Amanda ainda está detida e isso me preocupa. Ela não assumiu o crime e muito menos nos deu um endereço para encontrar as garotas. Cassandra e Cecília estão presas em algum lugar e, quanto mais o tempo passa, maiores são as chances de encontrarmos elas tarde demais. O que me perturba mais é a incoerência de ser Amanda. Não por falta de prova, mas porque ela me disse para acusar Cassandra e isso mostra que a garota não sabe sobre o cartão de memória e o vídeo onde a mulher aparece amarrada. Ela parece mais perdida ou manipuladora?
Não estou de folga, mas não podia furar um encontro de família. Encaro Suzane revirar os olhos amarelos para Magda depois dela dar mais um pitaco em seu frango assado. Michele tenta convencer a Eloísa a brincar com ela na piscina, mas a prima se recusa a entrar na água fria.
— Não vai botar um biquini? — pergunta minha mãe, parada ao meu lado com os óculos de sol marrons.
Apoio as mãos sobre os joelhos cobertos pelo jeans e balanço faço um gesto em negativa. Está muito quente e eu até queria me molhar um pouco, mas nunca se sabe quando vão precisar de mim.
— Demoraram. Olha ali. — Aponta para a entrada do portão. — Juan e Dem chegaram com o sorvete.
Encaro Juan, de bermuda cinza e regata branca, expondo os braços lisos – que Thiago amaria tatuar – e óculos pretos quadrados. De longe se nota que ele é um policial de folga. Michele rouba minha atenção, chegando ensopada dentro do pequeno biquini azul bebê e eu sorrio ao estender a toalha para ela, que usa boias em forma de tubarão nos dois braços magrelos. Ela se senta no meu colo, enrolada no tecido, e exige meu olhar com as duas pequenas mãos apoiadas no meu rosto.
— Larinha, Larinha, cabeça de joaninha — cantarola ela e sorri, olhando nos meus olhos. Eu retribuo o riso, me preparando para minha vez.
— Juanzinho, Juanzinho, cabeça de tatuzinho. — Olho para trás. Juan chega mais perto.
— Chelezinha, Chelezinha, cabeça de pestinha — e pega a garota dos meus braços, girando com ela no ar como se fosse um simples aviãozinho de papel.
Olhando daqui, com o sol forte brilhando sobre eles, a água ameaçando formar um arco-íris e os pingos que soltam dos cabelos de Michele e atingem meu rosto, nem tem como associar esse dia ao mesmo de hoje cedo, com a discussão enorme que eu e Juan tivemos e que gerou uma névoa que durou até o instante que entramos no carro para vir à casa de Suzane.
O motivo foi uma mensagem que recebi. Ainda estava dormindo e Juan não costuma ver meu celular, mas por algum motivo viu e encontrou o nome dela, com sua foto, perguntando sobre Michele. Já acordei assustada com ele gritando meu nome da sala, onde esqueci o celular, até o quarto, onde tinha ido dormir tarde pensando no caso. Quando ele entrou, eu já havia me sentado e o encarava com raiva enquanto Juan me apontava o celular. Eu já tinha planejado contar para ele, principalmente depois de entender que algumas verdades não podem morrer e que Michele, assim como ele, tinha direito de lembrar da mãe.
— Flávia tem o direito de saber como a Michele está — falei paciente, não pretendia aumentar a voz em nenhum momento. — Sim, ela foi presa, por mim, se você não lembra, mas era inocente.
— Ela é uma prostituta. — A última palavra saiu tão carregada de desprezo que me deu náuseas.
Juan arfava e meu coração, outrora sossegado, começou a acelerar conforme sua boca soltava barbaridades disfarçadas de cuidado com Michele até o ponto que mandei, em grito, que ele calasse a boca. Já estava de pé nesse instante, e bati a porta do quarto antes de continuar. Ainda não eram 8h e nossa filha dormia.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Não Deixe a Puta Morrer
Mystère / Thriller[VENCEDOR DO PRÊMIO WATTYS 2021] - CATEGORIA MISTÉRIO/THRILLER +16 O caso de sequestro não era responsabilidade de Laura dias, mas quando o corpo de uma das vítimas é encontrado sem os dois olhos abaixo do Viaduto Santa Ifigênia, em São Paulo, a in...