A Ilha

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Os solavancos do navio estavam deixando John enjoado. Também pudera. Em sua primeira viagem, isso era o natural de se acontecer. Por mais que amasse o mar desde criança, observá-lo da beira da praia era completamente diferente de viver nele.

Quando olhava para longe, John não via nada além do horizonte. Era até poético. Não importa para onde olhasse, não enxergava nada além do vazio. "Talvez assim seja a vida", pensou. "Talvez o vazio seja a única coisa que exista".

John pegou seu pequeno livro de pirataria. Observou-o bem e sorriu. Era esse tipo de bobagem que o tinha levado àquela grande aventura. No auge de sua inocência, ele não poderia imaginar como a vida nos mares era diferente do que se dizia lá na terra.

Com um pouco de tristeza, John pensava em todos que deixou para trás. Tudo isso para ir em busca de um sonho. Um sonho que não fazia sentido nenhum. Mas ele esperava que, de algum modo, pudesse fazer aquela viagem valer a pena.

– Todos para o convés! – exclamou o capitão – Está na hora de dormir.

Ah, sim. O toque de recolher. Ele já tinha que ir dormir. No alto-mar, não havia a menor necessidade de dormir tarde. Alguns marinheiros gostavam de observar as estrelas, mas John não era um desses. Para ele, o céu noturno não continha nada além do vazio. Olhar para ele era como observar o nada. E o nada pouco importa.

John suspirou, fechou os olhos e rapidamente caiu no sono. Antes de adormecer, pensou em sua antiga vida. Agora tudo parecia tão distante. Embora tivesse ido embora há apenas um mês, mal conseguia enxergar quem ele era antes daquilo tudo. As lembranças do passado se assemelhavam a uma névoa esfumaçada; mais ou menos como uma nuvem que vai desaparecendo aos poucos à medida que o barco zarpa.

***

John acordou com o sol nascendo. O capitão gritou para que ele começasse a trabalhar. Sim, ele estava exausto. Mas logo pegou a vassoura e passou a limpar o chão do navio.

Enquanto tirava a poeira do chão, o marujo se pôs a perguntar em que parte do mar eles estavam. "Provavelmente em algum lugar do pacífico", ele pensou. Mas não tinha certeza. E não importava. Desde que pudesse voltar para casa, não fazia diferença.

Depois de fazer seu trabalho, John se pôs a refletir sobre o que deixara na terra. Pensou em seu querido filho, em sua mulher e no seu antigo emprego como vendedor de frutas. Talvez tudo isso ainda lhe fizesse falta. Talvez não.

John encostou no mastro e parou para descansar. Mas mal fechou os olhos e se deparou com uma algazarra no navio. Todos os outros marujos estavam em pé e olhavam para o horizonte. O que estavam fazendo?

O capitão chamou todos a bordo e disse em alto e bom tom:

– Terra à vista!

John não podia acreditar no que ouvia. O capitão tinha dito que só voltariam para a terra firme no final do ano. Será que tinham adiantado a chegada?

Foi aí que se deu conta. Não haviam chegado ao continente. Haviam encontrado uma ilha no meio do oceano. Parariam por lá para conseguir suprimentos.

Por mais estranha que fosse a situação, John ouviu seu colega de bordo Smith comentar com ele:

– Cara, estou olhando os mapas, e essa ilha não consta por aqui.

– Deve haver um algum engano – disse John – Talvez o mapa esteja desatualizado.

Mas a conversa dos dois foi interrompida pela voz do capitão. Com uma voz beirando o desespero, pediu, aos berros, para que todos prendessem a âncora no chão e se preparassem para nadar até a costa, pois ele havia esquecido os botes salva vidas.

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