Capítulo 23, aquele sobre se esconder

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     Você já se perguntou onde as coisas saíram do controle e para onde estava olhando que não foi capaz de notar e concertar antes que fosse tarde? É só nisso que consigo pensar.

Suzane levou Michele para a escola nessa manhã, tinha pedido isso a ela antes mesmo de saber que Juan também não estaria em condições. Geralmente, às sextas, chegamos de manhã na delegacia, antes das sete, e saímos só quando Michele já está em casa, novamente com a babá. É um dia ruim para nossa filha, e por isso nos outros dias revezamos mais nossos horários. Mas hoje, quando ela voltar da escola, vai ficar muito feliz em nos ver em casa. Não posso dizer exatamente o mesmo de mim, porque nunca fui suspensa da delegacia antes, mesmo que já tenha corrido esse risco umas vezes, nunca foi tão forte. Lima sempre entendia no final, mas a declaração para a imprensa foi o diferencial dessa vez, eu destruí a autoridade dele publicamente e não me orgulho nem um pouco disso. Queria ter tido outras opções, mas ele recusou todas, o que podia fazer?

Rogério está comendo um dos Danoninho de Michele quando o encontro no meu sofá. Ele me encara sem saber o que fazer e amarro os cabelos com a chuquinha preta presa no meu braço direito enquanto me aproximo mais. Todo o meu corpo dói, preciso me deitar.

— Só me diz que não foi você que falou da maternidade — suplico, torcendo para que Rogério não olhe para os lados da forma que faz quando mente e ele balança a cabeça negativamente, ainda me encara.

Meu amigo se levanta, largando o pote vermelho no sofá, e me abraça apertado, passando as mãos sobre minhas costas. Respiro fundo, quero chorar, mas não consigo. Ainda não disse nada, mas é como se meu amigo já soubesse o impacto das minhas ações no âmbito da minha vida que mais tive cuidado para preservar. Eu virei policial antes do casamento, da Michele, é algo que faz parteo do meu eu quase tanto quanto tomar café. Quando me afasto, planejando perguntar sobre Juan, ele diz antes:

— Está lá em cima, dormindo — aperta os dedos em meus ombros. — Precisa de alguma coisa?

— Ele me jogou fora — sussurro, com a voz rouca pela chuva e a gritaria. — Sou um brinquedo quebrado.

— Uma suspensão? Caramba, Lau — sussurra. — Se quiser falo com ele.

Minha risada sai fácil.

— Você não tem moral — argumento, Rogério da os ombros. — Você pode ir, vamos ficar bem — falo, torcendo que seja verdade.

Implorando para ser verdade.

Mas, quando Rogério pega sua jaqueta em mãos e lhe entrego a chave do seu carro, penso melhor.

— Pode me atualizar? — peço, ele deita a cabeça para a esquerda, pensando. — Nayara tem medo e não quero ferrar ela por informações. Rogério está me olhando preocupado, encara-me de cima a baixo. — Vou ficar melhor se souber que não foi por nada — sussurro, já sentindo minha garganta pedir socorro por toda essa manhã.

Quando ele concorda com a cabeça, solto a chave do carro e o assisto deixar minha casa. Olho para a cozinha, querendo beber água, mas tomo o caminho oposto, em direção à escada. Minhas pernas doem a cada degrau e minhas costas gritam tanto quanto a cabeça de fadiga. Quando abro a porta do nosso quarto, encaro o homem encolhido, coberto pelo edredom cinza até o pescoço e suspiro. As cortinas estão fechadas e nem um rastro de luz ultrapassa as janelas. Retiro os sapatos assim que entro e depois a calça jeans folgada do marido de Rogério e camiseta, molhados, antes de me rastejar feito tinta em um quadro dramático, entrando debaixo local aquecido, com o corpo frio demais para ousar tocar Juan, que ainda tem os olhos fechados.

Não Deixe a Puta MorrerOnde histórias criam vida. Descubra agora