Doce Passado

Capítulo 31

Sophi

        Os motivos que levam as decisões serem tomadas são tão delicados e individuais que é difícil se ter um lado como verdadeiro, ou um ponto de vista como certo. Decisões de calor de momento podem ser tomadas precipitadamente, o que não é o meu caso.

       Quando decidi fugir levei em conta tudo, meus sentimentos, meu futuro, minha dignidade e meus valores. E eles gritavam para proteger meu bebê .
Fiz o que julguei correto. Sem arrependimento e sem pensar em voltar.

       Nunca mais.

       Entretanto esses mesmo sentimentos, valores me fizeram estar aqui. E não tenho problema em mudar de opinião. Isso se chama atitude.
Fui me fiz forte redesenhei a mulher que gostaria de ser. E sou.

       Agora. Diante da pessoa que mais me subjulgou percebo que acertei. O mais estranho é não sentir a mínima vontade de demonstrar carinho. Talvez pena, ou nervosismo pelo impacto do momento. E alegria de saber que esse destino que ela traçou para minha vida não aconteceu.

       Acertei novamente, por mudar de decisão e voltar.

       Sem responder ao meu cumprimento ela entrou na casa, me deixando talvez frustrada.

       _Não liga, é melhor assim. Meu pai já conversou com eles._ Preocupado Ayron aperta minha mão. _ A casa é grande eles não ficarão aqui. Tem outras pessoas para o serviço deles.

       _Tudo bem! Preciso enfrentar tudo isso de uma vez! _ Suspiro já sabendo que nada será fácil.

       _Eu estou com fome. Vamos lá dentro? _ Puxou Alice seu pai pelo braço como se já conhecesse a todos .

       _ Calma mocinha, tem um banquete te esperando! _ Entraram os dois pela porta principal, e eu fiquei olhando para o nada, e para o tudo.

       Esse tudo já foi meu mundo limitado, meu quem sabe futuro. Lembro do momento em que vislumbrei o local pela última vez. Tenho a impressão de que até mesmo as flores são as mesmas. Tudo ainda é exatamente igual.

       Entro já conhecendo aquele que foi meu lar, os móveis foram trocados por outros mais modernos, as paredes pintadas em um tom mais claro do que o de costume, mas de resto nada mudou o ar continua o mesmo, despertando a menina assustada que fui um dia.

       Encontro minha filha sentada na ponta da mesa repleta de guloseimas caseiras. Pelo visto minha mãe continua uma ótima cozinheira, é Ayron ao seu lado. São tão parecidos que chega a ser bizarro.

       _ Não fui convidada para o café! Estou quase ofendida! _ Me sentei na cadeira de frente para o maldito que me olhava de uma forma quase inexplicável. Existia fogo em seus olhos.

       _ Aqui também é sua casa. E sempre será assim. Fique a vontade.

Apenas assenti com a cabeça colocando café quente em minha xícara. Quando percebi que a Sra. Clarice chegou já chamando pela neta.

       _ Minha linda da vovó. _ Quando ouviu isso Alice correu para seus braços, as duas já estavam se comunicando diariamente e a vontade que minha filha tem de ter avós a fizeram amar toda essa ligação.

       _ Oi vovó! Que linda que a Senhora está!

       Me levantei para cumprimentar a linda senhora e avistei logo atrás dela o Sr. Kevin.

       _Janet, desculpe Sophi! Que bom que já chegou. _ Falou meio envergonhado, mas velhos hábitos são difíceis de serem abandonados, eu o entendo.

       _ Sem problemas Sr. Kevin! Bom dia Sra. Clarice! Realmente decidi sair cedo. Assim Alice dormiu a viagem toda. _ Expliquei meio sem jeito e cumprimentando os dois. _ Achei que encontraria a Ashiley. Ela já chegou?

       _ Chegará depois do meio dia. _ Avisou Sra. Clarice. _E por favor Sophi me chame só de Clarice, afinal você é mãe da minha neta e nasceu aqui. _ Pediu carinhosamente.

       _ O mesmo serve para mim querida. _ Avisou Kevin.

       _ Vou tentar. Prometo. Agora preciso tomar um banho estou exausta. _ Olhei para Ayron perguntando aonde poderia ir.

       _ Claro Sophi. Arrumei o quarto de visitas para vocês. _ Falou Clarice. _ Ayron leve as coisas delas para lá.

       _ Sim mãe, vem Sophi.

       Segui Ayron pelas escadas relembrando cada detalhe daquele lugar, passei pela porta de seu  quarto e um misto de sentimento me inundou. Aqueles centímetros guardavam grande parte da minha história, momentos ímpares que foram cruciais para a mulher que sou hoje. Das manhãs limpando até a noite em que tudo aconteceu.

       Só me dei conta de que estava parada quando Ayron me chamou.

       _ Terra para Sophi, chamando! _ Riu de forma maliciosa como se estivesse lendo meus pensamentos. _ Se quiser repetir, eu não tranco a porta para dormir.

       _ Cala boca Ayron! Não faça me arrepender de ter vindo. _ Falei entrando no quarto ficando de costas para ele e de frente para a janela e Uau! Que vista. _ Pode ficar com Alice até eu me arrumar? _ Perguntei sem tirar os olhos do horizonte.

       _ Posso tentar, mas sei que meu pai planejou um dia cheio pra ela.

       _ Só não deixa meus pais perto dela! _ Pedi tensa já olhando para ele. _ Fica de olho, por favor?

       _ Relaxa, já estou indo lá.

       E ele saiu fechando a porta e eu não me contive, corri até a janela contemplando aquela visão. A calmaria da plantação, o vento tocando nas folhas das árvores, os cavalos desfilando esplêndidos. Essa era uma falta que nem sabia que estava sentindo.

       Ri do nada apenas relembrando o quanto eu gostava de correr por ali.
Mas meu coração se encheu mesmo quando avistei minha menina correndo pela grama com os braços abertos como eu fiz muitas vezes. E uma lágrima solitária rolou pelo meu rosto.
Logo atrás dela seus avós falavam algo que a incentivava a continuar. Eu jamais roubaria isso dela. Essa era a sua história e não caberia a mim privar esses capítulos dela.

       Olhando para a direção contrária meus olhos param na cena tão comum para meu passado. Meu irmão deitado em uma rede e uma moça jovem, muito jovem limpando a parte externa do salão de festas. Nada muda mesmo por aqui. Juan está mais velho, braços mais fortes e traços mais maduros, nada além. No entanto a figura feminina chama minha atenção. Sua roupa é velha e seu cabelo maltratado.

       Volto para minha atual realidade e vou para meu banho, demoro mais por estar cansada e tentar relaxar. Esqueço de tudo é foco em dar atenção para meu corpo. Dedico um tempo especial a mim mesma, isso é fundamental para tudo que preciso enfrentar ainda hoje.
Desço as escadas e vou ao local que sei que minha mãe está. Vamos lá é agora.

       Entro na cozinha e não encontro ninguém. Sigo até a casa nos  fundos e também não encontro ela, a casa está vazia. Saio rápido antes que as lembranças me consumam.

       Encontro Alice e Ayron correndo e uma Ashiley que me abraça como se eu fosse um urso de pelúcia.

        _ Acabei de chegar! _ Grita ela me soltando._ Como você está linda, meu Deus e a Alice. Sabia que ela poderia se passar por minha filha. Nossa quanta novidade.

       _Calma Ashiley! _ Fala Ayron. _ Deixa a Sophi te responder uma coisa por vez!

       _É que são tantas coisas. Preciso saber de tudo.

       _ Tudo bem Ashiley, vamos sentar e te conto tudo. _ Falo me dirigindo até as cadeiras de ferro no Jardim.

       Conto tudo a Ashiley, desde o momento que saí da Fazenda até o momento em que sentei na sua frente. Ocultando os detalhes quentes de toda minha jornada. Ela ouviu atenta, até mesmo impressionada com algumas passagem.

       _ Nossa isso foi intenso! _ Falou impressionada. _ Podemos dizer que você realmente descobriu o mundo. Chocada!

       A garota que mal olhava pra mim se mostrou alguém compreensiva e uma fã da minha vida. Nem percebemos quanto tempo passou, almoçamos ali mesmo na companhia de todos os membros da família Lauder.

...

       O dia passou no mesmo ritmo de sempre por aqui. Alice aproveitou cada minuto com seus avós e sua tia, Ayron parecia o mesmo adolescente inconsequente que assisti crescendo na casa dos pais, a cada segundo inventando uma brincadeira nova ou malabarismo novo para arrancar gargalhadas da Alice.

       Percebi que ele realmente aprendeu a amar a filha e isso é comprovado quando saio do banheiro e encontro ele deitado ao lado da dela lendo para ela dormir.

       Fiquei sem reação!

       Nunca esperei isso é não sei se gosto. Estou tentando ser amigável, tentar fazer o certo está tomando de mim mais do que estava disposta a dar. Por mais que esse homem me magoou ainda existe alguma coisa forte no meu peito.