2.3 : Agridoce

44 2 0
                                        

|||Angeais, A Mesma Noite|||

   Alastair movia-se com o gingado de um bailarino que tinha passado séculos frequentando salões de festas, matando as madrugadas com grandes quantidades de álcool e dançando até o amanhecer. Quando estava envolvido pelo ritmo daquele jeito, era livre como nunca.

Conforme a música se desenrolava, os dançarinos cercaram ele e Ellara e o que era pra ser um festejo refrescante ao ar livre, tornou-se uma farra quente e úmida pelo suor da multidão em movimento. 

A floresta parecia ferver com tanta agitação. 

Ellara e Alastair pareciam ferver em uma estranha sintonia recém-descoberta.

A feiticeira cheirava à jasmins e álcool puro, no entanto, apesar de quase tropeçar umas duas vezes, não chegou a pisar nos sapatos escuros e chiques do anjo caído.

Alastair, entretanto, estava muito absorto nos olhos amendoados dela para perceber qualquer pisão que ela viesse a dar. Em certa altura, culpou até mesmo a bebida pelos pensamentos que invadiam-lhe a cabeça, embora mal tivesse ingerido uma gota sequer daquela nojeira amarela.

Seria o calor? Seria o ar de Angeais? Ele buscava uma explicação para o incômodo provocante que vinha sentindo desde o momento em que tocara a pele de Ellara, mas falhava em encontrar a resposta.

Ele queria deixá-la, mas também queria puxá-la para mais perto.

Queria desprezá-la como fizera com tantos outros, mas também queria roubar todos os olhares dela para si.

Queria soltá-la no meio da dança e quebrar aquele feitiço que ela provavelmente tinha lhe lançado, do mesmo jeito que desejava ser consumido por ele.

A feiticeira girou para longe dele e quando voltou aos seus braços, estava sorrindo por quase ter tropeçado mais uma vez. Alastair notou que aquela era a primeira vez que via Ellara sorrir verdadeiramente e a sensação era a mesma de ter visto um animal raro pela primeira vez.

A pessoa que fizesse aquela garota feliz ao ponto dela sorrir daquele jeito seria o sujeito mais sortudo do mundo, o anjo caído pensou consigo mesmo. 

Antes que mergulhasse em mais pensamentos perigosos, no entanto, ele focou no ritmo e torceu para que toda aquela confusão desaparecesse de sua mente, que já era muito perturbada.

Quando a música acabou e Ellara enfim se afastou dele, voltando à mesa de bebidas, Alastair se sentiu um pouco aliviado. 

E um idiota completo.

A revelação que surgia diante dele lhe parecia uma piada perversa e sombria, uma zombaria do destino ou mais uma punição do Pai que o renegava.

Para sua desgraça, o anjo caído estava apaixonado pela pessoa que deveria destruir.

*****

   Ellara foi puxada para uma ciranda já perto do amanhecer, onde curiosamente as pessoas pareciam nunca ficarem cansadas. Enquanto girava de mãos dados com um elfo e um humano, a feiticeira sentiu como se fosse uma criança de novo, aproveitando a vida boa que tinha antes de Andra.

Quando a música acabou, os dançarinos se espalharam e lentamente, a festa se encerrou. 

A bebida aparentemente tinha evaporado do corpo, pois Ellara não sentia nenhum sintoma da ressaca terrível que jurava que ia ter. Ela tirou os coturnos e pegou umas sobras de biscoitos da mesa de guloseimas, onde fitas coloridas e flores estavam jogadas por cima dos pratos.

Dama do FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora