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*Manoel

   Eu estava bem cansado de olhar pro teto do meu quarto da irmandade, pensando em coisas aleatórias, quando resolvi ir até o dormitório para ver o que os meninos estavam fazendo. O dia estava nublado e feio, parecia que vinha chuva por aí. Mas contrariando o tempo e a provável tempestade que viria, a maioria dos alunos estavam pelo campus, alguns fazendo piquenique, outros conversando e alguns fazendo roda de violão. Até na entrada do dormitório tinha alguns caras jogando conversa fora, enquanto fumavam seus cigarros. Achei estranho quando passei por eles, e os mesmos evitaram me olhar e ficaram em silêncio.

   Quando cheguei no meu quarto, acho que descobri o motivo. Tudo estava revirado; gavetas pelo chão, papéis, as portas do guarda roupa aberta e uma delas quase caindo, e no meio da confusão Dustin estava sentado, tentando arrumar tudo. De repente uma raiva me tomou. E apesar de saber o que provavelmente tinha acontecido, ainda sim eu perguntei.

-Dustin, mas que porra aconteceu aqui? -minha voz era alta e firme, e pareceu preencher o lugar. Dustin me olhava com os olhos vermelhos, provavelmente de tanto chorar, e não esboçava nenhuma reação.

-Aconteceu de novo. Ele levou tudo de valor que encontrou. -ele voltou a se concentrar no que estava fazendo e eu tentei, juro por Deus que tentei respirar fundo e não surtar. Mas eu não conseguia controlar aquilo, simplesmente não dava pra ignorar essa merda toda. Eu sei, eu sou um alcoólatra de merda, mas eu nunca roubei meus amigos pra comprar minhas bebidas. -Que porra!

   O barulho do chute que eu dei na geladeira assustou Dustin, que se encolheu e tampou os ouvidos com as mãos. Sinto muito por ele, mas eu precisava pôr pra fora o que estava sentindo. Não era só raiva, era ódio. Um ódio mortal que eu sentia não do Esteban, mas da vagabunda da Estela. Eu desejava que ela estivesse apodrecendo em algum lugar imundo, sem amor e sem dignidade, depois de tudo o que ela fez pro Esteban. Eu comecei a gritar e a xingar vários palavrões, enquanto jogava tudo no chão e socava as paredes. A dor me deu um pico de prazer e alívio, então continuei socando a parede até minhas mãos sangrarem.

-Porra! Mas que porra! -dei mais um soco, que deixou a parede bege do quarto manchada com meu sangue. -Eu sou um merda mesmo! Acho que isso também é culpa minha não é?! -eu gargalhei, tinha pena de mim. Dustin não conseguia me olhar, só continuava encolhido e chorando. Eu sei, era culpa minha. Eu devia estar parecendo com seu pai. -Dustin, me desculpe. Não tem que ter medo, não de mim. Eu nunca te machucaria.

   Ele não conseguia falar nada, apenas soluçava. O rosto estava muito vermelho e os olhos brilhavam com um azul triste. Eu o abracei e beijei sua cabeça, e demorou pra ele conseguir se acalmar.

-Me desculpa. Eu tô tentando ser melhor, eu juro, mas não consigo controlar quem eu sou. Mas não queria te assustar e nem te fazer lembrar de coisas ruins, ok? Me desculpa, me desculpa. -o abracei mais forte. E foi nos meus braços, no meio do nosso quarto todo quebrado e destruído, que ele adormeceu. 

   Fiquei meio atrapalhado na hora de colocar ele na cama, mas consegui. Dei uma última olhada pra me certificar que estava tudo bem, e então me preparei para sair. Eu já sabia para onde ir, não era nenhuma novidade para mim. Eu tinha vontade de colocar fogo naquele buraco, mas isso não resolveria nada, porque o problema não era o lugar e sim o cérebro do Esteban.

   O antigo ponto de venda de Estela agora era de outros porcos da faculdade, e ficava atrás do museu, a parte mais esquecida do campus. Perto suficiente do estúdio de balé, pra porra daqueles anoréxicos arrogantes terem seu remedinho pra inibir a fome e continuarem com seus corpos esqueléticos andando por aí. Tanto faz, minha irmã era bailarina mas estava longe de ser doente como eles, a mesma coisa a Rosalía. 

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