VI. Aparências

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Quando cheguei ao porto a primeira coisa que me chamou atenção com certeza foi a quantidade de pessoas que tinha lá. Era completamente lotado. Haviam pessoas de todos os lugares e de todas as idades. Era uma enorme feira, cheia de barracas e bancadas com mercadorias que iam desde tabaco a pedras preciosas.

Atitudes suspeitas me chamaram atenção logo de início. Tinham homens com roupas parecidas espalhados por todo lado, mas não eram guardas. Alguns sorrateiros roubavam quem estava distraído sem serem notados. Amarrei o cavalo em um lugar qualquer e segui a pé, afinal o caminho era muito estreito para ir cavalgando. Arrumei meu capuz e segui porto adentro.

Um pequeno detalhe em uma das pilastras de madeira me chamou atenção, eram cartazes de procurados. Dentre as figuras peculiares de lá estavam a minha e de meu pai.

Mas por que estavam me procurando?

Sem entender me afasto de lá, sempre cobrindo o rosto para não ser reconhecida, mesmo achando difícil alguém ser reconhecido nesta multidão. Os homens mencionados anteriormente estavam sempre presentes por todos os lugares, como se fossem sentinelas.

Em geral eu não sabia exatamente o que estava procurando, mas tinha o pressentimento que em breve iria encontrar.

Perto das instalações tinham crianças por toda parte, elas brincavam rindo alto e sorrindo a todo instante. Haviam inúmeros ladrões também, principalmente piratas.

A cada passo que dava me sentia cada vez mais perdida, o lugar era imenso. Pensativa sobre onde procurar pistas, tive a brilhante ideia de ir a uma das tabernas procurar informações.

Entrei na primeira instalação que encontrei. Como em todos os outros lugares daqui, estava cheia de forasteiros. Dei uma boa olhada panorâmica no lugar, foi aí que vi um rosto conhecido. O homem de cavanhaque grisalho do baile, com quem vi papai conversando pelos cantos, ele assim que me notou ficou surpreso e tenso.

Entrei no lugar pelas sombras, tentando chamar o mínimo de atenção possível. Caminhei silenciosamente até a mesa onde ele estava. O encarei por um instante e me sentei na cadeira a sua frente.

-  Vejam só se não é a princesa do Valle da Prata. O que te traz a um lugar como esse? - ele indagou ainda surpreso.

- Gostaria de dizer algo sobre o senhor, mas infelizmente não fomos apresentados corretamente naquela noite, não?

Fiz uma pequena pausa para observar sua mudança de expressão ao me ver mencionar a noite do baile.

- Houve grandes acontecimentos nessas últimas semanas e estou buscando respostas. O meu pai...

Hesitei por um instante em falar da situação atual de Estevan, será que posso confiar no homem a minha frente?

- O meu pai a um tempo mencionou sobre o porto enquanto nós... Bem... Estávamos em um possível perigo.

- E onde está Estevan ?

Perguntou o senhor ao levantar uma das sobrancelhas.

- Digamos que está...num lugar desconhecido no momento...

- Entendo... Bem, para quais perguntas está procurando resposta ?

- A algumas semanas atrás, meu pai estava meio distante e preocupado, não me disse absolutamente nada sobre um motivo, e a uns dias nós tivemos que fugir do Valle, fomos perseguidos por guardas reais enquanto estávamos indo ao porto, e estou tentando entender o porquê.

Pausei por um instante para retomar o fôlego e o raciocínio.

- O senhor conversava de um jeito suspeito com sir Estevan na noite do baile, pouco tempo antes de tudo acontecer, sabe de alguma coisa?

Ele me fita por um instante, procurando seguir meu raciocínio enquanto tentava achar uma forma de me responder. Era bem claro que aquele homem estava escondendo algo.

- Bem... Creio que não poderei lhe ajudar.

- Não pode ou não quer?

- Vejo grande parte do temperamento de Estevan em você. Não posso lhe ajudar senhorita. - Ele junta as sobrancelhas e continua - Mas afinal, o que realmente aconteceu com seu pai?

- Ele foi... Bem ele... Foi baleado pelos guardas no caminho para cá, não resistiu e acabou...

O homem fica incrédulo por um instante, seus olhos exalavam surpresa e medo.

- Por Deus... Não acredito.

Ele então passa a mão no cavanhaque enquanto mudava a direção dos olhos várias vezes, aparentemente recompondo os pensamentos. E então ele volta a me olhar nos olhos.

- Isso é horrível, realmente sinto muito Jade, deve ter sido horrível vê-lo assim.

Fecho os olhos por um segundo, afastando as lembranças doídas daquele dia. Me recomponho e volto a falar:

- Gostaria de saber o porquê de tudo isso ter acontecido, o que ele fez de errado? Ele não era nenhum criminoso. - Sem haver mudança alguma na expressão do homem apelei para chantagem emocional - O senhor é a única pista que eu tenho, sua expressão me diz que sabes o que houve, por favor me diga...

- Jade, saber sobre essa parte da vida de seu pai pode não ter volta, esse caminho pode ser perigoso... Estevan não era exatamente quem você pensa que ele era, você acha que consegue lidar com isso?

Confesso que fiquei perplexa com a fala do senhor em questão. Afinal, o que havia de tão obscuro em Estevan?

- Me sinto mais em perigo por não saber o que realmente aconteceu...ou ainda está acontecendo... A propósito, qual seria o seu nome?

O homem se ajeita na cadeira antes de me responder, provavelmente pensando se me responde.

- Meu nome é Antônio Brianchi.

O nome me causa espanto, soa familiar. Logo me lembrei de cartas para Estevan assinadas com as siglas A. B. que chegavam com frequência. E diferente das outras correspondências, nunca podiam ser abertas, apenas papai podia abri-las.

Antônio Brianchi.

Me lembrei ainda de conversas suspeitas que escutei envolvendo o nome pelo Valle, não que eu seja alguma xereta, os corredores fazem muito eco e são muito próximos.

Dezenas de lembranças me veem a cabeça, mas tudo é interrompido quando vejo guardas reais entrando na taberna. Sai calmamente pelos fundos, mas logo fui perseguida por um homem fardado que se aproximava.

- Ei, parada aí...

O ignorando entrei em uma loja qualquer que estava cheia, e então sai pelos fundos. Corri logo em seguida, o mais rápido que conseguia. Infelizmente chamei atenção de alguns guardas que passavam, que se juntaram a perseguição.

Entre gritos e sons de botas batendo no chão encontrei um beco, e tentando despista-los, entrei nele. O que foi uma péssima ideia, já que era sem saída.

- Ei moça... Por aqui!

Procurei a voz que me chamava. Encontrei então uma criança, de pele bronzeada e cabelo cacheado, era um menino. Em alguns segundos decifrei suas intenções, ele me pedia para o seguir por uma porta adentro. Sem opções,  aceitei. Era minha única saída naquele momento.

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