Troublesome

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Emily's P.o.v:

           O gelo matinal em Crenshaw Heights não dá trégua, levanta até defunto. Depois de uma noite emocionante e um sono pesado, acordo fora de casa, na cama de uma garota não tão estranha chamada Scarlett Jenkins. Moradora do subúrbio numa casinha miserável quase embaixo do viaduto, foi uma das primeiras pessoas a entrar na minha vida depois que ela começou a dar errado. Uma jovem mulher que passou de melhor amiga pra um lance casual em muito pouco tempo. Temos uma sintonia boa, interesses parecidos e gostamos das mesmas coisas. Nos entendemos como crianças num jardim de infância e isso é ótimo, porque eu sou horrível em começar e manter relacionamentos. Graças a Deus, com a Scarlett eu não preciso fingir e nem me esconder. Ela me desvenda com facilidade, me ajuda sem muito esforço e me conhece o bastante pra saber quais providências tomar quando necessário. Somos feito almas gêmeas, ou quase.

             Levanto no raiar do dia e me espreguiço até o banheiro, abro a torneira do lavatório e molho o rosto. Paro pra encarar o meu reflexo no espelho e reparo no quanto estou acabada. De fato não deveria ter bebido tanto ontem, meus olhos avermelhados e minha pele acinzentada entregam. Retorno ao quarto bagunçado, ainda meio grogue, e procuro pela minha blusa. Não a encontro de pronto e, então, me contento em furtar uma das da Scar pra vestir. Tenho escola, e por mais que eu não esteja com a menor vontade de ir, preciso. O período de provas está começando e eu não tô afim de repetir outra série, é um saco estudar tudo de novo. Tenho que terminar logo esse inferno.

             Sair de fininho depois de uma transa nunca foi o meu forte, ainda mais se tratando de uma ficante tão especial. Gosto de vê-la sorrir, mais ainda de vê-la sorrir pra mim. Apesar de não ser e nem parecer a romântica incurável dos livros de poesia, até que me saio bem nos encontros. Tenho um bom papo, sou cheirosa, engraçada e aventureira. A maioria das garotas gostam disso e eu estou sempre pronta para oferecê-las um cenário diferente daqueles que estão acostumadas. Como dizem por aí, é legal mudarmos de pele às vezes. A Scarlett não é do tipo que curte pular na garupa de uma moto e fugir da polícia, mas sempre entra no meu jogo, compra dos meus produtos e me ajuda a decolar. Sem dúvidas, uma companheira e tanto! Mas não estou no humor pra me apaixonar. Honestamente, nem lembro se já me apaixonei. Acho essa ideia de amor tão ultrapassada... Talvez quando eu tiver uns quarenta e for acometida pela solidão da menopausa, mas por enquanto, eu finjo que esse lance não passa de uma lenda urbana.

             Ao olhar pela vidraça da janela, não quero nem imaginar o quanto pode estar frio lá fora, e, aproveito a ocasião pra furtar um casaco também. Scarlett se revira na cama, sinalizando seu processo de transição do estado inconsciente pra o quase-consciente. Acendo um cigarro nos lábios enquanto isso, me apoiando numa cômoda.

                        一Você ainda tá aqui, é? 一sua voz sai como um resmungo sonolento e abafado. 

                        一Queria que eu saísse sem me despedir?

                        一Não seria a primeira vez.

             Dou um meio sorriso, expelindo vagarosamente a fumaça.

                        一Tenho escola.

                        一Ah, vamos parar de fingir que você é uma estudante super dedicada 一tira um dos lençóis do rosto, o revelando pra mim. 一Uma pessoa que come droga não pode gostar de estudar.

                        一Por quê? 一arqueio uma sobrancelha.

                        一Porque são coisas totalmente diferentes 一se esforça pra sentar. 一Droga, eu tô tonta...

A DickinsonOnde histórias criam vida. Descubra agora