Capítulo 19, aquele da(s) música(s)

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     O celular começa a tocar a música irritante. Não é uma ligação. O despertador que coloquei no horário indica que precisamos e juntar tudo que temos do caso. Nayara olha o aparelho e depois me encara, esperando que eu comece a falar.

Ela faz o que pedi e inicia uma ligação com Juan. Ele me pediu que fizesse isso e três cabeças pensam melhor que duas. Quando ele atende, eu começo:

— Temos três cartas: a do galpão, a que Amanda entregou para Cecília com a ameaça e a que chegou até a delegacia. A que chegou aqui e estava junto com os olhos de Francisca é igual à do galpão, que estava com os olhos da Cinthia. Elas foram impressas. A saliva na fita da última carta tem vínculo com Francisca e Cinthia. — Nayara concorda com a cabeça. — Tem a carta da Cecília, com digitais da Amanda e dela, o que deixa claro que não foi entregue por um carteiro, então Amanda sabia onde a Cecília morava e colocou a carta no quarto dela, ou entregou pessoalmente — deduzo. Recupero o fôlego. — O Caçador de Olhos mantém os olhos conservado, o que é horrível, e tem ligação com esse caso, porque um par deles chegou aqui. Então, mesmo que não seja ele, ele está envolvido.

— Ou é mesmo o Caçador de Olhos? — Nayara pergunta. — Ele está ligado aos crimes. — A garota de cabelos pretos argumenta, e eu concordo com ela, mas algo ainda me incomoda. — Tipo, se focarmos só em encontrar ele, isso vai andar mais rápido.

Nayara é muito minimalista. Óbvia. Porém, seria injusto exigir tanto que ela siga o meu raciocínio se nem meu chefe se convenceu dele.

— Não. — Aponto para o arquivo que registra a música que estava na carta escrita por Cassandra e que foi murmurada por ela em vídeo. — Ela confessou sem que notassem. O Caçador de Olhos nunca deu nenhum indício que suas vítimas estavam vivas. Ele não se importava com o isso, mas essa outra pessoa... Ela se importa. Quer que continuemos procurando — concluo, Nayara franze o cenho.

— Você acha que foi uma delas? A Cassandra?

— Eu não disse isso.

Engulo em seco.

— Por que essa frase não está no arquivo de música também?

A estagiária está apontando para uma frase ao lado da música da Pitty. É frase dita na ligação: Cassandra diz que suas costas doem e que ela está tão entediada quanto eu.

— Tá traduzida, mas é uma música do Nirvana. — Pega seu celular e digita depressa enquanto apenas a observo. — Aqui. — Levanta-se e caminha até mim, ficando à minha direita antes de rolar a tradução. — Tipo, ela trocou Polly por Cassandra, mas ainda são as mesmas palavras, não entra em música? Não?

Fico em silêncio por alguns segundos, apenas encarando a tela, e me apoio na cadeira. Digo:

— Não sabia que era uma música — assumo. Nayara me olha um pouco perdida, passa a mão pelos cabelos e pega a ficha do caso na mão. — Matheus falou que a Cecília gostava de traduzir os trechos de músicas e livros. Isso só confirma que era ela.

— Então são duas músicas — corrige Nayara, e assinto. — Música? Por quê?

Antes que possa responder, observo Amanda sendo levada até a sala de interrogatório. Meu coração pesa, balaço a cabeça tentando afastar o pensamento de culpa. Ela não tem nada a ver com tudo isso.

— Pegamos — Juan se intromete pela primeira vez, olho o celular. É, pegamos. Prova circunstancial, podemos pegar o DNA. — Eu te encontro em 3 horas.

— Laura? — chama a estagiária, que também seguia a Amanda com os olhos. — Eu posso assistir? — pergunta e não seguro um riso fraco. — Não?

— Não vai precisar. — Coloco a mão sobre o ombro da menina. — Nayara... Eu sei porquê da música. — Passo o olhar por Amanda no exato minuto que ela me encara aflita. — Nirvana. Música. Maternidade. Igreja. Eu estava certa.

Porra.

Começo a recolher os papéis depressa no mesmo minuto que Nayara dá um pulo surpresa com minha mudança brusca de movimento.

Quase posso senti-los me comendo com os olhos em busca de respostas, a olho de lado e a menina entende que precisa me ajudar a organizar tudo aquilo. Aponto para o rosto da pessoa responsável por tudo, para amenizar a ansiedade dela.

— Uma pena você não ser investigadora, ainda, hoje vamos pegar o culpado. — Estou feliz, sorrio.

— Eu posso ir escondido! — sussurra Nayara, quase implorando. — Laura, Laura! Por favor.

— Juan? — chamo, um silêncio domina o espaço. — Chama o Rogério também. Você fica — mando Nayara, que choraminga.

Encaro o celular na mesa.

— Ele tocava no bar — sussurra Juan, pensativo.

— Ele é dono do bar — relembro. — E da maternidade.

— Eu não conto para ninguém — implora Nayara, baixo. Não paro meus movimentos rápidos, que são mais uma forma de distração para a conclusão que cheguei e não estou preparada para bancar. — Sério?

Nesse instante chamam meu nome. O escrivão já está na sala de interrogatório junto com Lima, prestes a começar. Falo:

— Você pegou o Caçador de Olhos, sabia? Pode ficar orgulhosa. — As palavras que deixam meus lábios são cheias de gratidão e começo a andar até a sala de depoimento.

Músicas. Acho que elas solucionaram meu crime. E aquele de 20 anos.

Acabo de entrar na sala de interrogatório, encaro bem Amanda, ela parece uma rocha impenetrável. Lima espera por minha fala.

— Me conta como o Matheus conheceu a Cinthia — peço. 

Não Deixe a Puta MorrerOnde histórias criam vida. Descubra agora