O espelho

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Finalmente a temporada de caça havia começado. Cedo peguei a minha caminhonete, coloquei minhas coisas na caçamba e sai para me enfiar na mata e passar alguns dias acampando para trazer para casa alguns quilos de carne de caça e um belo troféu pra pôr sobre a minha lareira.
Logo no primeiro dia eu achei uma clareira e preparei o meu acampamento para sair em busca do meu tão esperado prêmio.
Algumas horas se passaram e incrivelmente tudo estava silêncioso e monótono, como se tudo estivesse a mata estivesse morta.
Com o rifle nas minhas costas, preso pela bandoleira que havia trespassado pelo o meu peito eu andei mais alguns quilômetros pela mata em busca do premio da temporada. Andei e andei por algumas horas sem ouvir um pio sequer em toda a mata. Nunca havia visto algo parecido. Concentrado em minha caminhada e na caçada, acabei não notando quando o dia começava a dar lugar para o fim de tarde e o sol ja começar a se recolher. Quando ja estava perdendo as esperança quando passei por uma cabana de caça velha e abandonada. Tirei o rifle das costas e o coloquei em mira. Passo por passo comecei a me aproximar com cautela para investigar a cabana e ver se algum animal estava ali e garantir ao menos o jantar. Eu havia trazido alguns suprimentos, mas uma carne fresca era sempre bem vinda. A cabana era velha e estava quase tombada, inclinada, ladeada. O telhado velho e fraco, havia sido atravessado por um enorme galho, e as janelas já estavam apenas a armação, sem os vidros que haviam todos sido quebrados. A porta da frente estava aberta e a sua porta empenada. Uma rachadura enorme atravessava toda a casa, saindo do alicerce e terminando nas cumeeiras. Com calma eu ia um passo por vez para não assustar qualquer animal que ali estivesse e assim espantar a sua caça. Mas de repente um farfalhar dentro da mata chamou a minha atenção. Rapidamente me virei com a ponta do meu rifle e mira prontos para entrarem em ação. De canto de olho vi uma sombra se mover rapidamente do lado oposto ao que eu mirava, arrastando de forma bruta a folhagem a empurrando para trás dela enquanto avançava pela mata. Sai correndo para não perder a mira e nem a chance de finalmente, depois de horas, garantir o meu prêmio. Mas como que se fosse um passe de mágica, seja lá o que fosse aquilo, sumiu sem deixar nenhum rastro a não ser algumas pegadas que eu nunca tinha visto, com marcas estranhas e que logo sumiram. Quando dei por conta a noite ja estava mais perto de mim, do que eu da minha cabana e do meu acampamento. Pra piorar, nuvens de chuva começavam a se formar um pouco mais ao longe. Sem saída, tive que voltar até a cabana velha e capenga, para pernoitar. Por sorte havia preparado a minha mochila e trazido meu saco de dormir junto e, a minha pederneira. Quando atravessei a porta torta da cabana inclinada, a noite já estava alta e quase não conseguia ver nada, além de silhuetas sombrias da mata fechada. Logo de cara levei um baita susto que me fez dar um passo para trás quando coloquei o pé dentro da cabana. Meu coração saltou no meu peito, quase rasgando as costelas para pular para fora. Ao fundo, eu vi uma sombra se mexer. Pensei em sacar a minha arma e atirar, mas Então percebi que a sombra que me assustou, era na verdade apenas o meu reflexo em um espelho antigo e com uma rachadura enorme que cobria todo o vidro velho, gasto e manchado dele. Refeito do susto procurei me organizar, pois ficaba cada vez mais tarde. A primeira coisa que fiz foi encostar a porta e por uma pedra como calço para que ela nao abrisse com o vento e nada tentasse entrar ali sem ser convidado.
Cansado me acomodei e preparei uma fogueira com as folhas mortas que tinha aos montes dentro da casa e me alojei no meu saco de dormir. Peguei a minha mochila e dei um gole na água do meu cantil e um pacote de bolachas sortida para o meu jantar. Não demorou muito e adormeci ao som da chuva que havia começado a cair. Algumas vezes despertei no meio da noite e me assutava com o meu reflexo no espelo velho ao longe, encarando a mim mesmo, como se cuidasse do meu próprio sono. Quando acordei a mata estava mais falante e menos silênciosa do que no dia e noite anteriores. Guardei minhas coisas e já estava saindo quando minha atenção foi chamada e meu coração acelerou novamente, querendo sair do meu peito. No fundo da casa havia uma porta sem porta, e atraves dela era possível ver uma outra rachadura que ia do chão até provavelmente ao teto. As manchas que pensava ser do espelho velho, eram na verdade as mesmas pegadas que havia visto na tarde anterior na floresta de chão umido e enlameado. Elas estavam no sentido de subir e descer pela parede, eram pegadas, pegadas e não manchas de uso e do tempo. Não era um espelho e não era o vidro trincado dele, mas sim uma porta vazia, não havia nada em frente a ela, era apenas uma passagem vazia, um marco vazio sem uma porta entre ele, não havia como ter ali o meu reflexo, não havia como.
Agora eu era o troféu para alguém.

Ampolas De SustosOnde histórias criam vida. Descubra agora