Às seis da manhã da segunda-feira, o alarme do celular tocou. Eu e Carla acordamos, nos trocamos, tomamos um café preto e saímos de casa em carros separados:
Ela foi para a oficina, onde trabalhava e eu, segui, contrariado, para o seu apartamento, para conversar com sua mãe, que insistia em falar comigo, antes de retornar pra sua casa em São Paulo.CONTRARIADO
Eu estava contrariado porque Carmem insistira, ao telefone, pra que eu fosse ao apartamento de Carla, para conversarmos a sós, naquela manhã, e eu achava que ela queria falar-me sobre os assuntos do dia anterior, quando ela descobriu que aquele papo de divórcio, que lancei à mesa de sua casa era uma mentira de ocasião.
Entrei no apartamento de Carla, onde Carmem, sozinha, passava um cafezinho, pra tomarmos, junto com o bolo de milho que fizera.
Fui até a cozinha, procurando disfarçar a minha contrariedade por estar ali, e Carmem falou:
- Carla me falou que você adora café, Paulinho... - ela procurava ser amável - Por isso estou passando um cafezinho pra tomarmos, enquanto conversamos.
- Está bem, Carmem. Mas eu te peço que seja breve e objetiva no assunto, porque, neste horário, eu deveria estar trabalhando no meu novo livro...
- Carla me falou que você não queria vir - Disse ela colocando açúcar no bule de café, - Eu te peço desculpas por ter insistido... Mas, verá que o assunto particular que tenho a tratar contigo, é bem sério...
Despejou o café numa xícara e me entregou. Apanhei o café de sua mão e agradeci, dizendo-lhe:
- Não me entenda mal, Carmem, porque gosto muito de você... mas achei que esgotamos o assunto sério, que tínhamos a tratar, ontem!
Tomei um gole do café, e estava delicioso.
- Café bom! - falei.
Ela agradeceu, olhando-me com profundidade. Parecia estar com dificuldades em iniciar o assunto, o que não era do seu feitio. Mas eu não estava nenhum pouco interessado nos possíveis dilemas familiares, ou protocolos sociais, que ela certamente iria abordar ao saber a realidade sobre a minha vida conjugal, diferenciada e muito satisfatória para mim.
Fomos pra sala, com as xícaras na mão e nos assentamos à mesa, onde o bolo de milho nos aguardava. Vendo que ela estava com dificuldades em iniciar o assunto, e que a minha linguagem corporal não conseguia disfarçar o meu descontentamento por estar ali, eu iniciei:
- Não estou à vontade por estar aqui, conversando com você, Carmem, porque o ponto de fusão entre nós, é Carla, sua filha! - Eu procurava ser sutil ao demonstrar para Carmem que não aceito interferência de sogras no meu relacionamento. Tomei mais um gole do deliciosos café e prossegui: - Relação de filha com mãe é uma coisa. De namorado, ou marido, com esposa é outra! Tudo o que você tiver que conversar, com relação ao meu relacionamento com a Carla, terá de conversar com ela, e não comigo.
Ela me olhava de modo indecifrável, e eu procurei amenizar o papo dizendo:
- O máximo que você poderá ser, na minha vida, é se tornar minha sogra!
- Acho que já sou, - ela finalmente falou - Porque você é um homem responsável e leal... tive certeza disso, ontem, ao conversar com suas lindas esposas... e, ao seu modo, você está fazendo muito bem pra minha filha! - Ela tomou mais um gole de seu café e concluiu: - Te falo como mãe, pois a conheço... Carla faz concessões a você, que jamais fez em outros relacionamentos, incluindo Alex e Luana...
- Este é o ponto, Carmem! - Eu aproveitei sua pausa para lhe explicar: - Eu e Carla nos conhecemos há 3 semanas, e ainda estamos nos descobrindo. Meter familiares nisso, tem nada a ver! Carla é uma mulher com 32 anos, independente e perspicaz! Não estamos falando sobre uma menina menor de idade... Por isso não entendo o que estamos fazendo aqui! - Tomei mais um gole do meu café e prossegui: - Você conheceu Karina e Luíza ontem, e... eu não converso com as mães delas, sobre nossas questões pessoais... Somos adultos! O que temos de resolver no nosso casamento é problema nosso, e de nenhum outro parente ou amigo!
Carmem encarou-me com expressão indecifrável e indagou:- É assim que você administra seus relacionamentos?
- Sim, - afirmei confiante - e não pretendo mudar a fórmula com Carla... - tomei mais um gole de café e arrematei? - nem com você, sogra querida!
Ela ficou um instante pensativa, depois sorriu e falou:
- Terceira sogra, né?
- Ah, sim... - eu aceitei a sua brincadeira, pra descontrair o papo e também sorri dizendo: - sogra é o efeito colateral do casamento...
Ela sorriu e disse:
- Há uma piada que diz que "SOGRA deveria ter apenas dois dentes: um pra abrir garrafa de cerveja, outro pra doer" - ela riu da própria piada e indagou-me: você conhece esta?
- Conheço e gosto! - Falei, com um sorriso amarelo, no rosto, aceitando a sua descontração. Mas eu não viera ali pra um bate papo, pois precisava trabalhar, e não entendia porque ela estava relutante em entrar no assunto pelo qual me chamara ali.
Carmem notou minha inquietação, colocou um pedaço de bolo de milho num prato e me serviu, recuperando a sua seriedade e a visível ponta de tristeza em seu olhar, que me lembravam o olhar de Marcelo. Falou, finalmente:
- Não te chamei aqui pra te falar sobre Carla e sim sobre mim! - Ela abocanhou um pedaço do bolo de milho e tomou mais um gole de café, prosseguindo: - Você é tão franco e direto quanto meu filho Yuri, tanto que a tua franqueza até assustou minha cunhada Maria. - Sorriu um pouco tensa, depois arrematou: - Curiosamente, você me passa uma confiança, que extrapola meu raciocínio lógico... porque mal te conheço... mas quando você explanava teus pensamentos, na mesa do café, em minha casa, lá em São Paulo, rebatendo as armadilhas verbais de meu esposo Álvaro... parecia que eu te conhecia há muito tempo...
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A MOÇA DA MOTO - Romance Espiritual de Paulinho Santos da Fratuni
RomanceCarla é uma jovem encantadora, que conheci casualmente na cidade praiana de Peruíbe. Meu carro quebrou perto da Reserva Ambiental da Jureia e ela me deu uma carona na garupa de sua moto. Conversando no caminho, descobri que ela era uma fã dos meus l...