A chuva cai forte nas montanhas. As gotas, de início, tímidas, passam a ganhar forma ao unir-se a outras, formando verdadeiras enxurradas que descem pelas encostas criando quedas d'água únicas naquele ambiente inóspito.
Em meio à cordilheira, protegido em uma pequena e escura caverna está Cynemaer. Suas únicas companhias são a fogueira, cujas chamas lutam bravamente contra o vento incessante que adentra a gruta, e seu machado, cujo metal, tantas vezes polido por sangue inimigo, reflete o brilho da lua.
O bárbaro contempla o horizonte, imaginando quais serão seus próximos passos. Não que ele tenha um plano, isso não faz o seu tipo. Ele é um animal. É movido por seus instintos. Está aonde precisa estar.
Lá embaixo ele enxerga a cidade, com suas luzes tênues, e fica pensando nas pessoas que lá habitam. Ergue um pouco a vista e enxerga o castelo real, onde reside o rei local. O mesmo rei que dizimou seu povo. Talvez não o mesmo. Mas ele porta a coroa e a coroa é o símbolo máximo daquele poder sujo e mortal que ceifara tantas vidas inocentes durante tanto tempo.
Cynemaer, no entanto, não deseja o poder. Pode viver a base de carne de javali e hidromel. Isso é o bastante para ele. O que ele de fato deseja é exterminar esse poder mortal. Ele odeia a ideia de um reinado. Odeia a figura do rei por si própria. Ele acredita que essa corja deva ser exterminada, para sempre. Só assim poderá viver com paz e tranquilidade.
Um bárbaro vive muitos anos, ele sabe. Não tanto quanto elfos, mas pelo menos o dobro do tempo dos homens. E ele tem sangue anão. Isso ainda deve lhe render algumas décadas a mais.
Cynemaer fita a chuva. Ele encara cada gota, observando seu reflexo, enquanto elas tocam o chão e se desmancham em pequeninas poças quase imperceptíveis. Por si só, cada gota é inofensiva. Mas muitas gotas trazem tempestade. E somada a raios e ventanias, uma tempestade pode ser perigosa. Então ele volta a pensar nas pessoas da cidade. Aquelas criaturas frágeis, que parecem ser de vidro. Talvez juntas elas possam ser de algum auxílio. Elas não gostam do rei também, ele sabe. Mas o temem. E o temor impede que ajam. Ele pensa no que eles temem mais: o rei ou a possibilidade da ausência de um.
Apesar de parecer estúpido, Cynemaer é sábio. Ele sabe que os ignorantes temem a possibilidade da não presença de um líder. Por mais que vivam as suas vidas, sendo ignorados em sua maior parte, eles precisam de alguém para olhar e dizer: eis aquele que ordena! Não concebem a possibilidade de viverem por si só. De produzirem a própria comida, de construírem suas próprias casas, sem terem que pagar impostos. Para Cynemaer, todo líder é inútil, é desnecessário. Cada ser deve saber viver por si só e para si só. Deve estar pronto para lutar por sua família e por seu gado e pela sua comida e pela sua terra. Um mundo sem líderes é um mundo livre. Um mundo melhor.
O bárbaro se levanta. A chuva parece começar a enfraquecer. Ele toma seu machado e apaga a fogueira pisando nela. Ele queima seus pés, mas a dor não o incomoda. Como dizia uma velha canção que sua mãe costumava lhe cantar, a dor se fez sua amiga e dói devagar.
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Guerras de Mármore
FantasyApós um abusivo aumento de impostos para alimentar seus exércitos, uma crise se instaura em Holteard. Na capital do reino, Holteburg, um grupo de cidadãos se reúne em busca de uma solução. Ao mesmo tempo, um bárbaro ronda pelas proximidade com seus...