7 - Como você quer morrer?

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- Como você quer morrer? - Questionou Teach. Luffy não respondeu. Terça de manhã, com os cortes enfaixados e olheiras de quem tivera uma noite de sono terrível, o garoto piscou várias vezes para ter a certeza de ter ouvido bem a pergunta do homem que, de calças sociais e camisa com gaveta, acabara de aparecer com uma cara de quem era a pessoa mais feliz do mundo.

- Pensando em me descartar, Teach?

- Não era o que você queria? Sair daqui?

- É, tem razão. Também queria que você sumisse para bem longe de mim e me deixasse em paz. Pode fazer isso? - Perguntou calmo. Luffy esperava uma bofetada ou algum sarcasmo em resposta, mas no final e para sua surpresa, nada aconteceu. Talvez Teach tivesse feliz por causa dele, concluiu, afinal, fazia anos que não conseguia arrancar lágrimas do menor, as mesmas que no dia anterior o fizeram se sentir um completo lixo enquanto o seu agressor parecia completamente realizado.

- Até parece, pivete.

Ao seu lado, no colchão, ouviu Tama murmurar algo durante o sono e desviou o olhar rapidamente para ver se ela estava bem. Logo, encarou o mais velho de novo, que aguardava por uma resposta. Como ele queria morrer... Era algo complicado a ser respondido. "Em paz" - ele diria.

- Se bem o conheço, já pensou em alguma coisa. Então para quê me perguntar?

- Você tem quatro opções - concluiu - posso enterrar você vivo, sofucá-lo de alguma forma, encenar suicídio ou algo mais que você sugira.

- Vai encenar suicídio para alguém que você raptou á 12 anos atrás? - Resmungou. Obviamente, isso não daria certo.

- Estou lhe dando oportunidade de escolher pela última vez na sua vida, pirralho! Veja como fala!

Luffy deu um suspiro. Estava cansado de mais para aquilo, física e mentalmente exausto. Tivera a pior noite de sono dos últimos tempos, acordara uma e outra vez com a sensação de sufoco, culpa e a imagem da tarde do dia anterior, revia uma e outra vez como fora capaz de fazer o que fizera logo com aquele canalha. E mesmo sabendo que não tivera escolha, que precisava disso para saírem com os menores danos possíveis, não deixava de sentir raiva de si mesmo, do fundo do seu ser. Um sentimento agonizante que não passava por nada, alimentado pelo pesadelo onde revivia aquele momento uma e outra vez. Para completar, a menor demorara a adormecer depois do cochilo na salinha do banheiro, resultando em menos horas de descanso para o garoto de cabelos negros que esperou ela pegar no sono para poder fazer o mesmo.

- Então se eu posso escolher, porque não me dá uma pancada na cabeça ou algo assim para me adormecer e me deixar inconsciente? Depois, faz o que quiser e me joga em algum sítio.

- Eh? Onde está a diversão disso?

- Você que disse que eu podia escolher. O que quer que fosse fazer, só seria divertido para você. Me deixe ter pelo menos um minuto de paz no meio deste inferno em que vivo por sua culpa.

- Tsk... Bom, que seja.

- O que exatamente vai fazer com ela? - Murmurou, relativo à menor ao seu lado.

- Você já sabe a resposta. - Falou frio e direto, deixando o almoço daquele dia num pratinho no chão e saindo de lá. Luffy olhou o seu conteúdo. Pelo menos, a comida era o suficiente para os dois, algo que não resolvia o seu maior problema. O que Teach faria... Lhe custava acreditar, mas... No fundo, Luffy já suspeitava do porquê de a criança estar ali e essa hipótese não lhe agradou nem um pouco. Ele estava quase a fazer 19, era praticamente adulto, o mais velho começara a perder o interesse nele e precisava de um substituto. Nesse caso, junto da pergunta ao qual acabara de responder, Luffy tinha a sensação de que não duraria muito mais tempo naquele buraco. Em breve, seria ela no seu lugar...

Deveria estar aliviado, certo? Estava cansado daquilo, daquela vida. O seu corpo e mente não suportavam mais, o seu psicológico estava mais bagunçado do que o seu físico, estava se tornando cada vez mais difícil tolerar a situação. No entanto, não se sentia feliz com isso. Luffy realmente odiava a hipótese de que, o preço a pagar para sair dali, fosse a inocência de uma criança com a mesma idade que ele tinha quando ali chegou.

Engoliu seco e reuniu forças, olhando nos olhos escuros e cintilantes da menor que acabara de acordar com o som da porta a bater, por sinal, bem parecidos com os seus no passado. Ele sabia que, se não fizesse nada, o seu cabelo e as suas roupas logo perderiam aquele aroma característico a verão que ela ainda trazia consigo do mundo exterior, do mesmo modo que aquele rosto perderia a cor pálida para ser subistituído por vermelhos e roxos de cada vez que ela se recusasse a obedecer ao mais velho. Sabia, do mesmo modo, que se ela não fosse salva, a sua inocência lhe seria cruelmente roubada do mesmo jeito que acontecera com ele. Talvez noutras circunstâncias ele apenas a ensinasse a lidar com isso do mesmo jeito que ele aprendera a fazer sozinho, para que a menor sobrevivesse sem que sofresse tanto. No entanto, Luffy não se sentia bem com isso.

Anos... Fazia anos desde que alguém o tentara abraçar pela última vez, desde que alguém lhe perguntara se ele estava bem, desde que se sentia minimamente humano e não uma marionete para sentir dor. E por mais insignificante que isso pudesse parecer, era o suficiente para ele.

Pensou um pouco. Precisava de ajudar criança, de alguma forma... Se Tama fosse dada como desaparecida, talvez a polícia a encontrasse antes de Teach fazer algo. Mesmo que fosse baixa, essa chance existia e por isso, Luffy tinha esperança de que apenas precisaria de conseguir conservar a inocência da menor até lá. Agora... O que podia ele fazer?

- Tama. Quero que me escute, okay? - Ela acenou positivo. - Eu provavelmente... Vou acabar morrendo...

- NÃO! - Gritou a menor, levantando bruscamente para surpresa do garoto que quase pulou junto pelo ato repentino. - Não quero ficar sozinha! Aqui é assustador, maninho... Eu não quero que você morra. Você nem tá feliz ainda.

- Feliz, é? - Murmurou. - Tem razão. Mas não é algo que eu possa mudar. Assim que eu sumir daqui, ele obrigará você a ficar no meu lugar. Isso significa que você vai sofrer e que será assustador... Ainda assim, aguente um pouco... Você tem família, certo? - Tama acenou positivo.

- O meu tio.

- Ótimo. Oiça bem, se eu morrer, ele não poderá me manter em casa. Tem de se livrar de mim. Se a polícia me encontrar e investigarem, podem chegar a você. É só uma hipótese mínima, não sei quanto tempo isso pode levar, não sei nem se vai dar certo, mas... Não perca a esperança. Você pode vir a sair daqui. Pelo que ele disse ontem, ainda tenho um mês junto de você. Vou protegê-la até lá mas depois, estará por sua conta. Seja forte... E só para o caso de tudo dar errado, eu vou lhe ensinar o que sei para se virar. Okay? - Tama acenou devagar.

- Porque você quer tentar me salvar se não me conhece? - Murmurou a criança. E Luffy sorriu de leve. Para surpresa de ambos, um sorriso realmente aparecera no seu rosto. Um pequeno raio de sol e de esperança depois de anos em meio a um cativeiro turbulento e sem vida.

- Porque você tentou fazer o mesmo comigo, do seu jeito. Afinal, quando uma pessoa está mal, é normal se preocupar. Não é? - Respondeu. Tama acenou. Luffy não sabia dizer se ela havia entendido completamente a sua frase ou não, nem tinha interesse em descobrir. O mais importante agora, era que ele havia se decidido a ajuda-la e era o que faria.

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