Capítulo 8

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Marcos cronometrara por dois dias a visita do garoto que trazia o café da manhã para os diretores da Cross e Anderson sondara o rapaz, com uma conversa de que já fez aquele serviço, que observara ele levando os pacotes, etc... O rapazinho da padaria estranhou, mas o jeito franco e ingênuo de Anderson o tranqüilizara. Era apenas um cliente simpático que puxou papo com ele. O plano de Marcos consistia em substituir o rapaz um dia para ter acesso às instalações da Cross, principalmente o andar da diretoria. Como iria fazer isso ainda era uma incógnita, mas até o momento não tinha pensado em um meio melhor de entrar no prédio. Anderson sugeriu que subornassem o garoto, mas era arriscado. Naquele dia teriam a resposta.

Quando o garoto estacionou a bicicleta na frente do prédio e descarregou a cesta com os pacotes, um deles se abriu, derramando parte dos petit-four na calçada. Pelo binóculo Marcos observava a cena e teve uma idéia.

- Rápido, Anderson! Vá até lá e veja o que tinha naquele pacote. – Sem entender bem o que Marcos queria com aquilo, Anderson atravessou a praça em direção ao local onde estava a bicicleta. Quando chegou perto, o garoto já havia entrado pela portaria com o restante dos pacotes. Na calçada estavam pequenos folhados dourados cobertos de gergelim, o que deixou Anderson com água na boca. Constatado o que Marcos pediu, ele disfarçou, atravessou novamente a rua e foi até a banca de jornais que havia na praça. Parou um instante, como se lesse as manchetes, depois voltou para a van.

- E então? – perguntou Marcos ansioso.

- São biscoitinhos folhados, uma delícia! Os caras passam bem, ali...

- Você consegue comprar desses folhados na padaria, não? – Marcos tirou da carteira uma nota de cinquenta reais e entregou para Anderson. – Vamos fazer o seguinte...

Minutos depois Anderson saía da padaria com um pacote idêntico ao que derramara na entrada da Cross. Marcos, de um telefone público, ligou para a empresa e pediu que a telefonista transferisse para a portaria. Identificou-se como gerente da padaria que lhes atendia e desculpou-se pelo incidente. Informou que mandaria um outro entregador levar a mercadoria imediatamente. Tudo isso instantes depois do garoto, o verdadeiro entregador, ter saído célere em sua bicicleta.

Anderson chegou com o pacote e entregou-o a Marcos. Do ponto onde estavam estacionados não poderiam ser vistos por ninguém que estivesse na frente do prédio da Cross.

- Agora me espere aqui. – Marcos estava impaciente para colocar seu plano em prática. – Eu vou até lá e não demoro. Se precisar eu te ligo pelo celular.

- E não vão estranhar? Nem avental você tem!

- Não será preciso. Eu disse ao segurança que sou o gerente da padaria e que levaria outro pacote pessoalmente. Temos que ser rápidos, pois não sabemos se o garoto volta ou não com uma entrega verdadeira para repor o que caiu.

- Boa sorte, cara... Você vai precisar...

Anderson ficou olhando enquanto Marcos se afastava pela calçada. O colega sempre fora ousado, tomando atitudes impensáveis para obter o que desejava para suas matérias. E essa nem era a maior loucura que ele já fez... Trabalhar com o Marquinhos era dar pena de morte à rotina! O jornal teve muita sorte em consegui-lo... Para Anderson, ele era um modelo a ser seguido como jornalista investigativo, e tinha por ele a admiração que normalmente temos por um irmão mais velho ou um pai. Isso era curioso pelo fato de Anderson ser mais velho que Marcos, mas explicava-se pelo fato de não ter um décimo de sua coragem e ousadia.

Marcos não teve dificuldade em entrar na portaria. O hall de entrada demonstrava bem o poder da corretora de valores, todo em mármore negro e alumínio escovado. Todos os vidros eram recobertos por uma película âmbar que deixava a luz do dia mortiça, mas a iluminação interna era bem planejada. Discretamente ele distinguiu, ainda na porta, a posição das câmeras de segurança, evitando que seu rosto fosse claramente capturado. No centro do saguão um sofá de alvenaria com almofadões em couro preto contornava uma espécie de jardim, com palmeiras anãs e vasta folhagem tropical. Em frente ao sofá circular ficava um balcão em forma de meia lua, onde perfilavam-se quatro recepcionistas saídas de um catálogo de agência de modelos, e à direita os elevadores, com portas em vidro fumê que permitiam ver seu interior. Sem poder avaliar qual das garotas seria mais receptiva, Marcos tentou a que ficava na extremidade direita do balcão, mais perto dos elevadores. Ao se aproximar, a moça dirigiu-lhe um sorriso treinado mas não menos encantador por isso.

Cross - A ascensão de SophiaOnde histórias criam vida. Descubra agora