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Manoel

   Eu não lembrava quantas garrafas já havia bebido ao certo, mas eu queria impressionar. Ainda me restava um pouco de sobriedade mas eu fingiria que estava completamente louco. Rute Perez estava ficando com o Carlos Eduardo e eu sabia disso, mas era ela quem eu queria naquela noite, e estava disposto a pagar pelo risco. Ela tinha uma pele negra bonita, macia como um veludo e uma boca cheia que eu alucinava com a ideia de morder. O Carlos não merecia ela, não mesmo. Que se dane se ele era capitão do time de futebol, ela deveria estar no meu clubinho, onde desajustados faziam dos limões que a vida dava, sua limonada.

   Já tinha passado por várias bocas naquela noite, e não cheguei a ficar com ela, que foi embora mais cedo. Mas não importava, não era como se fosse o fim do mundo eu não ficar com a filhinha do papai naquela noite. Já estava decidido a ir embora da festa quando me surpreendi e vi Esteban olhando para todos os lados. Ele vestia a jaqueta que era do seu pai, um pouco larga para ele mas de certo modo ficou legal. Ele estava muito bonito.

-Procurando alguém? -perguntei assim que me aproximei. Ele sorriu mas não falou nada. -Pensei que não viria.

-Não queria, mas ficar em casa também não estava sendo uma experiência maravilhosa.

-Ok, então vamos arrumar uma bebida pra você. -o puxei para a cozinha onde tinha alguns copos espalhados e um tonel com várias cervejas dentro.

   Como o esperado, Esteban torceu o nariz no início, tudo bem, não parecia ser o local mais higienizado e cerveja não era a bebida favorita dele, mas até que dava pro gasto. Era só dessa vez, na próxima ele não precisava beber.

-Só um pouco. -entreguei a garrafa para ele.

-Só um pouco. -ele repetiu sério.

   Mas o que era só um pouco se tornou um festival de garrafas vazias. Eram duas da manhã quando resolvemos ir embora apoiado um no outro, quase caindo no chão. Estava muito gelado na rua, e eu me tremia todo. Meu casaco já estava gasto, e eu precisava de um novo urgentemente. E mesmo não tendo outro para vestir, Esteban tirou sua jaqueta e me deu para eu usar.

-Eu não preciso, otário. -empurrei ele em vão.

-Eu também não. -sua mão foi no bolso da calça, onde ele pegou seu maço de cigarro e seu isqueiro e começou a fumar. Por hora seria o suficiente para o esquentar.

-Me dá um.

-Já acabou o seu?

-Você sabe que sim. -respondi sem jeito. Na verdade não tinha acabado, Diego tinha achado e jogado fora, e de brinde ainda me deu um tapa na cara.

-Tá bom, fica com o maço depois eu compro mais.

-Valeu cara. -Esteban me dar alguma coisa quando via que eu precisava estava começando a ficar inevitável. Eu sempre estava precisando de algo. Cigarros, roupas, tênis, companhia e comida. Tia Esmeralda sempre preparava algo especial para mim e ficava triste quando eu não conseguia fugir para lá, mas não havia ninguém que ficasse mais triste do que eu. Eu só queria fugir definitivamente algum dia.

-Está ainda aqui? -Esteban tentou estalar os dedos mas não deu certo, então rimos.

-Sei lá. Acho que estou com sono.

-Já estamos chegando. -ele passou pelo corredor primeiro enquanto eu ia atrás dele. Saímos no seu quintal na parte de trás da casa, a casinha da árvore já estava equipada com cobertores e travesseiros.

-Pensou em tudo em.

-Eu não ia correr o risco da minha tia me ver chegar de madrugada. -ele foi para o seu canto. -Principalmente bêbado.

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