Capítulo IX

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  Olho rapidamente para Dandara e ela me fala uma última coisa.

—Cel, tem que pensar logicamente. Pare de ficar presa em seus achismos.

 Nesse momento Nicholas surge atrás de mim e franze a sobrancelha.

—Com quem estava conversando? – Ele pergunta.

 Desvio o olhar para onde eu vi Danda pela última vez, mas ela já havia desaparecido. Evaporou como fumaça.

—Comigo mesma. Algum problema? – Tento esconder meu espanto.

 Ele se desconcerta e segura no tronco de uma árvore, tentando parecer mais descontraído.

—Hum, não. De qualquer forma, vovó está lhe chamando. Chegou uma caixa para você.

—Uma caixa?

🔆

 Enquanto caminho de volta para casa, penso sobre o que Dandara me falou. Será que ela tem razão? Meus avós vão me vender para um velho? Que nojo!

 Não! Vovô não faria isso comigo.

 Chego à sala com Nicholas em meu encalço e vejo a família reunida. Madalena e Laura com a expressão alegre; Maria esboça um sorriso ensaiado; Sebastião estava com o olhar vazio, mas direcionado a mim; e Gaspar tem o semblante sério e carrancudo, com os braços cruzados e tensos.

 Ele e meu avô mantinham certa distância e motivados pelo que aconteceu essa manhã, era impossível que eles estivessem esquecido tão rápido de se evitarem.

—O que está acontecendo? – Pergunto.

—Isso chegou para você.

 Madalena aponta para uma caixa na mesinha de centro. Ela é bege com uma fita vermelha ao redor, amarrada com um laço. Todos esperavam ansiosamente para eu abri-la.

 Não entendi o motivo disso se tornar um espetáculo público.

 Constrangida, ajoelho-me e hesito ao abrir o presente. E se for uma pegadinha? Quem me enviou isso? Por que para mim?

 Abro o objeto quadrado e primeiro abro um cartão que estava por cima.

Cara Celine,

Espero que compareça na pequena confraternização

amanhã usando essa peça de roupa, tenho certeza

de que ficará mais deslumbrante do que já é.

Anseio por encontrar-te.

 No canto inferior direito da carta, havia o nome do remetente: Justino Barbosa.

 Todos olham para mim, principalmente Laura, que estava curiosa para saber quem havia me enviado o presente.

—Justino. – Aponto para a caixa para indicar que ele me mandou.

—Que homem educado. – Madalena juntou as mãos.

—Que sorte, Celine. – Laura tentou não parecer com inveja.

 Gaspar me olha ainda sério. Parece que ele quer destruir o conteúdo da caixa e matar Justino, mas não entendo o motivo desse comportamento. Sinto a mão de Nicholas no meu ombro, para que eu olhasse para a caixa e retirasse seja lá o que estiver dentro.

 Puxo um lindo vestido vermelho e levanto para estender e ele pender ao longo do meu corpo. É lindo. Novamente Justino mostrando seu bom gosto para luxos.

—Celine. – Madalena vibra. – Tem que usá-lo amanhã!

—É claro. Esse vestido é perfeito. – Laura diz.

 Justino pareceu desaprovar minhas vestes hoje pela manhã, estaria ele moldando minha forma de me vestir? E por que não me entregou o vestido quando me viu? E, caramba, ele praticamente me deixou sem escolha sobre ir ou não para a "confraternização".

 É claro que ele queria que eu recebesse quando todos estivessem em casa. Talvez para mostrar suas verdadeiras intenções.

—O que o senhor achou, vô? – Resolvo testa-lo.

—Tudo fica perfeito em você, Cel. – A voz manhosa e calma dele me faz duvidar seriamente das palavras de Dandara.

 Aliás, é o meu avô!

—Dê-me aqui. – Minha avó pega delicadamente o vestido. – Irei guarda-lo em segurança para ser usado amanhã.

 Laura e Maria vão para a cozinha e Nicholas pisca para mim antes de sair pela porta de trás. Gaspar sai pela porta da frente enfurecido e eu o acompanho.

—Posso saber o que tanto te deixa enraivecido? – Pergunto.

—Não sei do que estas a falar. – Ele diminui as passadas e eu vejo os fios espessos do seu cabelo balançarem com o vento.

—Sim, sabes. – Afirmo.

 O homem corpulento que está andando, diminui a velocidade dos passos trava o maxilar, respirando profundamente e segurando a vontade de não apertar ainda mais as unhas contra a palma da mão.

—Celine, acho que Justino quer se aproveitar de vossa mercê. – Ele solta.

—Se aproveitar de mim? – Gargalho. – Por favor.

—Acha que não tem um propósito tudo o que ele está a fazer para te ter por perto?

—Por acaso sabes de algo que não sei? – Nós dois paramos quando eu lhe pergunto isso e nos encaramos por longos segundos.

—Não, não sei. Mas não se esqueça de que sou homem e sei quando algum está tramando algo. – Passamos pela porteira e estamos nos dirigindo para a casa dele.

 Analiso o seu rosto, estreito os olhos, sorrio discretamente e me pergunto se ele está com ciúmes.

—Então quando descobrir o que seria essa façanha, conte-me. – Provoco-o.

—Eu só estou preocupado com a minha sobrinha.

 Será mesmo?

 Ao lado da casa que Gaspar e sua família dormiam, sinto um corpo pesado e robusto me imprensar contra a parede e deslizar sua mão pela minha cintura.

 Sinto a respiração quente de Gaspar no meu rosto e toco suavemente no braço forte e levemente peludo dele.

 O que está acontecendo? Por que eu sinto que eu e Gaspar ansiávamos por um contato mais árduo do que esse? Por que sinto que nós dois queremos nos beijar, mas nenhum tem coragem de fazê-lo?

—Pai. – Escutamos um grito de Nicholas, não muito longe.

 Gaspar fecha a minha boca com a sua mão forte e eu sinto minhas pernas fraquejarem com o contato.

—Oi. – Ele grita em resposta.

—Vem aqui. Precisamos continuar o trabalho.

 Uma coisa um tanto quanto estranha para um filho estar chamando pelo pai, mas não questiono.

—Certo.

 Ele fala alto novamente e tira a mão da minha boca. Olha para mim e fala algo antes de ir embora.

—Amanhã, envolva seu braço ao meu antes de entrarmos na residência de Justino. Não discuta.

 Ele me deixa sem eu obter nenhuma resposta das mil perguntas que rondam a minha mente.

A Dama FerozOnde histórias criam vida. Descubra agora