A desventura de ser parte do sagrado vinte e oito

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Deixei que meus olhos vagassem mais uma vez, preguiçosamente, pela vastidão de pessoas à minha volta. Apesar dos diferentes tons em suas roupas, todos pareciam iguais, apenas réplicas, como se meros figurantes em um salão de festas do qual a festa em si pouco importava. Pelo menos pra mim.

Não era como se eu quisesse estar ali, mas também não havia outro local onde eu de fato quisesse estar. Assim vinha sendo meus últimos meses desde o fim da Guerra. Meses esses que já tinham se tornado um ano. Ano esse que por sua vez passou como que num piscar de olhos, sem grandes aventuras ou até mesmo emoções.

Como se fosse algo usual, peguei uma taça de champanhe enquanto caminhava para o jardim. Não que eu estivesse familiarizada com o local a ponto de me aventurar em sair por uma caminhada por ali, mas também não era como se algo pudesse de fato me afligir. Eu precisaria estar ao menos me sentindo viva para ter algo tão simples como medo da noite lá fora, mas eu não sentia nada neste momento além da vontade de tomar um ar e com sorte encontrar um pouco de vida em mim mesma.

Pensando assim, eu até pareço como alguém triste ou desmotivada, mas a verdade por trás desse humor tão desanimado é apenas o fato de eu estar há menos de doze meses do fim da minha vida em Hogwarts, mas sem perspectiva nenhuma do que fazer depois disso.

Apesar do meu status perante a sociedade bruxa ditar que eu deveria ser encaminhada para um casamento puro, meu pai seguia sem grandes preocupações para com isso. Até porque, à minha frente estava Daphne e sua terrível indecisão, por mais que todos soubessem que o sim dela só seria destinado ao jovem Nott. Por mais que ambos estivessem tentando a todo custo seguir com suas vidas após a escola, como se as cicatrizes da guerra tivesse de fato afetado o interesse dos dois, qualquer um que convivesse minimamente com eles sabia que estavam fadados a terminar juntos. Fosse por amor, ou pelo fato de ainda ser um bom negócio para as famílias.

Sentei em um tronco que parecia estar alojado para ser um banco, virei o liquido da minha taça em apenas um gole, descansando a mesma no chão. Aproveitei para puxar todo o ar possível, inflando os meus pulmões. Ao mesmo tempo que nada acontecia diretamente comigo, a ansiedade do que poderia acontecer estava me levando dia após dia à loucura.

Mas não uma loucura externalizada, a pior face dela, a loucura interna. Eu mal conseguia aquietar a minha mente estando sozinha, como agora. O álcool parecia só auxiliar o meu coração a bater ainda mais rápido e as pessoas tão envolvidas em suas próprias conversas dentro daquele salão, que eu agora observava de longe, aumentava a minha sensação de insignificância.

Se nada acontecesse eu facilmente seria esquecida, e eu odiava essa sensação, apesar de cada dia mais ela me consumir. Até porque, quem iria lembrar da caçula de uma família das sagradas vinte e oito, que não teve um casamento memorável e nem ao menos se preocupou com isso com a possibilidade de ser algo além de uma Greengrass nascida.

- Está tão entediante assim? - uma voz soou no meu lado esquerdo, fazendo meu corpo sobressaltar. Eu não percebi a aproximação e também não havia esperado que uma de fato acontecesse.

- Desculpe? - falei enquanto endireitava o meu corpo e retirava minha taça do chão.

- Você ainda não tem idade para isso, Greengrass - o jovem Malfoy me repreendeu apontando para a taça em minha mão, enquanto um sorriso sarcástico brincava em seus lábios.

- A festa de fato está entediante - respondi forçando um sorriso amistoso, tentando calar a inquietação em meu ser ao perceber que ele ainda sabia quem eu era.

- Não é algo muito educado de se dizer ao anfitrião - o tom sarcástico tomou conta de sua voz, mas sem muito espaço, já que o que saiu de sua boca em sequência parecia um suspiro de desânimo - Por mais que eu concorde.

Desventuras do Sangue | DrastoriaOnde histórias criam vida. Descubra agora