradas dos postes que se misturavam as casas decoradas iluminando os pedestres e outros veículos. Cruzou os braços, quase fechando os olhos de cansaço quando a voz baixa de Henry a despertou.

- And now she's in me, always with me/Tiny dancer in my hand...

(E agora ela está em mim, sempre comigo/ Pequena dançarina na minha mão)

O fitou de soslaio, notando que o mesmo não havia percebido que estava cantando. Virou-se devagar, sentindo o cinto apertar quando sentou de frente para ele, então apoiou a lateral do rosto no apoio do banco e se pôs a observá-lo.

- But oh how it feels so real/ Lying here with no one near...

(Mas, oh, é tão real/ Ficar aqui sem ninguém por perto)

Henry continuava, ganhando confiança a cada nota e interpretando a letra como se estivesse declamando a alguém. Riu de sua performance, chamando a atenção para si e achando adorável quando as bochechas do Hart se tingiram de um leve vermelho. Henry continuou cantando, quando pararam em um semáforo vazio olhou para ela ao proferir a próxima estrofe.

- Hold me closer, tiny dancer/ Count the headlights on the highway...

(Me abrace forte, pequena dançarina/ Conte as luzes dos postes na estrada)

O sorriso no rosto de Charlotte aumentou, ela esticou a mão em direção à ele, seu corpo esquentando quando o Hart beijou a palma de sua mão e a levou em seguida ao próprio coração. Ao fim da música uma leve estática pôde ser ouvida, um silêncio se seguiu, somente o bater dos corações jovens podiam ser ouvidos assim como a leve chuva que começava a cair do lado de fora.

- Obrigada por ter vindo. - sua voz saiu em um sussurro, parecia que qualquer tom mais alto seria um sacrilégio dado o momento em que se encontravam.

- Eu nunca negaria algo a você. - afirmou leve, aproximando seu corpo do dela.

- Posso pensar em uma lista das vezes em que você me disse não. - provocou, o escutando rir enquanto ainda apertava sua mão contra o peito.

- Também posso pensar em uma lista das inúmeras vezes em que disse sim.

Charlotte mordeu o lábio inferior tentando diminuir o sorriso bobo que parecia estar colado em sua face. Henry aproximou ainda mais seus rostos, tocando seu nariz no dela ao provocá-la uma pequena risada.

- Se eu pedir algo agora, qual vai ser a sua resposta?

O Hart fingiu pensar, mas se absteve da reposta ao vê-la com um brilho provocador no olhar. Seus lábios se tocarem no instante seguinte, hesitantes no início, porém apaixonados em poucos segundos. A chuva caía mais forte, batendo nos vidros e deslizando até seu fim, o mundo do lado de fora se transformava ao passo que do lado de dentro do simples carro, um novo mundo se formava.

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