Capítulo 23

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O jantar na noite anterior tinha sido tenso, com a conversa alegre de Alejandro com as filhas pontudas pelo silêncio desconfortável de Meryl. Cada vez que ela olhava para Camila, sentia um súbito jorro quente de raiva, e precisou de todo o controle para não insultá-la de todos os modos possíveis. De qualquer forma, ela estava decidida a não pegar o caminho da covardia, e isso já era um triunfo.

Antes de se recolher para o quarto, Meryl olhou para Camila direto nos olhos, e, sorriu diante da cautela na expressão dela, fez isso por dentro, para ninguém ver. No dia seguinte, Meryl passou a manhã inteira trancada em seu quarto, fazendo o melhor que podia para alimentar a raiva que ela achava que aquela situação merecia.

Não bastava ter de suportar Alejandro todos os dias, ainda teria que testemunhar a união entre Lauren e Camila. Ela suspirou, sentindo-se sufocada e pressionada pelo marido e suas filhas o tempo todo, principalmente por Regina. Onde quer que fosse, o que quer que dissesse, sentia os olhos castanhos dela examinando-a, esperando e desejando a sua queda, seu fracasso.

— Querida, você está bem? Eugênia me disse que você não comeu nada essa manhã.

Ela ouviu a voz de Alejandro, mas não se virou. Era uma pergunta simples, e ela sabia qual devia ser a resposta, especialmente se quisesse evitar que sua vida se complicasse. Demorou alguns segundos para que ela finalmente respondesse.

— Estou bem. É só uma dor de cabeça.

— Tenho uma reunião essa manhã com alguns sócios e advogados. Posso cancelar se quiser.

Meryl sabia pela sua experiência e convivência com Alejandro, de que tudo o que ele precisava naquele momento era do som da sua voz. Não importava o que dissesse, qualquer coisa serviria. Bastava pouco para mantê-lo satisfeito. Quando lhe ocorreu uma ideia, ela finalmente se virou. Aproximando-se, tocou-lhe as faces gentilmente.

— Eu estou bem, querido. Não cancele a sua reunião por uma simples dor de cabeça.

— Está bem. Mas se precisar de alguma coisa, peça para Eugênia me ligar no celular ou para o escritório. Nos vemos mais tarde, certo?

— Está bem, meu amor.

Assim que Alejandro fechou a porta atrás de si, Meryl se agarrou ao telefone. Precisava ligar para Lauren, ouvir a voz dela, até que todos os outros sons na sua cabeça se dissipassem, se calassem, desaparecessem subitamente. Nem mesmo o risco de ser descoberta era capaz de desviar sua mente do desejo insaciável que sentia por Lauren. Não conseguia dar nome àquele sentimento com o qual pudesse conviver.

Chamá-lo de luxúria o depreciava. Descrever como amor a aterrorizava, mas sentia o que sentia e nada poderia fazer. Talvez o melhor a se fazer fosse apenas reconhecer a sua existência e não o rotular. Afinal, o que sentia por Lauren não podia ter nome, era inexplicável. Ela se aproximou da janela e viu que o motorista de Alejandro não estava lá fora, no jardim, onde sempre o esperava. Eles já tinham saído, pensou ela, então discou o número de Lauren direto do telefone residencial, esperando que ela atendesse. Ao quarto toque, Lauren atendeu. Meryl segurou a respiração. Não esperava que ela de fato atendesse.

— Lauren, não desligue, por favor. Eu preciso falar com você.

— Meryl? Como conseguiu o meu número?

— Não importa. Precisamos nos encontrar. Você não pode se casar com Camila, não depois de tudo o que eu fiz por você!

— Do que é que você está falando? Está louca?

— Por que acha que eu me casei com esse velho asqueroso? Para te dar tudo o que você merece! E veja só, eu consegui porque a fortuna dele agora é minha, é nossa, meu amor. Eu te amo e me sacrifiquei por você. Ou acha que é fácil ir para a cama com esse imbecil? Acha que é prazeroso beijá-lo? Fazer sexo com ele? Eu quase vomitava quando ele me tocava! Você entende o que eu... Meryl de repente estacou.

Mentiras de PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora