Assim que ficou sozinha no quarto, Rafaella aguardou alguns minutos até a paciente acordar. Com ela consciente, fez as perguntas de praxe, atualizando o prontuário com as informações pendentes. Gabriela tinha sido diagnosticada com epilepsia e seguia o tratamento à risca. Tinha apenas 20 anos e suas convulsões eram mais frequentes do que os médicos entendiam como normal.Com o histórico da sua paciente atualizado, sentou na cadeira de plástico que tinha no quarto e estudou o caso. A moça não tinha relatado problemas cardíacos, seus exames laboratoriais estavam dentro do esperado, assim como os exames de imagem. Era sua primeira paciente, precisava dar o seu melhor ali, mas estava cada vez mais intrigada com a parada cardíaca que ela teve durante o episódio convulsivo. Não fazia sentido.
Sua concentração foi quebrada com o barulho agudo do monitor cardíaco, indicando que o coração de Gabriela estava parando. Apenas alguns segundos depois, os olhos da moça reviraram e ela começou a ter outra convulsão. Agindo rápido, pegou o carrinho e apertou o botão para chamar a equipe de enfermagem. No entanto, não tinha tempo para esperar alguém chegar, carregou o desfibrilador e aplicou o choque na paciente.
Estava tão focada no que precisava fazer, que não notou que havia uma pessoa parada na porta. Virou o rosto, pensando que era alguém da equipe de enfermagem, mas não era. Uma médica, com cabelos pretos e longos, a observava. Sustentou o olhar por alguns segundos antes de cair em si e guardar as pás do desfibrilador. A convulsão passou e a jovem já recobrava a consciência.
- Posso ajudá-la? - Rafaella perguntou. Ali era sua paciente, seu caso. Estava no comando e não admitiria que alguém atrapalhasse o processo do diagnóstico. - Oi...? Posso ajudá-la? - A mineira repetiu enquanto encarava Gabriela, que respirava e inspirava com um pouco de ofegância. - Você se perdeu ou...
- O que você fez?! - dessa vez a mulher de cabelos longos caminhou, com pressa, até Gabriela, instalando seus olhos no monitor onde os sinais vitais eram representados. Estavam estáveis e a menina estava bem, Rafaella não entendeu o motivo da reprovação estampada no rosto da mulher que havia acabado de aparecer ali. - Você desfibrilou essa paciente duas vezes seguidas num intervalo de menos de trinta minutos. Você acha que isso é necessário? Você poderia... - a carioca morde o lábio inferior. - Você poderia ter encontrado outra forma. - disse e logo em seguida esboça um sorriso pequeno e carinhoso para Gabriela, que retribuiu o gesto e suspirou, fechando os olhos mais uma vez. Ela parecia estar extremamente cansada.
- Quem é você? - Rafaella franze o cenho para encarar a mulher, que balança a cabeça negativamente ao encarar o monitor preto. - Você aparece aqui, cisma em dar sua opinião, que eu nem quero saber, sobre a minha paciente e não quer se identificar? Você é alguma residente que acabou se perdendo?
- Assim como você, Dra. Rafaella... - a morena encara o bolso do jaleco com o nome daquela mulher. - Eu sou uma residente com competências incríveis, tão incríveis que a Dra. Thelma pediu para que eu subisse e te desse uma ajuda, mas pelo o que eu vi... Você vai precisar mais do que isso. - Bianca esboça um sorriso sem sinceridade ao encarar Rafaella. Ok, a paciente estava bem e consciente, mas o desfibrilador não deveria ser usado dessa forma. Ela poderia ter matado a Gabriela nessa fração de segundos. - Bianca, residente de cirurgia cardiovascular, Dra. Natalie Pimentel é a minha preceptora. - a carioca estendeu uma das mãos para a mulher que, se não fosse Gabriela ali e se os princípios da cordialidade não fossem tão importantes, não teria apertado a mão de Bianca.
Rafaella suspirou e se esforçou para não revirar os olhos. Ambiente de trabalho. Ambiente de trabalho. Ambiente de trabalho. Mentalizou várias vezes o mantra que sempre repetiu em todas as situações profissionais de sua vida. A mineira esperava receber algum desafeto de seu ambiente de residência, mas não pensou que já seria logo no primeiro dia.
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Awake
FanfictionOs caminhos que escolhemos viver nos constroem e nos destroem. Nem sempre na mesma proporção, é verdade, mas os fardos sempre estão lá, assim como as conquistas. Cedo ou tarde, todo mundo é forçado a assumir o controle da própria vida, trilhar sua p...