⩩ 𝗌𝖺𝗂𝖺 𝖽𝗈 𝖻𝖺𝗇𝗁𝖾𝗂𝗋𝗈

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Personagem: Han Jisung.

Eu não tomo banho, é algo que meu irmão zomba de mim há anos e é algo que não me atrevo a deixar meus amigos descobrirem, mas ninguém, absolutamente nenhuma pessoa, nem mesmo me pagando um milhão fará eu tomar um banho, nem me atrevo a entrar em um banheiro se ele tiver uma banheira; estou falando sério, faço minhas necessidades em um mato próximo só para não ficar perto de uma banheira, minha mãe insistiu que eu procurasse terapia ou algum tipo de ajuda psicológica.
Em algum momento fiz isso apenas para tirar ela do meu pé, na primeira sessão eles me incentivaram a tentar tomar um banho como apenas entrar na banheira para saber que é segura, não marquei uma segunda consulta, eu sabia que não era seguro, não para mim.

Algumas pessoas evitam tomar banho devido a problemas na pele ou apenas alguma doença rara que deixa a pele sensível a água e tenho certeza de que isso é uma boa explicação para os profissionais, mas nenhum desses problemas é o meu, o motivo para eu não tomar banho é o ralo.

Cerca de cinco anos atrás eu estava estudando por volta das nove horas da noite sozinho no meu apartamento, já que meu colega de quarto trabalhava à noite, reconheço que estava um pouco estressado e sem sono, estudar para a pós-graduação é sempre uma merda, eu estive enfiando informações na minha cabeça nas últimas 12 horas então achei que merecia uma pausa; a coisa que eu mais gostava de fazer para lidar com o estresse era tomar longos banhos quentes, entrei então em nosso banheiro compartilhado, tirei a roupa, liguei o chuveiro no máximo e me deixei mergulhar naquela chuva quente e purificadora por meia hora.
Normalmente tenho mais cuidado na economia de água, mas naquela vez em particular tive uma longa tarde e no dia seguinte seria mais longo ainda, sem falar que eu teria exame logo cedo. Sentindo-me rejuvenescido puxei as cortinas e saí do banheiro, enquanto secava meu cabelo eu ouvi algo como um sussurro.

- ei - dizia, embora tenha me parecido estranho, não me assustou.

Por algum motivo eu tinha certeza de que não era um som vindo do apartamento do vizinho e podia dizer também que não era minha imaginação, eu só...sabia disso, por algum motivo.

Eu o ouvi de novo, só que um pouco mais alto.

- ei! - na época não me lembrei, mas eu senti como se aquela voz fosse familiar, como se fosse a voz de um amigo de infância, mas de alguma forma ao mesmo tempo eu sabia que nunca tinha ouvido essa voz antes.

Sabe aquela sensação de confiar numa voz completamente como da nossa mãe? era eu naquele momento, embora não soubesse de quem era ou de onde vinha.

Então, eu o ouvi novamente.

- ei, vem cá!

Pensando agora, nem consigo me lembrar de como era a voz, não parecia masculina ou nem feminina, jovem ou velho, tudo que eu tinha em mente é que confiava nela de todo o coração por algum motivo.

- ei, vem cá, eu quero te dizer uma coisa - eu me virei em direção da voz, estava vindo da banheira - vem cá - notei que tem um som borbulhante na voz dessa vez, estava vindo do ralo.

Qualquer pessoa no meu lugar teria se virado e corrido, ou pelo menos saído do banheiro para ir para cama se cobrir e nunca mais sair. Mas como eu disse antes, eu confiei nessa voz, quem quer que fosse fiquei intrigado com aquela voz gorgolejante tinha a dizer, como se fosse algum gênio da lâmpada estar ali para me conceder três desejos.
Com o consenso de curiosidade infantil, me aproximei da banheira.

- sim, isso mesmo, mais perto agora - a voz me pediu, eu obedeci e me agachei na frente do ralo esperando ansiosamente qualquer mensagem que aquilo queria me dizer - mais perto, eu quero que você me ouça alto e claro! - abaixei-me colocando minha orelha direita o mais perto do ralo que pude - perfeito! - a voz disse.

Senti algo úmido forçar seu caminho para dentro do meu canal auditivo como uma língua, mas mais pegajosa e muito fina para ser humana, finalmente entendi que estava em perigo.

Gritei a plenos pulmões e me joguei para longe do ralo o mais forte que pude, ouvi uma série de estalos seguidos de choramingos e havia muito sangue; eu liguei para os paramédicos e mal consegui forçar palavras inteligíveis, felizmente para mim eles entenderam o suficiente do que eu disse, conseguiram me encontrar e me levaram às pressas para o hospital, não fui ao exame no dia seguinte, não me importei, liguei para minha mãe me ajudar a arrumar minhas coisas e me mudei daquele apartamento no dia seguinte.

Depois de fazer vários raios-x naquela noite no hospital, o médico de plantão descobriu que meu tímpano direito havia sumido completamente, não danificado mas sim desaparecido; meu senso de equilíbrio nunca voltaria ao normal, é o tímpano que faz isso, embora o implante cirurgico pudesse me ajudar a viver uma vida normal, porém nunca mais seria capaz de ouvir com aquele ouvido, nem mesmo com aparelhos auditivos.

Como eu gostaria que essa última parte fosse verdade, como gostaria de realmente não ouvir nada depois desse ocorrido, como gostaria que não tivesse essa curiosidade idiota de um instinto burro, no meu caso a surdez seria uma benção.
Lá no banheiro antes dos paramédicos chegarem, quando arranquei a língua de meu ouvido, abaixo dos meus gritos de terror pude ouvir uma risadinha minúscula, ouço ela em meu ouvido direito toda vez que me aproximo de um ralo, qualquer ralo; eu tentei de tudo para fazer isso parar, mas eu ainda o ouço zombar de mim.

Você pode até tomar banho depois disso, achar que é só uma histórinha à tona, mas pelo menos então, fique o mais longe possível do ralo.

𝐏𝐄𝐓𝐈𝐓𝐄𝐒 𝐇𝐈𝐒𝐓𖣠𝐈𝐑𝐄𝐒 𝐃'𝐇𝐄𝐔𝐑𝐄 𝐃𝐔 𝐂𖣠𝐔𝐂𝐇𝐄𝐑 Onde histórias criam vida. Descubra agora