o Reino do Inverno Eterno

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Ethan acordou ainda de madrugada, como fazia todos os dias. Sem querer despertar a mãe e os irmãos, que ainda dormiam, o garoto foi andando devagarinho pelo chão de madeira. Precisava ordenhar a vaca para o café da manhã.

Vestiu-se rapidamente e se preparou para afundar os pés na gélida neve que teimava em cair. Naquele dia, particularmente, havia nevado mais do que o normal. Embora não fizesse ideia da temperatura lá fora, Ethan tinha certeza de que nunca sentira um frio tão horrível como aquele.

Abriu a porta deixando um rangido bastante estranho passar e, logo, sentiu um vento gélido cortando-lhe a espinha. Xingando, saiu para o quintal ao encontro da vaca que poderia lhe trazer um pouco de leite.

Assim que chegou ao curral, o animal, feliz por ver o dono, mugiu em sinal de aprovação, enquanto Ethan gentilmente tirava leite de suas tetas.

Terminada a tarefa, o garoto deu um tapinha no pescoço da vaca e a chamou para dentro de casa, considerando como estava frio. Entraram na casinha apertada onde viviam, enquanto Ethan procurava aquecer o seu corpo, que tremia de alto a baixo.

Assim que chegou, pôde ver sua mãe acordando, sonolenta. Disse:

– Trouxe o leite, mãe.

Ela agradeceu e, logo, pegou o balde no braço do filho. Tomou um longo gole, deixando o suficiente para o resto da família. Acostumada com a vida no campo, não abria mão do leite ainda quente do úbere da vaca.

– Quando isso tudo vai acabar, filho? Eu não aguento mais.

– Não sei, mãe.

– Precisamos ver o que fazer. Não podemos mais viver assim para sempre.

Ethan abraçou a mãe e lhe disse que tudo ficaria bem. Aquilo haveria de passar, embora ele não soubesse quando.

– Você acredita que estão chamando Murgi de o Reino do Inverno Eterno? – comentou a mãe.

– Não é eterno. Eu me lembro que, quando eu era criança, ainda não havia neve. Isso tudo começou quando eu tinha uns 10 anos. Já tenho 22.

– De qualquer forma, nossa fama não é boa, filho. Do outro lado da montanha, o inverno dura apenas três meses durante o ano.

– Eu vou cuidar do pão, mãe – desconversou.

Ethan sorriu. Reino do Inverno Eterno. Essa é boa. Não havia algum apelido melhor para descrever Murgi?

O garoto sabia que a mãe reclamava o tempo todo. Estava sempre de mau humor e de cara fechada. Mesmo assim, ele a amava como nunca amou a ninguém.

Ela não suportava o frio. Ethan, por outro lado, embora também odiasse a neve, se esforçava para viver sua vida da melhor forma que podia. Se não havia nada o que fazer, para que reclamar?

O motivo exato para esse frio intenso ninguém sabia. Supunham ser alguma maldição, mas ninguém tinha certeza. Possivelmente fosse também um simples azar do destino, um acaso maldito da vida. A questão, na verdade, é que não havia nada a se fazer a não ser conviver com as nevascas que assolavam o vilarejo de Murgi.

Em seguida, o garoto foi assar o pão no fogão a lenha. Foi para a cozinha trabalhar, enquanto observava a mãe costurando em sua máquina de fiar.

Costurar era sua paixão. Ela aprendera essa arte ainda na infância e, antes mesmo de ir à escola, já fazia cachecóis e camisas como ninguém. Porém, desde que todo aquele pesadelo começara, fiar não se tornara apenas uma diversão, e sim uma necessidade básica do dia a dia.

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