30. Pai.

6.8K 686 112
                                    


🥀

        𝓝unca chorei tanto, assim como nunca senti tamanho desespero. Ver aquela criança morrer daquela forma, sabendo que só tinha acontecido porque eu ajudei Luke a conseguir o cálice, fez a dor ser ainda maior. No entanto, a esperança também estava presente. A Guarda e os membros do Conselho entraram com tudo no campo de batalha, lutando com três ou mais híbridos ao mesmo tempo, aliviando os civis. Ver aquilo me fez pensar positivo. Saí da janela e corri em direção a varanda no segundo andar, onde podia observar melhor o que se derensolava no jardim. 

A chuva ainda caía forte, batendo com força contra os telhados, inundando o chão, e embaçando minha visão. Pelo menos, impedia que os vampiros sem anéis queimasse no sol, e com certeza atrapalhava os híbridos. A batalha estava equilibrada agora e quando achei que enfim poderia respirar aliviada, vi uma criança emergir nos jardins, se abraçando para proteger o corpo da chuva. O menino esguio, não deveria ter mais de oito anos, e sua roupa cinza estava encharcada. Numa batida de coração, eu já tinha saído da sacada e corrido pela casa, escorregando pelo chão que molhei até chegar a porta. 

A chuva me pegou com tudo, as gotas pesadas machucando minhas costas enquanto eu dava a volta na casa. Felizmente, os híbridos estavam imersos demais em sua luta com os vampiros para me notar, e para notar o menino que logo encontrei. 

— VOCÊ! — Gritei ao me aproximar e puxa-lo pelo braço. — Você não pode ficar aqui fora! 

— Preciso achar meu pai! Ele está precisando de mim! 

— Seu pai precisa que você fique seguro! — Seja lá quem for seu pai, e se ele não estiver morto, adicionei mentalmente. — Venha comigo, precisamos ir para um lugar seguro. 

Ao falar, água entrou em minha boca e tive que cuspi-la. Respirar sob a chuvarada também se provou difícil e eu logo estava arquejando. Puxei o menino pelo braço, tentando voltar para minha casa, mas uma luta se desenrolava frente a porta, impedindo minha passagem. A casa vermelha era a mais próxima, mas ainda assim havia um mar de chuva e luta entre nós e ela. 

— Fique ao meu lado, ok? — Pedi ao segurar a mão dele com força. — Se eu cair, você corre! Pra bem longe! 

O menino assentiu, seus olhos azuis assustados. Pedi a Deus, ou a qualquer divindade que existisse, para me dar forças pra entregar aquele menino ileso ao pai que ele tanto procurava. 

— Qual o seu nome? — Perguntei quando começamos a andar abaixados pela lateral da minha casa. Assim que saíssemos da cobertura falha que a parede nos dava, teríamos que correr. 

— Liam. E o seu? 

— Lizzie. 

Respirei fundo e água entrou pelo meu nariz, me fazendo engasgar. Liam me olhou com preocupação, mas não disse nada.

Haviam três grupos de vampiros e híbridos lutando no espaço que eu tinha para percorrer com Liam até a casa amarela, e se eu fosse rápida, talvez eles não nos notassem. *Talvez.*

Apertei ainda mais a mão ao redor do braço do mini-vampiro e gritei *"CORRE"* antes de começar a correr em direção a casa amarela, meus pés batendo furiosamente no chão. Liam, ao meu lado, corria muito bem, melhor que uma criança normal faria, mesmo não tendo a velocidade sobrehumana dos vampiros. Nós esgueiramos pelo primeiro grupo sem nenhuma preocupação, e quase fomos pegos no fogo cruzado no segundo, mas a sorte nos faltou no terceiro. Assim que passamos ao lado dos dois vampiros e do híbrido que lutavam, o híbrido conseguiu arrancar o pescoço de um dos vampiros e o outro fugiu, jogando sua lança aos meus pés. 

O que fez o híbrido olhar diretamente para mim e Liam. 

Peguei a lança enquanto o híbrido avaliava nós dois: um humana segurando pateticamente uma lança maior que ela, e um vampiro de oito anos de idade. Ele riu e a chuva deslizou por seus lábios entreabertos. 

— Eu sou uma humana e ele é uma criança. Porque não vai lutar contra alguém do seu tamanho? — Perguntei tentando parecer corajosa, mas logo percebi que só enfatizei minha fraqueza. 

— Híbrida. Você é uma híbrida. Sinto no seu sangue. — O híbrido disse num sorriso diabólico. Os seus cabelos escuros colados ao rosto pela chuva forte. — Só não entendo porque você está na Corte se não responde ao Balmer.

— Porque eu respondo ao Darkless. — Declarei, erguendo a lança. 

Nos rodiamos, sem nenhum dos dois fazer o primeiro movimento. Pelo visto, o híbrido tinha ressalvas em machucar pessoas de sua própria espécie. E também, parecia muito mais interessado em conversar, pregar a palavra de Luke Balmer. 

— Luke quer salvar o mundo dos vampiros. 

— Vocês são metade vampiros. 

— Mas somos humanos também! — Ele gritou, parecendo realmente ofendido. Olhei para o lado a tempo de ver Liam observar tudo com olhos atentos. — A humanidade prevalece. 

— Se a humanidade prevalece, deixe a criança ir. 

— Ele não é nenhuma criança inocente! É uma besta, que bebe sangue! Nossas crianças são inocentes, o filhotes de vampiros são monstros! 

— Ele é só um garoto! A raça dele não muda isso! 

— Mas a sua raça muda tudo! Você deveria estar lutando ao nosso lado, mas está seguindo as ordens do maldito Darkless! Está indo contra sua espécie apoiando um monstro, o pior de todos eles! Niklas Darkless morrerá por nossas mãos e essa Corte maldita irá cair! 

— Não. — A voz fina e doce de Liam ecoou, como se tivesse gritado, mesmo que houvesse soado baixa e controlada. De alguma forma, eu conseguia ouvi-la sobre o barulho da chuva, clara e sem nenhuma interferência. — Ele não é um monstro. 

Não acreditei nos meus olhos quando o híbrido caiu de joelhos, arquejando por ar, apenas porque Liam tinha os olhos fixos nele. 

— Jamais chame meu pai de monstro novamente. Jamais.  

Liam ordenou e meu coração errou uma batida. 

PAI, PAI, PAI, PAI, PAI, PAI, PAI.

Lentamente o híbrido começou a se levantar, fugindo do controle de Liam, e numa atitude desesperada, guiada pelo medo e pela adrenalina, atravessei a lança em sua barriga. 

Seus olhos reviraram e a cor sumiu de seu rosto antes dele cair deitado no chão.

🥀

Sigam o caminho das rosas,
Elas lhe guiarão por essa jornada.

🥀

A Corte De Sangue - VAMPIRE HISTORY. | CONCLUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora