Estava acordando e lembrando de um pesadelo, daqueles bem realistas por sinal. Sentia meu corpo pesado, cabeça latejando, deve ter sido alguma festa da noite anterior. Me espreguiço na cama e de repente me deparo com alguém do meu lado.
— Porra, que susto!
— Boca suja hein, dondoca.
Nesse momento eu lembrei que meu pesadelo não era só um pesadelo. Eu estava no bendito acampamento, que droga.
— Como eu vim parar aqui? — perguntei.
— Você deu um mó trabalhão, garota, desmaiou lá no meio do nada. — Comecei a recordar meus últimos segundos ainda acordada, que vergonha, só me faltava essa.
— Nossa...
— Oh, aí está seu almoço, deixaram aí para você, melhor comer tudo para não tiver de novo dando trabalho para gente, sua babá deve ter ficado em casa — fala a garota se afastando em direção a saída.
— Espera! — pedi e ela voltou a olhar para mim, diria sem paciência. — seu nome? — ela revira os olhos.
— Priscilla. Só isso? preciso ir — acenei.
Peguei o almoço que estava ali e comecei a desfrutar, nunca comi algo com tanta vontade como agora e pior que era só um arroz, feijão e carne frita, meu deus que perfeito. Estava com uma fome descomunal, ainda bem que não tem ninguém aqui para presenciar isso.
— Eu não acredito no que estou vendo! — minha amiga começa, rindo logo em seguida. — Natalie Smith está comendo essa comida "sem classe" e ainda como se fosse a do melhor restaurante do mundo. Eu vivi para presenciar isso.
— Ai, como você é chata, Abigail — larguei o prato de lado.
— Ué, você mesmo que estava cheia de coisa para comer de manhã. E pode comer isso tudo que eu te avisei de manhã e você nem me deu ouvidos.
Emburrada peguei o prato de volta e comecei a comer de novo, nada como passar um bom aperto para te fazer mudar de ideia.
...
Pela tarde, eu até pedi para ficar por aqui, obviamente a instrutora não deixou, insisti que não estava muito bem, mas ela disse que aqui não tem tempo para frescura, um saco tudo isso. Me arrumei, pois só faltava eu e seguimos para outra trilha, agora com outro objetivo.
Andamos por mais uma hora e ainda por cima com aqueles pirralhos me tirando do sério pelo que aconteceu de manhã, eles acham que sou patricinha demais para esse lugar, mas vou mostrar que estão bem errados.
Pior que aqui não tem ninguém interessante para tornar as coisas melhores. Os meninos da minha escola são sem graça, só falam em carros esportivos e o restante em "pelada", achei que isso tivesse a ver com nudez, mas pelo que entendi depois se trata de jogar futebol. Linguajar estranho.
Pouco tempo depois começamos a ouvir uma queda d'água, nesse momento até eu me animei, gosto dessa vibe natureza rústica, com certeza renderia alguns stories e um bom engajamento, mas bem, vida social aqui não temos.
A animação de todo mundo acabou quando Michele disse que entre a água e nós ficaria uma boa distância. Estava entardecendo e com isso precisávamos montar nossas barracas. Pois é, a cabana era só uma estadia temporária. Ali mesmo, em uma área mais aberta, ela nos dava instruções e cada grupo montava sua própria barraca. Abigail, uma colega da minha escola e eu ficamos juntas, difícil saber qual a mais burra das duas para saber montar isso.
— Natalie! — a instrutora grita me assustando. — Por que bulhufas você não está montando a barraca com suas colegas?
— Porque elas fazem isso tão bem, olha lá.
— Abigail e Luiza venham cá — ela chama e as meninas vêm até nós. — vão ajudar aquele grupo ali a montar a barraca.
— Mas e a nossa, M-Michele? — Luiza se prontifica a perguntar um pouco preocupada.
— Não se preocupe, Natalie se encarrega disso.
— Eu? Só me faltava essa...
Sim, só me faltava essa mesmo! Fiquei aqui me batendo para terminar de armar essa droga de barraca e só desandava. Ninguém me ajudava, Michele também não deixaria e já estava escurecendo.
Quando toda as barracas estavam armadas, menos a minha virei motivo de risada e distração. Começaram a acender até a fogueira para preparar comida, então me irritei de vez e desisti de tentar. Ótimo, agora minhas amigas e eu estamos sem onde passar a noite tudo por causa daquela instrutora idiota.
No final, tudo serviu como castigo, ela fez com que eu fosse para a barraca de umas meninas, assim como Abigail e Luiza foram para outras. Fiquei logo com aquela garota que parece não gostar de mim desde que cheguei aqui, a tal Priscilla.
— Olha... a dondoca vai ficar na nossa barraca, Raimunda — Priscilla cutuca a outra com o cotovelo e elas ficam rindo como se eu não estivesse ali.
Arrumei meu colchonete no espaço que sobrou ignorando a presença delas e saí para preparar minha comida, ou eu tinha quase certeza que ficaria sem se não fizesse isso.
Tudo seguiu tranquilo, fora a cara de emburrada que minha amiga estava por ter que ir dormir com as meninas do outro colégio. Tentei pedi desculpa, mas ela não recebeu muito bem.
Provavelmente ainda era muito cedo quando a instrutora colocou todo mundo para dormir dizendo que ficaria por ali de vigia. Pelo menos hoje eu estava cansada o bastante para dormir rápido a essa hora. Conforme todos iam se ajeitando nas barracas o silêncio ia se instaurando, a conversa diminuindo, o som da natureza prevalecendo e meu olho cada vez mais pesado.
As duas meninas que estavam comigo até roncavam já, que rápidas. Desse jeito elas não acordam amanhã nem com buzinas nos ouvidos, e se eu puder deixo elas quietinhas esquecidas pra levarem bronca mesmo.
Muito sonolenta comecei a ouvir algo se mexendo, não sabia distinguir se era sonho ou real. O barulho ficou mais alto e minha reação foi dar um pulo e ficar sentada, meu coração estava a mil, meu peito subindo e descendo acelerado. Pensei imediatamente que era algum animal ou algum psicopata na mata que nos encontrou.
Qual fosse dessas opções com certeza tinham levado minhas companheiras de barraca. Grito por ajuda ou não? Melhor não, não quero ser mais um motivo de risada depois.
Deixo meu cobertor de lado e com o ambiente parcialmente iluminado tento observar algo do lado de fora. Sinto algo prendendo minhas pernas e em um impulso o peso do meu corpo me joga pro lado de fora da barraca que estava aberta. Caio de cara no chão e quando penso em, dessa vez, gritar com toda minha força alguém tapa minha boca.
— Cala essa boca, dondoca — olho assuntada e vejo que é a garota irritante e outras rindo de mim. — A curiosidade matou o gato, sabia? — ela fala me ajudando a se virar e a Raimunda começa a soltar os meus pés que estavam amarrados.
— Sua idiota do caralho — começo a estapeá-la e a mesma coloca a mão de volta na minha boca.
— Shiii... você não vai querer acordar a instrutora, né? — neguei com a cabeça, eu já estava "queimada" demais com ela — Volta lá para dentro caladinha.
— Você não manda em mim — sussurrei.
— É melhor você ir por bem...
— Eu vou, mas amanhã conto tudo pra Michele.
— Experimenta, garota mimada — ela aperta meu braço e fixa seus olhos nos meus. Seus olhos castanhos estavam enegrecidos, brilhavam com a luz da noite tornando-a sombria. Não quis revidar, quem sabe de onde essa garota veio e do que é capaz. Pode até ser filha de algum bandido.
Entrei junto a Raimunda e mais duas meninas. Enquanto elas fechavam a barraca vi Priscilla andando de mãos dadas com uma garota se afastando dali. Deitei encolhida no meu canto enquanto as outra ficavam de risadas e cochichos. Vou ter que ficar a noite inteira acordada, tenho medo do que essas loucas possam fazer comigo.
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SOS Acampamento (Natiese)
FanfictionFanfic Natiese Natalie é uma patricinha que foi obrigada pelos pais a ir ao acampamento de verão de sua escola. Para ela era a pior coisa que poderia acontecer, só não imaginava que alguém tornaria tudo bem mais interessante.