A Dama Feroz

Capítulo XV

—Você sabia que Justino quer casar comigo?

 Sem ter escutado a resposta, já me considero tola por achar que Gaspar sentiria alguma faísca de ciúmes.

—Posso ter escutado Madalena e Sebastião conversarem sobre algo...

 Eu arfo, mais sentindo raiva e decepção do que qualquer outra coisa.

—Como pôde? – Eu avanço nele e dou vários tapas no seu braço.

—Celine, se acalme. – Ele segura minhas mãos.

—Você nem se deu ao trabalho de me avisar que estou fadada a um casamento arranjado. – Tento não gritar.

—Cel, eu não te contei porque não tinha certeza, não achei que eles fossem capazes...

 Ele parece implorar por perdão, mas meus pensamentos já vagavam pelo que Dandara me falou: "Pare de ficar presa em seus achismos".

 É claro que eu jamais achava que meus avós fariam isso comigo, mas pelo visto eu não os conheço mais. Agora sou eu por eu. Não posso acreditar que eles estão me vendendo a um velho. E tudo por quê? Pelo dinheiro dele? Talvez possa quitar nossas dívidas.

—Celine? – Ouço Gaspar me chamar.

—Oi.

—O que vai fazer? – Ele coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha.

 Sinto-me arrepiada, quero perder-me em seus braços e se eu pudesse eu conceberia com ele exatamente agora. Mas tudo o que eu digo é:

—Nada.

🍂

 Meus avós acabaram de provar o quanto fazem caso de mim e de minha vida, então a única coisa que me resta a fazer é achar que eles estão vencendo. Terei que ter muita paciência para não cometer alguma desgraça.

 Todos ao meu redor já não são mais dignos de minha confiança, como se já houvessem sido antes. Sempre tive que esconder minhas astúcias de meus avós, mas era somente isso que eu escondia. Agora não direi mais muita coisa.

 Nem eles, nem a sonhadora da Laura, nem o certinho do Nicholas, nem o sedutor do Gaspar. Somente confiarei em Benedita, isso se eu não considerar irrelevante quando estiver com ela.

 A semana foi bastante agitada. Da segunda à quarta, Gaspar e seus homens trabalharam duro e conseguiram terminar o plantio de milho, eu ajudei um pouco, mas não suportei os olhares sedentos de Gaspar e nem o semblante provocante de Nicholas.

 Desde a abstinência do meu avô, ninguém comentou nada sobre esse ocorrido e Sebastião já voltara a beber – caso contrário, convulsionaria novamente, mas é claro que é só mais uma de suas desculpas para voltar embriagado.

 Na quarta, chegou até nós a notícia de que Justino havia sido roubado na madrugada. Vários sacos com conteúdo da colheita dele foram levados e o homem rabugento não deixaria por isso mesmo.

 Ele convocou seus amigos e saíram em busca dos bandidos. Até mesmo Gaspar, que não parecia nada afetuoso com Justino, foi ajudá-lo. Montou no cavalo e com um chapéu de cowboy, deixou a fazenda.

—Se cuide, meu filho! – Madalena leva uma mão ao coração e uma abana em direção ao veloz cavalo.

 Maria, esposa de Gaspar, não expressa desespero, tampouco ri. Ela realmente é muito quieta, não sei como Gaspar havia se casado com ela. Talvez, entre quatro paredes, ela revele o verdadeiro eu.

—Você não vai impedi-lo? Isso é uma loucura! – Pergunto a ela.

—Ele não me ouve e não devo desafiá-lo. – Ela sorri fraco e volta para dentro de casa.

 Credo. Tenho medo desse tipo de pensamento. Mas será que ela não o desafia por algum trauma ou já ter feito algo a ela? O que eles tanto escondem?

 Corro até o celeiro e pego o meu cavalo, Sansão, e me apresso em cavalgar na mesma direção de Gaspar.

 Não posso deixá-lo fazer isso. Ele não pode ajudar Justino a matar pessoas, não pode. Ele não é igual a Justino e não vai se tornar em alguém como ele. Gaspar é nobre e tem sentimentos mais humanos.

 Chego num campo aberto e avisto alguns homens montados a cavalos na colina. Cavalgo até eles e olho de Justino à Gaspar, ambos me encaram. O primeiro com superioridade e o segundo com vergonha do que está fazendo e com quem.

 Justino lança-me um olhar grosseiro e sorri de lado.