15 - Carta

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"Algumas coisas eu lembro melhor do que outras.

Lembro-me da casa onde vivia com os meus irmãos e avô, da bicicleta junto à garagem e da gaiola com aquele canário amarelo, na janela do meu quarto, que cantava todas as manhãs á mesma hora como se fosse o meu despertador.

Os traços dos rostos dos meus irmãos, nunca vou esquecer. Eles estão lá, cada vez que me lembro da infância. Quando era pequeno, as pessoas diziam que eu era parecido com Ace, apesar da minha personalidade ser mais voltada para o Sabo. Pergunto-me como eles estarão agora e com quem eu me pareceria se tivesse continuado junto deles.

Do meu avô, lembro-me de poucas coisas. De estar sentado no colo dele enquanto víamos algum filme, das mãos dele maiores do que as minhas enquanto brigava-mos pelo comando, de como ele me deixava ganhar para mudar de canal e ficar a assistir desenhos comigo, do seu cheiro que me lembrava a beira-mar pelo seu antigo trabalho como marinheiro.

Estas lembranças são tudo o que eu tenho...

Teach me disse que eles não queriam saber mais de mim. Que se se importassem realmente, eu já teria sido encontrado. Disse, inclusive, que já todos eles já estavam mortos. Mas eu não acredito. Não acredito que tenham morrido e se eles ainda são os mesmos que um dia conheci, que eu sinto que ainda são, eu sei que ainda me esperam algures e que ainda me amam. Ou pelo menos, espero que sim...

Já perdi a esperança de sair desse inferno e ter uma vida normal faz muito tempo. Provavelmente morrerei antes de voltar a vê-los, talvez nunca saberão onde eu estive por todos esses anos, nem sei se algum dia verão essa mensagem. Mesmo que resgatem a Tama, o que eu espero que consigam fazer pelo menos com ela, eu tenho noção de que estas palavras podem nunca chegar a eles. Ainda assim, gostava de lhes dizer que os amo também... Que tenho saudades deles...

Ace, Sabo, vovô... Nos vemos um dia desses, nesta ou em outra vida. E desta vez, não vou me importar nem vou ficar bravo se me chamarem bebê chorão como costumavam fazer quando éramos crianças. Até porque... Isso é o que mais tenho feito desde que vim aqui parar...

Até mais...

Monkey D. Luffy. "




Sabo e Ace se prenderam para não bater a cabeça na parede ao ler aquilo. Ao virar todo aquele cativeiro do avesso para retirarem o máximo de vestígios de abusos que conseguissem para análise, Law não esperou que ao mover o colchão do chão onde Luffy costumava dormir, a sua equipa fosse encontrar uma mancha de sangue seco escondida grande o suficiente para acharem que alguém morrera ali.

Em cima dessa mesma mancha e ainda por baixo do colchão, havia uma folha de papel perfeitamente dobrada. Nela, com letras escritas em tinta e algumas manchas do mesmo fluido, encontrava-se uma carta de Luffy elaborada dias antes de ter saído dali, enquanto Tama dormia. Devia tê-la escondido para que apenas a polícia a encontrasse.

Foi essa carta, escrita quando o menor tinha noção de que iria morrer, que Law fotografou e entregou aos dois irmãos, agora na sua frente, junto com imagens do local e os relatórios médicos do menor que revelavam sinais extremos de violência e foram esse dados, que fizeram com que os dois voltassem a perder o chão - e a noção - ao verem o jeito como o irmão havia vivido nos últimos 12 anos.

- ONDE ESTÁ ESSE DESGRAÇADO? - Gritava Ace, segurando o colarinho de Law - ONDE ESTÁ ESSE MALDITO QUE FEZ ISSO COM O MEU IRMÃO?

- Cometeu suicídio - bufou Law claramente incomodado - mordeu a própria língua a caminho do posto depois de saber que o Luffy estava vivo. Chamamos a ambulância, mas não veio a tempo. Provavelmente, por saber que teríamos correspondência de ADN entre os cabelos encontrados no seu irmão e os dele e que todas as outras provas seriam todo o suficiente para o condenar. Você sabe... Esse tipo de pessoas, na cadeia, sempre passam por um inferno. Talvez ele não quisesse lidar com isso.

- ELE passaria por um inferno? E O LUFFY, PASSOU PELO QUÊ? NÃO É JUSTO! ELE TEM DE PAGAR PELO QUE FEZ! - Revidou Sabo. Law sabia que não, ele mesmo não estava nada satisfeito com esse desfecho, no entanto, não podia fazer mais nada para o mudar. O seu trabalho estava feito.

- O seu irmão começou a comunicar - revelou o tatuado, ganhando a atenção dos dois. - Foi ele quem nos deu a identificação desse homem. Bom... Mais ou menos... Mas já é um começo. Bepo disse que ele também pareceu feliz com a notícia do resgate da garota, já que olhou para ele como se quisesse saber mais.

- Podemos vê-lo, então? - Adiantou o loiro.

- Ainda não, faltam alguns exames. O Bepo vai tentar averiguar, também, até que ponto o psicológico dele está bem para isso. Se ele achar que está tudo bem em dar o próximo passo, então podem vê-lo mas isso ainda pode demorar um pouco... E Ace, você precisa de se controlar. Ao mínimo deslize, vocês serão colocados para fora do hospital e impedidos de lá entrar. Entendido?

Contra vontade, o de sardas concordou dando mais um gole no chá na sua frente. Haviam passado dois dias desde o ocorrido e Law se encontrava com os dois na sala de estar da casa dos mesmos. A media rapidamente descobrira a existência de Luffy e depois de divulgar que Tama, depois de um mês desaparecida, havia sido encontrada. O título de "garoto passa 12 anos em cativeiro como escravo sexual" passou a ocupar todas as primeiras páginas dos jornais, junto com outras manchetes como "ajuda a salvar criança depois de 12 anos cativo" e "criança encontrada com ajuda de colega de cárcere". Com a ajuda da polícia, Law havia conseguido salvaguardar tanto a localização do menor quanto a identidade dos dois irmãos no entanto, sobre o psicológico dos três, sabia não poder fazer muito mais. O próprio Law era contra todo aquele alarido em volta de alguém que só queria paz e sossego.

- Como ele está? - Murmurou o loiro.

- Bem, está estável. Agora tudo dependerá dele. Sabe, Sabo... Acho que uma consulta no psicólogo faria bem a vocês também. Vocês andam de cabeça cheia com tudo isso e ele poderia ajudar vocês.

- Eu não preciso de um psicólogo.

- Me prometa então que, pelo menos, vai pensar no assunto. Pelo Luffy...

- Em que é que um psicólogo para mim ajudaria o Luffy?

- Bom, se você o encontrar instável desse jeito, vai destabilizar ele.

Sabo bufou. Apesar de não estar totalmente convencido, acenou positivo, cedendo. Já ia Ace reclamar do assunto quando o telemóvel de Law tocou e o mesmo, estranhando o número do médico na tela, atendeu sem pensar duas vezes. Do outro lado, era Bepo.

"Ele fugiu, Law! O garoto desapareceu do quarto!"

- Quê? Quando?

"Não sabemos, faz uma hora que ninguém o vê! Não sei como isso aconteceu!"

- 10 minutos estou aí - e desligou.

- O que foi? - Questionou Sabo. Law pegou no casaco e saiu em passos apressados.

- Falo com vocês depois.

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