Tíunda

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Odin nos designa quartos no grande castelo que achei ser Valhalla, mas na verdade é apenas a morada dos deuses. Não há deuses ou criaturas andando pelos corredores e nenhum som pode ser ouvido nas paredes. É como se o castelo estivesse abandonado.
Claro, as notícias não são boas. A Jormungand se libertou de sua prisão obsessiva e agora está contornando sua passagem lenta pelos mundos um a um, tentando alcançar nada mais nada menos que a Yggdrasil, para que assim possa absorver ela e seus nove planetas. Ótimo, simplesmente ótimo.
E para melhorar, eles confiam a mim o destino dos nove mundos. Decisão horrorosa.
— Nossa Dae, nunca pensei que você aceitaria algo tão altruísta — diz Aleks, parecendo orgulhoso, enquanto caminhamos em direção aos quartos, guiados pelos corvos de Odin. Paro e viro na direção dele e os outros que me acompanham, esperando os corvos se afastarem um pouco.
— Quem disse que eu aceitei? Só disse aquilo para baixarem a guarda comigo e me deixarem mais livre pelo castelo — cruzo os braços, mordendo o lábio e ainda procurando por deuses ou monstros pelos cantos, com os olhos. — Assim, terei acesso a mais lugares e encontrarei uma forma de fugir.
Aleks me encara com atenção, assim como Loki e Sarah, todos com a mesma expressão de "porra, Dae". Levo um tempo até perceber e balanço a cabeça.
— Ah, espera. Vocês também querem voltar? Poxa, a Terra seria bem melhor sem vocês — Aleks faz uma cara indignada e eu rio para aliviar o clima. — É brincadeira! Maya morreria de saudades e me decapitaria se você sumisse. E seus brinquedos de heróis também sentiriam sua falta, Sarah — olho Loki e sorrio. — E eu posso fazer um bom uso de uma empregada.
Ele estala a língua e revira os olhos, mas a resposta fria ou o xingamento que eu esperava não vêm. Aleks esfrega as mãos contra o rosto.
— Dae, quero ir para casa tanto quanto você, mas não acho que seja uma boa ideia fugir. Precisamos ajudar eles...
— Claro que não, você é você. Por isso não pedi sua opinião — me volto para Loki. — Alguma ideia?
— Eu odeio admitir isso — ele coloca a mão sobre o peito e olha Aleks com desgosto. — Odeio MESMO admitir isso. Mas o midgardiano aqui está certo, precisamos ficar e ajudar — meu queixo cai e eu aponto um dedo para ele.
— Isso é só para me contrariar! Ou é um truque! Motim! — jogo os braços para cima, mas Loki nega com a cabeça, com uma expressão bem séria.
— Olha, eu conheço Odin. Ele nunca confiou uma tarefa a mim — Loki para de falar por alguns segundos e vejo a tensão em sua mandíbula e nos lábios retraídos. — Se ele chegou a esse ponto, quer dizer que as coisas estão mesmo fora de controle.
— Agora só porque seu pai te deu atenção seu daddy issues está resolvido e eu tenho que arcar com as consequências?! — exclamo, passando as mãos pelo cabelo e andando de um lado para o outro. — É em mim que estão confiando, não em você.
Dessa vez eu devo ter atingido um ponto realmente fraco de Loki, pois ele apenas sai andando com o corpo tenso e as mãos fechadas em punhos. Suspiro e apoio as mãos nos meus ombros, olhando o teto cheio de gravuras no meio do corredor. Lá em cima, uma horda de valquírias avançava sobre um gigante.
— Você pegou pesado — escuto Sarah resmungar e olho na direção dos dois, vendo que ainda estavam ali. Reviro os olhos e cruzo os braços novamente.
— Você, melhor que ninguém, sabe como é ter os seus problemas diminuídos — repreende Aleks. — Eu sei que está com medo, e que quando você fica com medo você vira essa carcaça de espinhos, mas não é o momento para afastar ninguém — ele suspira, parecendo considerar se diz ou não as próximas palavras. — Nem mesmo ele.
— O que? Vai dizer que eu devo atrás dele implorar por perdão? — debocho, mas a expressão de Aleks diz tudo. Suspiro e mordo o lábio, encarando o chão e me sentindo levemente culpada. — É, talvez eu deva pedir desculpas...
— Talvez? — instiga Sarah e levanto a cabeça só para mostrar a língua para ele. Aleks segura meu queixo, me fazendo o olhar e sinto arrepios subirem pela minha espinha.
— Converse com ele. Vocês dois têm muito em comum... Vão saber como se ajudar.
— Vai me deixar chegar assim perto dele? — pergunto, recebendo um olhar de dúvida do loiro. — Sem escolta policial, desarmada e com a minha carteira no bolso?
Aleks empurra minha cabeça na direção que Loki havia seguido e tropeço duas vezes antes de recuperar o equilíbrio. Rio fraco e mando um beijo para ele antes de ir atrás do deus chorão da trapaça.
O alcanço na esquina, mas ao notar minha presença ele apenas entra em um quarto. Porém, antes de fechar a porta, coloco meu pé na fresta.
— Precisamos conversar.
— Não quero ouvir seu discurso de pena — ele força a porta para fechar e sinto meu pé ser esmagado dolorosamente.
— Não estou aqui para sentir pena. Ou para ser alvo dela. Só vim me desculpar pelo que disse. Agora larga o meu pé! — ele se afasta da porta e segue em direção a janela. Seus ombros estão visivelmente tensos e sua respiração pesada.
— Não sou ingênuo como você pensa, não estou fazendo isso porque acho que Odin...
— Eu fui criada assim, ou melhor, me criei assim — o interrompo, parando atrás dele a uma distância segura. — É mais fácil fingir que o problema não me afeta e continuar vivendo com ele como se ele não existisse e nada me abalasse. E na minha cabeça, as pessoas têm que ser assim também — encaro o reflexo de Loki, mas ele está com o olhar distante e perdido. — Mas nem tudo precisa ser levado a ferro e fogo, e não é só por isso que eu devo tirar o valor de todas as suas outras força e conquistas.
— Olha eu não sei ser melhor do que isso. E eu nem pretendo tentar — continuo, vendo que ele não vai falar nada. — Mas eu não quero ir embora sozinha.
— Se seu desejo ainda for fugir, saiba que fará isso sozinha — ele me olha por cima do ombro, com o olhar feroz. Me aproximo com cuidado, como se ele fosse um animal perigoso.
— Como eu disse, não quero ficar sozinha — abraço ele por trás, arriscando minhas chances, e apoio minha testa em seu ombro. — Não sei mais viver sem minha putinha — sua risada baixa faz seu corpo tremer.
— Não tem nem dois dias.
— O que eu posso dizer? Meu tipo realmente é bandidos, assassinos e mentirosos — brinco, mas com um fundo de verdade. Ergo a cabeça e o solto, deixando o deus virar na minha direção completamente. Faço bico. — Me perdoa?
— Não posso dizer não para você — reclama Loki com um suspiro dramático. Rio e balanço a cabeça. — Sério, literalmente.
— Assim que eu gosto, um homem permissivo — beijo perto dos lábios dele, sentindo ele tremer e se afastar pelo susto. Sorrio ladino e suspiro, levemente decepcionada, mas tento não deixar transparecer. — Tão cadela.
Me afasto dele e sigo para fora do quarto, em silêncio. Mas sinto sua aproximação e ele segura a porta antes que eu a abra, com seu corpo a centímetros atrás do meu.
— Você precisa parar de me chamar assim — ele sussurra em meu ouvido e sinto um arrepio percorrer gelar minha espinha, me encolhendo perto dele. Olho por cima do ombro e sorrio, vendo o quanto seu rosto está perto do meu. Sua respiração faz cócegas em meus lábios.
— E quem vai me parar? — pergunto, alternando entre seus lábios e seus olhos. Ele abre o sorriso maldoso que eu tanto venero.
Mas antes que pudesse responder, Aleks abre a porta, quase acertando minha cara. Loki se afasta e eu também, cambaleando sem forças nas pernas. O intruso olha entre nós dois com as sobrancelhas erguidas.
— Já estava achando que ele tinha te matado... Vamos logo para nossos quartos, temos que encontrar Odin no jantar — diz Aleks, passando o braço por meus ombros e me arrastando para fora do quarto.
Rio e olho Loki uma última vez antes de sair em silêncio, vendo que ele ainda não havia desmanchado o sorriso e ouvindo meu coração bater em meus ouvidos.

Almas Escuras {Loki}Onde histórias criam vida. Descubra agora