Capítulo XIV

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 Tudo aconteceu muito rápido. Minha avó mandando Benedita ir fazer um chá imediatamente, pediu para que eu a ajudasse a colocar Sebastião na cama e ela segurou na mão dele, mexendo freneticamente os lábios com os olhos fechados. Ela orou.

 Benedita chega preocupada com o chá e coloca na mesinha ao lado. Meu avô ainda tremia, saindo uma espécie de baba da boca e a minha amiga pegou um pano para eu limpar.

—O que está acontecendo, vó? – Falo mais nervosa e chorosa do que havia imaginado.

 Ela me olha triste, lamentando saber tão pouco quanto eu. Não quero que meu avô morra.

—É melhor chamar seu tio e levar Sebastião a um médico. – Madalena diz, agitada.

 Eu olho para meu avô, para ela e para meu avô, sem saber como agir ou pensar.

—Vá, Celine. – Ela esbraveja.

 Corro para a porta e minha mão se esquece de como a destranca, solto um som impaciente e consigo passar para a varanda e rapidamente chego à casa ao lado – já que agora havia um colchete entre os dois terrenos. Bato na porta, grito o nome de Gaspar e bato de novo.

—Celine, o que está acontecendo? – Ele aparece de robe azul esverdeado e coçando os olhos. Pude enxergar quase imperceptivelmente os pelos do seu abdômen.

 Seguro em sua mão e o puxo em direção à minha casa.

—Pode me dizer o que está acontecendo? – Ele diz e eu tento puxá-lo, mesmo com dificuldade pelo peso do corpo robusto.

—Meu avô... ele... – Não consigo falar.

 A mão de Gaspar aperta a minha e eu sinto meus músculos relaxarem. Chegamos ao quarto dos meus avós e Gaspar correu até Sebastião, que ainda treme, mas com frequência reduzida.

—É uma convulsão, teremos que esperar ele parar de tremer. – Meu tio diz ansioso. – Eu vou virá-lo de lado para que ele não engasgue com a própria língua.

 E esperamos, não demorou mais de uma hora até a tremedeira parar e aos poucos, Seu Sebastião voltar à lucidez. Tomou chá e disse que não precisava mais de nossa ajuda, mesmo ainda meio atordoado. Parece envergonhado com a situação.

 Ele consegue ser bem grosso quando quer.

 Todos acabamos indo dormir, antes eu e Benedita trocamos olhares preocupados e eu levei Gaspar até a porta, fechando-a e respirando fundo.

 O dia poderia ficar ainda pior? Acho que não, pois se aproxima da meia noite.

 Deito na cama e me espalho sobre ela, a fim de alongar todos os meus músculos. Olho para o teto e percebo que minha respiração ainda esta acelerada, o que não é tão difícil, já que eu acabei de testemunhar uma das piores cenas da minha vida.

 Escuto um som abafado, mas ignoro por não saber de onde vem. De novo o som preenche meus ouvidos e eu sento na cama e olho para a janela. Uma pedra colide a madeira e eu levanto para ver quem estava querendo chamar a minha atenção.

 Uma pessoa alta e corpulenta está parada com uma mão perto da barriga, provavelmente com mais pedrinhas para caso eu não escutasse as outras.

 Subo na janela e desço rapidamente, caindo levemente nos braços fortes do homem, sentindo sua barriga debaixo do robe e sua barba na minha bochecha. Afasto-me e arrumo minha roupa de dormir.

—O que faz aqui? – Sussurro, cobrindo meus braços.

—Precisava te ver. – Ele diz se aproximando de mim e me puxando para mais perto pela cintura.

—Gaspar – Digo, quase soltando um gemido. –, aqui não.

 Eu contenho minha vontade de beijá-lo e o guio, silenciosamente, até o celeiro. Ele me aperta contra a parede e sua boca chega perto da minha, com a respiração tão quente que me cobre como se fosse um cobertor.

 Gaspar beija meu pescoço e a mão percorre pela minha nuca e puxa piedosamente o meu cabelo. Levanto a sua cabeça e ele olha penetrantemente os meus olhos, mas logo depois me beija como se estivesse esperando por aquilo o dia todo.

 O gosto dele é maravilhoso e a sensação máscula e forte que sinto do seu corpo é revigorante, sinto-me até molhada.

 Sinto a excitação dele se formar debaixo do robe e sorrio entre o beijo, me sentindo atraente o suficiente para causar essa reação em um homem. É claro que eu sou capaz de fazer isso com qualquer homem, até mesmo o velho do Justino.

 Justino. Eca.

 Interrompo o beijo e abaixo a cabeça.

—O que foi? Fiz algo de errado?

 O homem diz e a única coisa que consigo fazer é afastá-lo de mim e abraçar meus braços.

—Isso – Aponto de mim para ele. – já é errado. Você é casado.

—Não achei que se importasse.

—Pois me importo. Qual a dignidade que eu tenho, defendendo as mulheres contra os homens nojentos, se sou uma amante?

 Ele fica sem reação, mas depois de alguns segundos endireita o corpo e faz uma expressão dura.

—Eu posso não ser Santa, mas cansei de ser feita de brinquedo pelos homens. – Continuo.

—Tiveram outros antes de mim? – Gaspar se aproxima. – Celine, você ainda é...?

—Faz alguma diferença para você? – Rebato a pergunta. – Não se faça de conservador insuportável.

—Celine, eu gosto de você, de verdade. – Ele diz, segurando minha mão. – Mas eu... eu...

—Você – Enfatizo antes de prosseguir. – Não vai deixar sua esposa para se aventurar comigo.

 Me viro de costas e respiro fundo, novamente ele fica sem reação.

 Como os homens são difíceis.

—De qualquer forma, Justino quer casar-se comigo. – Digo, esperando algum ataque de fúria de Gaspar.

 Viro-me novamente para ele e o vejo coçando a nuca, com os olhar longe.

—Você... sabia? – Coloco minha mão na boca.

A Dama FerozOnde histórias criam vida. Descubra agora