Aquarela - SARIETTE

II

Rio de Janeiro, Brasil. Sexta-feira, 27 de março de 2021. 

Juliette acordou, naquela manhã, mais cansada do que estava quando foi dormir. A rotina massiva entre mestrado, emprego e os estudos estava acabando com toda a sua energia e sanidade. Ela já não tinha muito tempo para fazer as coisas que gostava, como pintar, tocar seu piano ou pedalar. Quando fazia coisas desses tipo, sentia-se culpada, pois acreditava que poderia estar utilizando aquele tempo para estudar.

Seu mestrado era um sonho que parecia ser inatingível. Por questões financeiras, Juliette havia decidido priorizar o aluguel de seu apartamento e seus compromissos financeiros, pois não teria condições de pagar tudo ao mesmo tempo. Ela ainda não tinha, mas o Universo é um deus bondoso, que ajuda quem realmente precisa. No ano passado ela fez um processo seletivo onde quem obtivesse a maior quantidade de pontos, ganharia uma bolsa integral. A maior pontuação foi a dela e, finalmente, ela havia conseguido a, sonhada, vaga no mestrado de Intervenção Psicológica no Desenvolvimento e na Educação Infantil. De graça!

Ela sentia-se péssima por reclamar de algo que havia lutado tanto para conseguir. Parecia estar cuspindo no prato que estava comendo. Não queria parecer uma pessoa ingrata ao Universo, mas estava a ponto de surtar, ou de ter um colapso e dormir por, no mínimo, uma semana seguida!

- Sabe do que você precisa? - Lara, amiga com quem dividia o apartamento, disse, passando a manteiga na torrada. - Sair dessa casa, pelo menos um diazinho, para ver gente! Arejar a cabeça. Se divertir! Você tem 32 anos, sabe?

- Eu vejo gente! - Juliette respondeu, defensiva.

- Eu sei, mas você precisa mudar o ambiente, entende? Casa, emprego e mestrado. Casa, emprego e mestrado. Casa, emprego e mestrado. - Lara imitou a voz de um robô, fazendo Juliette rir. - É só uma sugestão!

- Lara, eu não nasci pra ter essa vida movimentada! Vidinha de balada não é pra mim!

- Hoje, mais tarde, vai ter uma festinha lá da empresa, pra comemorar o faturamento alto. Foi o maior de uns anos pra cá. Cada funcionário pode levar um acompanhante, como sempre...

- Nem venha. Eu tenho um plano de estudos a cumprir! - Juliette a interrompeu, balançando a cabeça negativamente.

- Posso terminar de falar? - Lara perguntou, fazendo a morena revirar os olhos. - Ju, não é uma baladinha. É uma coisa fina. Eles alugaram o Coco Bambu, tá bom pra você? Coisa da alta sociedade do Rio de Janeiro! Lugar perfeito pra eu dar um golpe. E eu preciso de uma parceira para o crime!

- Sem chances. Eu não tenho nem roupa pra ir num lugar desses. - Juliette se justificou.

- Eu sabia que você iria falar isso! - a mulher se levantou, correndo em direção ao seu quarto e voltando dele com duas bolsas gigantes.

- Lara, o que é isso? - Juliette arregalou os olhos, vendo as duas bolsas enormes a suas frente. - Quanto foi isso? - perguntou, lendo a palavra Colcci escrita nas bolsas.

- Sua mãe nunca te ensinou que é feio perguntar o preço de um presente?

- Misericórdia, Lara. - ela disse, tirando um vestido preto, curto, de lantejoulas de dentro da bolsa. - Você enlouqueceu!

- Você não vai morrer se for comigo! Eu sempre vou nas festas de lá sem companhia. - Lara falou, atropelando as palavras. - E eu não aceito um não como resposta dessa vez! - ela disse, pegando sua bolsa, que estava pendurada na cadeira e correndo em direção a porta de saída do apartamento. - Tchau! - fechou a porta, deixando uma Juliette atônita encarando um vestido que deve ter sido dividido em, no mínimo, umas dez vezes no cartão de crédito.