Assustada

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Eu posso ver cada partícula flutuando no ar, como uma chuva de pequenos ciscos caindo por todo o mundo, uma coisa secreta e tão simples que inspirava de uma forma que podia fazer qualquer pessoa enxergar o mundo com outros olhos.

Tudo parecia em câmera lenta agora, meu mundo tinha congelado em uma sequencia para sempre.

Era torturante, doloroso e melancólico. Eu poderia muito bem estar submersa no mar, presa em uma bolha do desconhecido.

E não conseguia, em absoluto, nem quando me esforçava com todas as minhas energias, esquecer do momento em que tudo mudou, o momento em que meu mundo nunca mais seria apenas meu.

Era como um sonho vivido, cada lembrança carregada de um sentimento forte que impregnava minhas células com sensações fantasmas.

Terra molhada

Seus olhos, escuros e doces refletiam os meus próprios, carregando a dor da perda como um membro durante anos a fio, uma criança tomada de sua infância, o peso da força e responsabilidade crescendo junto ao animal que se apossava de nossas almas.

Chuva

Seu rosto risonho em cada fase de sua vida, apagando toda a dor e medo que vinha com os obstáculos, misturado ao meu sempre estoico enquanto os anos escapavam por meus dedos assim como a liberdade que era trancada comigo atrás das barras.

Fogo

Seu coração carregado de guerra e esperança enquanto seus inimigos vinham, o meu batendo em conjunto ao seu, gritando em coragem e desespero para fugir daqueles que roubaram minha vida e o amor que um dia conhecerá.

Vento

A sua alma em paz apenas á espera do que sempre lhe foi destinado, sua ânsia cantando uma canção que apenas alguém torturado e faminto poderia escutar em meio à corrida desesperada por esperança, pelo finalmente, por ter o sabor da própria liberdade.

Cada sentimento, cada sensação, cada olhar, cada descoberta, cada respiração, cada momento da minha vida de repente tinha se entrelaçado ao de outra pessoa, como se estivéssemos interligados desde o nosso nascimento, uma corrente adormecida apenas esperando o momento certo para ser acordada.

Toda aquela solidão, todo aquele sentimento de sempre estar sozinha, de ter um pedaço faltando... se fora.

Nada tinha sito mais assustador, do que ver um completo estranho se tornar o centro da minha existência.

Não fazia sentido, não podia ser possível.

Quando ele olhou em meus olhos, a sensação foi de desabamento, eu comecei a cair, meu corpo falhando e me deixando no chão, mas não era meu corpo, não, era algo mais profundo, incorpóreo, vital, algo vibrando no amago do meu ser.

Minha alma.

Não faz sentido...

Até agora, enquanto estou sentada na cama, meus braços se enrolando ao redor dos meus joelhos, mesmo agora, eu podia sentir essa sensação de flutuação debaixo dos pés, como se a gravidade não estivesse me segurando mais. Meu corpo estava contrariando meus comandos mentais.

Eu não respondo quando a batida na porta soa, meus olhos perdidos em pensamentos profundos e conflituosos, a semântica dos acontecimentos não fazendo sentido, não quando eu não tinha qualquer outra coisa para comparar com o que estava acontecendo com meu organismo, com minha cabeça e pior ainda... com meu coração.

- Você não pode se esconder no quarto para sempre, uma hora vai ter que sair e contar o que está acontecendo.

A voz de Bella flutuou pelo quarto e me enlaçou em seu tom divertido, não virei meu rosto quando respondi.

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