Conexão cósmica

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Eu nunca gostei da ideia de ir em festas. Eu sou um pouco introspectiva, penso as vezes que talvez eu só não tenha um rosto muito simpático, mas não é como se eu tentasse também, e é por isso que eu e Ryujin formamos uma dupla imbatível. Ela com todo o charme e uma comunicação invejável e eu com a inteligência e determinação. O jeito simpático dela tinha como consequência o colégio todo caindo aos seus pés, tanto meninos quanto meninas, o diretor e os funcionários a amavam também. E minha inteligência, bom, eu e ela éramos as primeiras da turma, tinha algum prestígio nisso.

Caminhávamos até a festa do Felix, diziam por aí que ele fazia as melhores festas, os pais dele viajavam muito e eram donos de uma mansão enorme em um bairro chique próximo ao meu. Enquanto andava já tinha me arrependido de ter aceitado ir, só conseguia pensar no meu trabalho de mais de um ano sendo deixado em uma gaveta, onde o tranquei, durante essa madrugada toda. Olhei pra Lua, estava tão brilhante, fecho os olhos e sinto a brisa agradável no meu rosto, tinha esquecido como a noite é formidável. Direciono meu olhar pra Ryujin e ela já estava olhando para mim, a brisa balançava seu cabelo loiro.

– Eu falei que sair um pouco não seria ruim, quase consigo ver um sorriso no seu rosto. – Ela diz enquanto passava a mão em seu cabelo, uma mania muito recorrente. Um charme.

– É, talvez você esteja correta, mas não vou confirmar nada até nós voltarmos, vai saber a confusão em que você está me enfiando. – Falo depois de desviar o olhar para o chão.

– Eu vou estar lá, acredito que seja impossível você não gostar. - Ela fala enquanto sorri de lado – só temo que sua escolha de roupa não seja a ideal, mas nada que eu não tenha avisado. – Ela dá de ombros e volta o olhar para a frente.

Não me importei muito com o que vestir, queria ser rápida, na minha cabeça quanto antes chegássemos mais cedo íamos embora, então só coloquei um moletom rosa da cor da mecha do meu cabelo, uma calça jeans escura e um tênis branco. Não via problema com o simples e confortável. Porém, realmente, ao reparar no que a Ryujin vestia... talvez eu estivesse coberta demais? Ela estava com um top preto que era visível graças a blusa de manga longa preta, telada. Tudo indo só até a altura do top, uma saia estilo colegial quadriculada, um cinto demarcando sua cintura e uma bota que cobria até abaixo dos joelhos. Estava linda, como sempre.

– Não entendi, qual o problema com minha roupa? - Falei formando um bico nos lábios, olhando e esticando meu moletom.

– Problema algum. - Ela me olhou de cima a baixo e demorou um pouco pra falar, poderia jurar que vi ela ficar um pouco sem graça, o que era raro, nada a deixava nem minimamente envergonhada, ela exalava confiança. – Você esta linda a proposito, é só que em festas normalmente tem muitas pessoas, e as pessoas dançam, todas grudadas e bêbadas. Todos esses fatores juntos significam que lá dentro deve estar quente como o inferno. – Estávamos na esquina da tal festa, e ela apontava para uma mansão, de longe já dava pra ouvir o barulho e ver a movimentação, pessoas pra todos os lados, muitos carros estacionados. Pensei "Não é possível isso tudo ser sobre a festa."

Sim, era possível.

E quanto mais perto mais alta a música ficava.

E mais gente aparentava ter, gente de todo o tipo.

– Achei que era uma festa do colégio, Ryujin, que gente toda é essa. Não reconheço ninguém. – falei um pouco insegura, chegando mais perto da loira ao meu lado.

– Eu nunca disse que era uma festa exclusiva do colégio, Yeddeong. O Felix é do colégio, mas as festas dele são sempre abertas, a todos como pode ver, mas não se assuste, vem. – Ela disse animada e já falando um pouco mais alto por conta da música, agarrou minha mão me puxando em direção ao portão.

Passamos do grande portão que já estava entreaberto, o ritual da entrada era virar três doses de tequila seguidas "ninguém entra sóbrio" dizia a placa, Ryujin virou rapidamente e logo se voltou para me encorajar - os olhos em expectativa - bom eu já estava ali, me sentia mais confiante segurando a mão dela então me dispus, virei tudo de uma vez e esse, com certeza, foi meu primeiro erro da noite. Já era de se imaginar minha baixa tolerância ao álcool eu raramente bebia, li um artigo científico sobre os malefícios da bebida alcoólica, ela interrompe a criação de novos neurônios e eu precisava de todos os possíveis, mas isso eu deixei pra Yeji do futuro se preocupar.

Era um gramado extenso tomado por pessoas, diga-se de passagem, fazendo de tudo, casais se agarrando pelo chão, pessoas correndo seminus, bêbados jogados, esses eram muitos, grupos diversos conversando e virando copos. Era uma atmosfera...nova para mim, mas o astral estava bem alto e com a mais nova ao meu lado não sentia que devia me preocupar. Bom, infelizmente isso não durou muito.

Já na entrada a Ryujin com toda sua beleza e simpatia atraiu olhares, o que a fez cumprimentar e falar com muita gente, já tinham até nos servido mais bebida. Isso tudo no curto tempo em que caminhávamos para o casarão no centro do gramado, e mesmo que tentasse me incluir e não ter largado da minha mão em nenhum momento me senti um pouco...deslocada. É, essa é a palavra. Então comecei a reparar em alguns detalhes, segundo erro da noite. O sorriso que ela dava aos 4 ventos, o gesticular com as mãos ao falar com as pessoas, O SORRISO, os dentes e a boca dela...a confiança, nossa, a confiança era o mais atrativo...EU PENSEI ATRATIVO? Não, espera, atração? Era isso que eu estava sentindo...?!?! Por Einstein, ela é minha melhor amiga, não.

Balancei a cabeça para espantar o devaneio, eu não devia estar pensando nisso, e já estávamos em frente a porta, Ryujin olhou para mim e sorriu, eu assenti com a cabeça e ela empurrou a porta com o ombro esquerdo já que uma mão segurava um copo vermelho e a outra minha mão, o som era ensurdecedor, mas logo vinha o costume, o ambiente estava inundado de fumaça mal era possível enxergar, acho que era gelo seco.

Ainda com as mãos entrelaçadas passamos pela multidão indo em direção a um local mais escuro e quieto, nos sentamos em um sofá perto uma da outra, e soltamos as mãos, imediatamente senti falta do toque, mas não consegui pensar muito nisso. Minha amiga estava certa, aqui é quente como o inferno e eu comecei a suar. Já começava a me sentir ludibriada pelas luzes, leve e risonha.

– E aí, está se sentindo bem? Se não tiver me fala, pod.. ­– Começa genuinamente preocupada, ela sempre foi assim, tão cuidadosa. "Que fofa" penso mas a interrompo.

– Relaaaxa, eu to legal. E bem que você avisou, aqui é quente mesmo, nossa. - Falei mais descontraída que o normal enquanto apoiava meu copo na mesa de centro, tirando meu moletom por cima da cabeça. Por baixo eu usava uma regata branca canelada curtinha. Meu cabelo deve ter ficado todo bagunçado, mas quem se importa né, eu não – Mas eu estou gostando, só não vamos exagerar viu? preciso fazer o Teste R amanhã bem cedo. – Olhei me perdendo um pouco na visão que era ela ali, bem na minha frente – Caramba, como essas luzes deixam seu cabelo bonito – Disparei sem pensar, passei os dedos no cabelo dela delicadamente encostando a palma da mão em seu rosto. Eu só fiquei com vontade, voltei atrás no pensamento "Porque minha melhor amiga não?" não ia me privar de explorar o que eu sentia, eu estava atraída. Fato. E como pseudocientista eu sabia que os fatos eram os únicos que realmente importavam.

Agora, como uma suspeita passou a ser um fato tão rápido, eu não sei.

Teria o álcool alcançado minhas tomadas de decisão? Não, apesar de alegre eu me sentia consciente.

O que eu sentia era súbito. Outro fato. Vou culpar os hormônios.

Ela olhava nos meus olhos alheia aos meus pensamentos (agradeci mentalmente por isso), curvou um canto da boca e falou com a voz rouca.

– Ei, Esquece um pouco os testes, as viagens galácticas, ou sei lá mais o que se passa nesse seu cérebro genial, e aproveita esse momento, o agora – Após praticamente sussurrar isso ela desviou o olhar pra minha boca, eu fiquei estática, sentia o ar quente da respiração dela bater contra o meu nariz, observei a mão dela se aproximar lentamente até meu rosto em um toque suave, não consegui evitar estremecer sob seu toque e senti aquilo de novo, uma sensação, tinha o poder de me consumir eu já não tinha controle, só tinha certeza do que eu queria naquela hora. Beija-la. O olhar dela saiu da minha boca para meus olhos como quem pedia permissão, hesitante. Então eu desviei do olhar penetrante dela e olhei para sua boca, acho que foi tudo que ela precisava, então passou lentamente a língua nos lábios e começou a se aproximar, vi que estava perdida quando notei o quanto eu queria aquele selar de lábios.

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