☽ Prólogo ☾

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PRÓLOGO

Se alguém tivesse me dito que em alguns dias eu teria atravessado um espelho velho e manchado, caído em outra realidade e que seria presa como a suspeita de ter assassinado o Rei, eu teria rido. 

Rido muito. Gargalharia ruidosamente até ficar rouca e me dobrar sobre a barriga, sentindo meus olhos marejarem pelas palavras engraçadas.

E provavelmente eu pensaria que a pessoa que me disse isso estaria louca. Completamente ensandecida. Perdida de sua sanidade mental.

Mas isso não era brincadeira. Definitivamente não era brincadeira ou meus olhos querendo me pregar uma peça. E, certamente, não era o efeito de alguma substância ilícita humana que eu geralmente usava nos meus dias em que eu estava em casa. Na Terra. No planeta Terra, que ficava em outra galáxia.

Não. Nada disso era brincadeira. Porque eu estava sendo levada das Masmorras até a praça da cidade. Meus braços presos ao redor de algemas grossas de prata e diamantes, impossíveis de serem quebradas. Olho para os grilhões nos meus pulsos e abro um mínimo sorriso. Bom, pelo menos eu morreria com estilo, usando algemas de diamantes. Era chique, ao menos.

Os guardas me empurram com força, um golpe que por pouco não desloca meu ombro. Ainda estou usando o vestido do Baile Vermelho. O vestido que Bryce e Danika escolheram em especial para mim: o branco cheio de pérolas marinhas e rendas sutis na saia bufante, com o espartilho se abrindo em um decote provocativo até o meio dos seios. Elas disseram-me que Ruhn não tiraria os olhos de mim nesse vestido, e que eu chamaria a atenção.

E isso era um fato, já que o Baile Vermelho não era apenas um nome. Todos os convidados estavam usando vermelho, e as amigas me vestiram de branco porque me destacaria dos outros, elas disseram enquanto riam e prendiam meus cabelos para cima. Eu seria única. Um cisne no meio de uma multidão vermelha sangrenta. Eu seria a única aos olhos de Ruhn, e em seu coração também.

Naquele momento eu sorri, com o peito cheio de uma avassaladora paixão que me queimava lentamente. Que esquentava meu coração e meu rosto com o simples olhar que ele me lançava. Eu estava certa de que ele me escolheria naquela noite. De que ele anunciaria para todos de que, enfim, havia encontrado sua noiva. E eu já estava de branco! Bastasse que algum sacerdote fizesse nossos votos.

Ele estava pronto, eu vi nos olhos dele assim que ele se levantou e ergueu a taça, a fim de fazer uma declaração no jantar real, eu vi em seus olhos que ele estava pronto para aquilo. Para anunciar para todo o país que seríamos um casal.

Eu também estava pronta.

Mas isso foi antes do Conselheiro invadir as portas do salão com a guarda real atrás de si, gritando e apontando para mim que eu havia assassinado o rei.

Sei que na confusão que se estendeu, Ruhn apenas ficou parado, do outro lado da mesa me encarando estoicamente e com a taça ainda erguida. Ele não podia acreditar, eu vi em seu rosto que ele não queria acreditar. Mas depois trouxeram a adaga de lâmina preta que minha mãe me deu, com minhas iniciais gravadas na extensão da lâmina escura de ônix. Era minha adaga. O cabo em ouro escuro se torcia no formato da cabeça de uma cobra com a boca aberta, presas para fora.

E, além disso, minha faca estava banhada de sangue azul. O sangue do rei. Estava escuro e seco, e com terra grudada no sangue azulado. O Conselheiro dispara ordens: para que me prendessem, e começa a gritar que eu tentei matar o rei através das passagens secretas que o príncipe havia me ensinado. Me mostrado em meio aos nossos passeios de amantes. O Conselheiro ruge para todos os nobres da corte ouvirem que eu escondi a faca na terra embaixo da floresta das Almas, para esconder minha transgressão.

Eu continuei atônica, sem me mexer. Tudo que eu consegui fazer foi olhar para Ruhn. Para seus olhos azuis como os céus, me encarando em uma confusão e mágoa profunda. Ele ainda estava com a taça erguida, e os olhos brilhando em lágrimas presas.

Amaldiçoei minha boca naquele instante por ter jurado o rei de morte, por ele ter acabado com todas minhas ancestrais bruxas. Amaldiçoou o dia em que escolhi abrir a porta de casa para aquela velha e ter aceitado o maldito espelho. Amaldiçoou o dia em que eu tenha conhecido Ruhn Danaan, o homem por quem eu estou perdidamente e loucamente apaixonada.

Mas, mesmo que eu ainda esteja apaixonada por ele, meu amor não vai me salvar do que virá. Do que está bem na minha frente.

Meu amor por ele não vai me salvar da pira. De me queimar viva por uma coisa que eu não fiz.

E por esse amor de outro mundo, de outra galáxia, irei morrer queimada. 

{AU CCity} O Outro LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora