Awake

Perdendo o controle

A última semana no pronto-socorro estava sendo mais tranquila do que poderiam imaginar. O fluxo diário estava sempre dentro do esperado, então tinham bastante tempo para estudar e dar atenção aos pacientes dentro das próprias especializações.

Bianca estava tentando se manter focada em seus outros pacientes, mas um deles ocupava todo o espaço em sua mente e em seu coração. Pedro, o garotinho que esperava por um transplante de coração havia piorado e isso estava acabando com o dia da carioca, que já não estava muito bom. Ela alternava a atenção e o carinho entre seus pacientes, mas sempre mantinha seus pensamentos no garoto, calculando os minutos para conseguir ir vê-lo.

- Ei, carinha? - Bianca sussurrou enquanto se aproximava dele. Deixou o tablet na ponta da cama e se sentou ao lado dele, esticando as mãos para tocar seu braço. - Como você tá? Melhor?

- Não sei, dra. Bia. - se esforçou para dar de ombros e sorriu quando sentiu o calor vindo do carinho de Bianca. - Você tá bem?

Pedro, apesar de aparentar ser uma criança totalmente saudável, sofria de uma doença cardíaca grave num estágio avançado. Hora melhorava, hora piorava, mas toda a equipe médica havia garantido que ele seria resistente o suficiente para aguardar até o transplante. A vez dele iria chegar e Bianca tinha certeza que não estava muito longe, ele só precisava esperar mais um pouquinho.

- Eu tô bem. - esboçou um sorriso largo e se aproximou mais dele. Sabia do que havia socorrido antes de ela chegar ali e sabia também que ele havia passado por tudo sozinho. A mãe dele estava a caminho do hospital, mas não podia, infelizmente, estar sempre ao lado do filho. - Você foi muito corajoso hoje. Muito mesmo. Todo mundo tá falando que você foi forte, não ficou com medo...

- Minha mãe disse que eu não preciso ficar preocupado. Vai passar. - ele afirmou enquanto erguia o indicador, tentando imitar o tom de voz da mulher. - Então eu nunca fico triste e preocupado.

- Viu?! Como você é corajoso?! - arrastou os cabelos dele pra trás. - Vai me ensinar a ser assim, ok? Eu preciso de muita coragem, também. Vou roubar um pouquinho da sua.

- Você se divertiu lá? Naquele dia?

- Sim, bastante. Foi muito bom, eu comi a melhor torta de limão da minha vida. - deixou uma risada escapar enquanto observava as feições saudosas do menino. - Você vai ficar bom, ok? E isso é uma promessa, quando você melhorar, eu vou pedir pra sua mãe me emprestar você por um dia e vou te levar pra comer essa torta de limão.

- Não gosto de torta de limão. - ele fez careta e colocou a língua pra fora. - Pode ser um bolo de chocolate? Eu abro o meu porquinho pra ajudar a comprar!

- Não, senhor! Vai ser um presente pra você, nossa comemoração. - Bianca afirmou e apertou a mão do menino mais uma vez.

Ele era uma cópia fiel de sua irmã quando era mais nova, tinha a mesma aura envolvente, carismática e angelical. Era um pontinho de paz que Bianca mal via a hora de ver correndo pra fora daquele hospital.

- Então eu vou querer um bolo com muito chocolate e um copo bem grande de refrigerante. E vou querer bala também! - ele listou e logo em seguida sorriu, encarando Bianca. - Eu vou querer tudo!

Os dois ficaram ali por alguns minutos, conversando e imersos no próprio mundinho que haviam construído. Apesar de estar num ambiente estritamente profissional e impessoal, Bianca ainda permitia deixar que seu coração se entregasse demais. Aquele era um dos casos, eles eram um ponto de alívio, um para o outro.

- Eu já volto aqui, tá? Tenho que ir olhar mais alguns pacientes e conferir algumas coisinhas, mas eu já volto. - tocou a ponta do nariz dele com o indicador. - Tenta descansar, ok? Daqui a pouco sua mãe chega e vocês vão poder matar as saudades.