Me despeço de Daemi, que entra em um quarto oposto ao meu, enquanto Sarah está no quarto ao lado do dela. Fecho a porta e olho ao redor, tentando imaginar uma divindade morando ali. Tento a imaginar se deitando naquela mesma cama de plumas, repousando a cabeça naqueles mesmos travesseiros de seda e se cobrindo com a manta de pele. E acima de tudo, tento imaginar Daemi como um deles.
Suspiro e corro os olhos pelo quarto, absorvendo o conteúdo das tapeçarias e dos murais, que exibem criaturas monstruosas sendo arrasadas por um cara com um martelo e seus trovões. Não deveria me ser surpresa o fato de terem me designado o quarto de Thor, mas não deixo de me impressionar. Poucas divindades possuem conhecimento nos dias de hoje, mas a pintura é bem semelhante ao que vejo em jogos, figurinhas e quadrinhos pelas lojas.
Sou tirado dos meus devaneios ao ouvir alguém bater na porta, e me pego pensando na probabilidade de ser o próprio Thor em pessoa, vindo reclamar seus aposentos. Me aproximo e abro a porta com cuidado, espiando pela fresta. Daemi está no corredor, vestindo apenas uma camisola de cetim cor de rosa e chinelos de tecido iguais. Sinto meu rosto quente e pisco algumas vezes, mantendo meus olhos nos dela.
— Você... um... precisa de algo? — gaguejo e me repreendo mentalmente, tentando não parecer nervoso.
— Só quero conversar com você — responde Dae, encolhendo os ombros e olhando para um ponto atrás de mim. — Posso entrar?
— Claro, claro! — abro espaço imediatamente, surpreso. Geralmente, quando algo incomoda Daemi, ela se fecha em uma casca impenetrável até que o problema suma. Mesmo que isso signifique sumir da minha vida por meses e recaparecer como se nada houvesse. — Fico feliz que tenha vindo. Como foi a conversa com Loki?
— Ah, eu xinguei ele, me humilhei um pouco e no fim fizemos as pazes — diz Dae, entrando e sentando na otomana de frente para a minha cama. Fecho a porta e me aproximo dela, sentando ao seu lado.
— Fico feliz.
Mas eu não me sinto exatamente feliz. Sei que interrompi algo na hora em que entrei no quarto, algo que Dae está deixando de mencionar.
— Você ainda está com essa roupa — observa Dae, apontando meu colete. Olho minhas roupas e olho as dela, percebendo uma coisa.
— Você vai assim para o jantar com Odin? — ela coloca um dedo sobre meus lábios, me fazendo parar de falar.
— Vem, eu te ajudo a tirar — Dae me faz levantar e desafivela meu colete em um tempo recorde, arrancando minha blusa de botão com força, fazendo os botões estourarem. Seguro suas mãos para a parar.
— O que você está fazendo?! — quase berro, sentindo meu rosto quente e meu coração descompassado. Dae solta suas mãos das minhas e as deliza por meu peito, me ocasionando arrepios. — N-não íamos conversar?
— Nunca disse que era uma conversa civilizada — suas mãos se encontram na minha nuca e seu peito cola contra o meu. — Só quero te fazer ver que não há motivo para ter ciúmes — encaro seus olhos verdes cheios de luxuria, e aquela sensação de perigo me abate, me fazendo pensar nas palavras de Odin.
Sem perder mais tempo, beijo seus lábios irresistíveis, segurando sua cintura e deixando minhas emoções guiarem esse momento. Ela retribui, colando ainda mais nossos corpos e sinto-me atiçado, ardendo. Seu contato queima ainda mais quando ela desliza a mão para dentro da minha calça, me levando ao delírio. Solto um gemido rouco, necessitado. É como se um sonho se tornasse realidade com Daemi em meus braços.
Ela me empurra contra a cama e eu caio para trás no colchão macio, me apoiando em meus cotovelos para ver ela, hipnotizado. Dae senta sobre a minha cintura, com o sorriso malicioso mais enlouquecedor que já vi. Deus, valeu a pena esperar. Dae começa a se despir lentamente, me deixando ansioso e mais excitado. Mas ela para, e vejo que encara um ponto atrás de mim, com desgosto. Sua postura mudando de uma hora para a outra.
— Não acredito que estamos no quarto dele — reclama, e eu olho para a cabeceira, vendo o mural com o desenho do perfil do rosto de Thor, com os longos cabelos loiros soltos embaixo de um capacete prata com asas nas laterais.
— O que tem? — volto a olhar Daemi confuso, que percebo mudar novamente a postura e a expressão. Seu sorriso malicioso volta, mas não como antes, e sim forçado. Raivoso.
— Nada, meu amor, não é nada — ela acaricia meu rosto e se inclina para me beijar novamente, mas vejo o brilho de uma lâmina refletir em sua mão livre atrás das costas e paro seu braço antes que ela atinja meu abdômen.
A encaro transtornado, e levo uma cabeçada no nariz, sentindo a dor jorrar e me cegar por um segundo, mas não afrouxo o aperto no braço dela, mantendo a adaga longe do meu corpo.
— O QUE VOCÊ...? — grito, e então seu outro pulso voa na minha direção, agora como alvo a minha garganta, e uma adaga semelhante ameaçando tirar minha vida.
Dae começa a brilhar com uma cor verde e assume a forma de Loki. Arregalo ainda mais os olhos, não me dando tempo para ficar em choque e disputando com Loki a força dos braços. Mas submisso e tonto, ele começa a ganhar vantagem e sinto a minha pele rasgar superficialmente.
Isso parece ser o suficiente para me fazer reagir e solto um grito, sentindo a adrenalina atingir seu pico. Solto um de seus braços, e desvio na mesma hora, o fazendo atingir o colchão, que explode em penas e plumas bem na sua cara e me dando a vantagem. Inverto as posições, o jogando contra a cama e sentando sobre ele, com seus braços bem presos acima de sua cabeça. Torço seus pulsos até que ele solte as adagas, ouvindo ele gritar e grunhir enquanto tenta me acertar com as pernas e a cabeça.
— Isso não é algo que se vê todo dia — escuto a voz de Daemi e a vejo na porta, quase sendo derrubado por Loki no processo, mas recupero o equilíbrio e o mantenho preso embaixo de mim.
— ELE TENTOU ME MATAR! — grito, com o coração batendo nas orelhas e sentindo Loki ainda tentar se libertar, no meio da confusão de restos de colchão e adagas.
—Loki, fique imóvel e diga o que você veio fazer aqui — o corpo de Loki para de se mexer completamente. Tento acalmar meus batimentos cardíacos e controlar minha respiração, encarando Loki com mais ódio do que jamais pensei ser possível sentir.
— Sai de cima de mim! — ordena Loki, e vejo Dae se aproximar pelo canto do olho, agachando na altura dele ao lado da cama.
— Fala, agora.
— Vim seduzir o Aleksander usando seu corpo para matar ele e te arruinar — responde Loki, com a voz carregada de ódio. Arregalo os olhos e seguro a gola de seu manto, erguendo seu corpo mole.
— Loki, seu...
— Por que? — indaga Daemi, com a expressão dura como pedra.
— Porque eu fiquei com inveja de você e de Odin — rebate Loki, encarando Dae com raiva. — Você caiu no teatrinho do deus injustiçado e sem amigos, e ainda me entregou de bandeja sua historinha patética de vida. Você é ridícula, vocês são ridículos, isso é totalmente ridículo!
— Cala a boca! — grito, fechando o punho e o fazendo voar na direção da boca de Loki, mas a mão de Dae é quem leva o tranco, e ela me faz recuar.
— Você beijou o Aleks? — pergunta Dae, não esboçando dor ou sequer olhando na minha direção. Loki e eu a olhamos surpreso, e o deus afirma com a cabeça. — Você despiu ele? — outra afirmativa, e sinto meu rosto quente. O que ela está fazendo? — E você gostou, Loki?
O encaro com os olhos arregalados, vendo que ele comprime os lábios para não ter que responder.
— Responda a pergunta, em alto e bom tom — ordena Daemi, com os olhos verdes brilhando como jóias.
— Sim — Loki responde, e eu saio de cima dele, cambaleando, horrorizado. Daemi abre um sorriso satisfeito.
— Você pode ter descoberto o seu próprio ponto fraco, Loki, mas não o meu. Não me importo nem um pouco com o que acontece ou deixa de acontecer com Aleks — rebate Dae, com um sorriso cínico. — Você não me humilhou apenas por saber uma historinha triste minha. Já você, minha putinha... está arruinado antes mesmo de eu sequer tentar te arruinar.
— Eu te odeio — rosna Loki, com o rosto vermelho e os olhos molhados. Eu poderia até sentir pena dele agora, mas não tenho motivos. O sorriso de Dae se torna crescente.
— Conto com isso. Agora saia daqui e deixe Aleks em paz. Não quero ter que ser babá de dois homens grandinhos o suficiente para saberem o que me irrita e o que não me irrita — diz Dae, massageando as temporas. Loki levanta, limpa as penas de seu traje e sai do quarto sem dizer nada.
Abraço meu corpo, me sentindo usado e humilhado. Tudo recai sobre mim agora, e me sinto exausto. Quero chorar, mas as lágrimas não vêm. Meu coração pesa dentro do meu peito e cada músculo do meu corpo lateja. Sinto a mão de Daemi em meu ombro e me encolho.
— Você está ferido?
— Não, eu estou bem — respondo, me afastando e procurando por minha blusa por baixo da camada de penas e plumas que se espalharam pelo quarto.
— Sabe que eu só disse aquilo pra te proteger, não é? Eu me importo com você — diz Daemi, me estendendo um trapo, que percebo ser minha camisa destruída por Loki. Bufo e arranco o farrapo da mão dela.
— Não sei de nada, Munc. Só sei que você e Loki gostam de brincar com a mente das pessoas e magoar elas com seus joguinhos.
— Mas...
— Só vai embora, Dae — imploro, seguindo para o banheiro e fechando a porta sem a olhar, me deixando chorar em silêncio.
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Almas Escuras {Loki}
Hayran KurguDaemi Munc é uma ladra compulsória que tem um trato com a polícia. Ela delata criminosos e eles livram ela dos pequenos roubos que comete. Sua vida de crime começa a perder a graça, até que Dae tem um sonho. No sonho, ela caminha pelo salão de Odin...