Uma noite sem lua nem estrelas

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"E diz: 'agora eu me tornei a morte, a destruidora de mundos'. Eu suponho que todos nós pensamos isso, de uma forma ou de outra".
- J. Robert Oppenheimer.

"A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor, sem perfume
Sem rosa, sem nada."
- Vinícius de Moraes (A Rosa De Hiroshima).

"Os seres humanos me assombram."
- A Morte (A Menina que Roubava Livros).

*Narração de Saturno*

03:32 da madrugada:

Depois que o elevador parou, saímos dele para um novo corredor sombrio e vazio.

O Noite conseguiu abrir um buraco no teto, o que foi estranho, mas serviu para subirmos para a parte de cima do prédio, ele me levantou até lá enquanto eu segurava Vitor e depois pulou junto com a máquina de luz.

Estávamos finalmente no teto, eu permanecia com dores pelo meu corpo principalmente por levar Vitor, então demorou até eu poder ficar de pé. Olhei para o céu, esquecendo tudo a minha volta, ele estava ainda mais sombrio daquela altura, as sombras escuras aparentavam se mexer pelos céus, mas de uma forma sem vida, como máquinas preparadas para acabar com todo ser orgânico na Terra, completa indiferença.

Andamos até perto da beira do teto, aquela área era retangular e bem grande, era bem mal cuidada e cheia de sujeira e cocô de pombo, o que fez eu me sentir rodeada de câncer. Ao olhar para o mundo lá fora de cima, uma dor invadiu meu coração como um tapa sem piedade em todos os meus pontos fracos, lá embaixo estava um completo deserto sombrio, cores acizentadas dominavam a paisagem, plantas para todo lado tinham perdido suas folhas e se tornado secas e sem vida.

Tudo parecia vazio, era um cenário apocalíptico deprimente que me levou às lágrimas, uma pintura cinza criada pelo pintor mais triste, vazio e sofrido do mundo.

Senti uma dor imensa, as feridas em meu corpo retornaram, Noite me segurou e conseguiu me deitar, comecei a gritar pelo que pareceu horas, porém provavelmente foram minutos. Se pudesse perguntaria para o Noite para saber.

Senti que as sombras estavam dominando tudo, mas de alguma forma Noite estava me protegendo, quando olhei para o céu pude ver ainda mais estrago.

Aconteceu um evento que apenas poderia ser descrito perfeitamente por um louco neurótico, por todo lado que eu consegui ver, começaram a cair diversos pássaros como se fossem uma chuva imensa, vários caíram encima do prédio justo com a gente, um até caiu em minha cabeça.

Quando olhei para os que haviam caído perto, vi que não pareciam apenas mortos, pareciam como... Objetos, coisas que nunca sequer possuíram vida. A energia vital daqueles seres foram arrancados deles à força sem piedade, nunca serviriam a nenhum ciclo da natureza e nenhum microorganismo ou animal ousaria se alimentar daquela carne.

Os olhos sem vida e sem cor de um pombo olhavam diretamente para mim, o pássaro estava quase completamente despenado e sua pele por baixo estava pálida, quase em tom de papel, seu corpo parecia coberto de machucados profundos, mas de nenhum deles saia sangue.

De seus olhos despejavam um líquido preto e vicoso, lembrava levemente vômito, um vômito gosmento com macarrão, feijão e verduras amassadas apodrecidas desde a época que duas bombas nucleares atingiram o Japão.

Senti um enjôo insuportável, o que me levou a vomitar de cima do prédio, quase caindo com a tontura. Procurei não olhar para baixo enquanto fazia, não possuir medo de altura não quer dizer que cair de lá seria muito bom para a saúde.

Além do prédio podia ver flores mortas, nas casas de pessoas e em arbustos, tantas rosas, girassóis, margaridas e boa-noites, sem cor.

Sem cor.

A Essência da Morte: O Olho VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora