O homem certo

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04h03 era o que o relógio à minha frente declarava, e o vazio ao meu lado na cama confirmava que ele estava certo. Sem muito o que fazer sentindo meu corpo levemente desperto, caminhei em passos calmos até o quarto ao lado, encontrando uma cena que garantiria que eu acordasse a hora que fosse o dia que fosse.

Os loiros cabelos de Daphne pareciam brilhar pela luz que cortava a fina cortina branca do quarto recém decorado. Seus olhos estavam atentos demais na criança em seu colo para que ela percebesse a minha presença, apoiado no batente da porta esfregando minhas mãos em meus olhos na esperança de ver com ainda mais clareza a cena à minha frente.

- Você não precisa levantar todas as noites - ela declarou depositando as orbes verdes sob mim fazendo com que meu rosto ganhasse o mesmo sorriso que dominava os seus lábios.

- Assim como você não precisava ter aberto mão dos elfos domésticos - retruquei aproximando-me dela e da criança estranhamente silenciosa em seus braços - Qual feitiço você faz para que ele fique tão silencioso? - perguntei enfim, visualizando as feições calmas de nosso filho.

- Leite materno - ela comentou rindo e eu logo me vi acompanhando seu riso.

Mesmo com ele adormecido em seus braços eu sei que ela poderia passar horas até o amanhecer apenas o vendo dormir, e eu facilmente seguiria, intercalando meu olhar entre ela e o pequeno bebê de pele oliva e olhos que pareciam caminhar felizmente para o verde da mãe. O sorriso de antes ainda tomava conta dos meus lábios enquanto eu era atingido em mais uma das tantas vezes pela constatação de que o arranjo deste casamento não era de fato ruim se visto apenas o meu lado completamente apaixonado pela mulher que me dera o herdeiro que meu pai tanto aguardava e que eu não fazia ideia do quanto precisava até começar a acordar sem despertador quase que religiosamente às 4h de toda manhã.

Por mais que já beirassemos um ano de nossa união, e Daphne fosse um primor de companheirismo, seguia sendo incômodo o quanto os meus sentimentos por ela dominavam o meu ser. Como se os anos que vivemos antes de sua volta a visita que fez a Nott, naquela estranha tarde onde a mesma aparatou em um casaco bege como seus cabelos, os olhos vermelhos e as palavras firmes declarando que sabia do desejo de nossos pais por nossa união e que seguiria com ela se eu estivesse de acordo, jurando o que ela cumprirá desde então: companheirismo.

Mas ela me entregava mais do que eu acreditava ser companheirismo, ou mais do que o meu tolo coração gostava de acreditar que fosse, alimentando sempre uma esperança quando a mesma aguardava por mim em bailes onde eu precisava estender minha presença a reuniões deixando ela em salões com pessoas que eu nunca sabia ao certo até onde ela nutria carinho ou qualquer tipo de afeição. Ela sempre estava presente com um sorriso ameno perguntando sobre como as coisas estavam indo e se eu gostaria de ficar mais. Parte de mim por vezes aceitou que isso possivelmente fosse apenas um reflexo do quanto ela havia sido criada para ser uma boa esposa sangue purista, por mais que eu desejasse estar vivendo algo como o que meu ex amigo agora cunhado vivenciava com a minha cunhada e suas intermináveis risadas pelos cômodos e festas quando presentes.

Não que Daphne não compartilhasse de gostos e prazeres comigo, longe disso, era fácil levar uma conversa sobre qualquer que fosse o tema com ela, apesar da mesma nunca esconder o seu gosto por herbologia, o que fez com que a nossa mudança para França nos últimos meses de sua gravidez não fosse nada além do mínimo que eu podia ceder em agradecimento pela sensação que ela havia trazido a minha vida com a espera do meu primogênito.

Eu não me lembro de um dia ter fantasiado com convicção como seria minha vida após os sete anos em Hogwarts, por vezes eu me perdia pensando no quão mais fácil seria se assim como alguns colegas eu começasse um relacionamento ainda no castelo, poupando assim o trabalho de meus pais na busca por uma noiva perfeita. Mas a minha adolescência era regada a mais libertinagem do que eu era capaz de hoje acreditar que de fato aconteceu. E de fato eu não me arrependia e nem faria de outra forma. Até mesmo o encontro com Theodore a pouco mais de um ano, era algo do qual eu internamente me orgulhava. Eu havia feito o certo para com ele, e também para com a hoje minha esposa, na verdade para com todos os envolvidos, livrando Draco da falta de escolha em seu noivado o entregando nos braços de minha doce cunhada e sendo agraciado pela mulher que agora passeava os dedos levemente pelos meus cabelos enquanto ainda mantinha seus olhos fixos no bebe em seu colo.

Desventuras do Sangue | DrastoriaOnde histórias criam vida. Descubra agora